Domingo,
13.
Agradabilíssimo
almoço com a Maria José. Durante mais de duas horas conversou-se através da
arte, dos amigos comuns, do tempo ido que foi o nosso, hoje império da saudade
que se despede sem mágoa. Não há como um encontro face a face, sem os espelhos
convexos que nos disformam não só a imagem como os sentimentos. Só a dois
descobrimos o que muitas vezes se esconde ou escondemos contra a nossa
vontade.
- Sábado o Brejnev passou o dia em
pequenos trabalhos a que tive de dar assistência permanente. Às cinco horas
estava arrasado e só um duche rápido me recompôs as forças. Mas o que se fez
foi enorme, sobretudo tendo em conta que alguns trabalhos se arrastavam há anos
como, por exemplo, transferir o montão de tijoleira antiga do centro da quinta
para um anexo recuado, deixando o chão livre para as máquinas quando veem
gradar a terra, ou o corte de um grande damasqueiro em fim de vida, ou ainda o
juntar da lenha dispersa para o montão sob uma capa de plástico (por ricochete
só narrar tudo isto me deixa estafado).
- Estou a procrastinar o fecho da
piscina. Eu tinha estabelecido o prazo de 15 deste mês para o seu fim, mas
apesar do tempo cheio de ameaças de chuva, o sol teima em não nos deixar e os
dias hesitam em aceitar cobrir-se com o manto agoirento do Outono. Como poderei
eu viver sem a minha meia hora diária de braças fortes, do azul do céu com o
sol no centro a espalhar luz e calor sobre o meu corpo bronzeado depois do
banho? Vejo ao longe a curva do horizonte lambida por machas escuras
ameaçadoras, sinto o silêncio mais pesado, mais denso a abocanhar a espaços
curtos a alegria e a ligeireza onde antes
imperava sobre a massa suspensa do ar o sortilégio das horas e dos dias
arrebatadores de bem-aventurança. É daí que eu sou, dessa luz que se descobre por
entre os vestígios do lusco-fusco nas noites de cigarras à desgarrada e mil
estrelas piscando olhinhos felizes sobre o minúsculo e solitário ser que as
contempla embebido do mistério de tudo, honrado e agradecido ao seu Criador.
- Enquanto isto, uma teia de
incertezas e preocupações estende-se sobre o mundo, atónito. Nada de bom vem
dos lados da Turquia, Síria, Irão e Iraque. Que importa! O importante é que
Portugal ganhe mais um jogo não sei em que campeonato, o Porto dê alegrias
muitas aos seus adeptos, assim como o Benfica, o de Alcagoitas; as televisões
vomitem a toda a hora jogos deste e daquele, contra aquele e a aqueloutro, tudo
o mais não nos diz respeito e verdadeiramente não tem importância nem interesse
absolutamente nenhum. Estamos alheios, indiferentes ao outro. Que se lixe, em
bom português.