Sábado 31.
Strasbourg. Cheguei por assim dizer
directamente do convento depois de uma noite de oração no Sacré Coeur, em
Montmartre, para os braços do meu querido amigo Lionel e da mulher que me
receberam simpaticamente. Eu explico. As freiras que tomam conta da basílica e
vivem no mosteiro nas traseiras, servindo uma velha tradição que vem
praticamente do século XIX, segundo a qual o Senhor exposto no altar teria
sempre, noite e dia, alguém em vigília e oração. Para que se cumpra a ideia de
Charles de Foucauld, elas alugam um quarto para quantos desejem fazer a
experiência religiosa que eu fiz. A mim coube-me a hora entre a meia-noite e a
uma da manhã, altura em que desceram dos quartos duas raparigas para me
substituir. Mas o tempo de oração começara às nove horas com o ofício religioso
cantado pelas irmãs, seguido de missa celebrada por um sacerdote
estrangeiro sem a ajuda de qualquer diácono ou subdiácono e perante a igreja
plena até à porta. Terminada esta, os fiéis que não possuam autorização de
oração nocturna são convidados a abandonar o templo. Nessa altura as luzes fecham-se
e fica apenas o altar dourado e a relíquia do Sagrado Coração de Jesus
iluminados, o templo na escuridão é de um punhado de crentes que se vai revezando
até de madrugada. Regressei à igreja depois de poucas horas de sono às sete da manhã, para novo ofício cantado pelas freiras, seguido de missa, desta feita
com as portas abertas a todos os fiéis.
- O mais surpreendente para mim, foi a quantidade de participantes à
comunhão da missa da noite. Praticamente só eu e mais uns poucos presentes não
nos abeirámos do altar para receber a hóstia sagrada. Outra surpresa foi a participação
de jovens nas orações da noite. Raparigas e rapazes, entre os 17 e os vinte e
cinco, vieram fazer a vigília, sós ou em grupo, muito concentrados, usando uma
fé que parecia convincente, não só nos gestos como no respeito devido.
Sobretudo, posso afirmar, porque se trata de uma prova dura fisicamente, mas
intensa do ponto de vista espiritual, sobrenatural, diria. Exige muita concentração,
firmeza de propósitos, crença absoluta, amor a Deus.
- Paris assemelha-se ao Rio de Janeiro. Outro dia pela manhã os
trabalhadores de uma empresa vieram procurar a vizinha de uma vivenda perto
para lhe entregar a mala de mão que tinham achado no chão junto à Avenida
Romain Rolland. Como eu vinha a chegar com a Annie, falaram connosco. Ficámos
nós incumbidos de a entregar quando a víssemos, o que aconteceu ao fim do dia.
A infeliz contou-nos que havia sido assaltada pelas dez horas assim que parou o
carro a um semáforo. Os assaltantes abriram a porta e sacaram-lhe a mala do
banco ao lado da condutora e puseram-se em fuga a pé. Isto na avenida mais
frequentada da zona.