quarta-feira, junho 30, 2021

Quarta, 30.

O pobre rico madeirense, sofre por destinado toda a ira das meninas prepotentes do BE e dos jornalistas jornaleiros ao serviço de interesses umbrosos. Todos querem com a sua condenação fazer esquecer outros bem mais perigosos que Berardo, em roda-viva com a Justiça há anos e mais imaginativos, elegantes, discretos, sabedores e de sorriso macaco de orelha a orelha. Pois eu acho que este capitalista fora do baralho é inofensivo, original, e pouco ou nada perturbador. Parece até um pobre ingénuo, não só na aplicação do dinheiro como na escolha primordial dos seus interesses financeiros. Quando ficarem apuradas as infrações que praticou contra a banca, e só a esta, o que sobra dos seus crimes é uma colecção de arte, museus e associações que honrarão o país. Os outros que se querem esconder atrás dele, ninguém sabe onde têm o dinheiro nem o que fizeram de milhões que os bancos lhes emprestaram - do seu rasto, não ficou nada. 

         - Acabei a revisão da primeira parte do Matricida no Café da Casa. O que constato é que as páginas que correspondem ao trabalho diário, não me desacreditam, todas as outras com longos intervalos de labor quotidiano fraquejam, perdem ritmo, intensidade, paixão. O romance é um crochet no dizer de Aquilino Ribeiro e como tal tem que ir connosco para todos os lados e ficar disponível a qualquer hora, para não dizer minuto. 

         - Antes de deixar a quinta, tendo acordado com as mulheres de Zuckerberg a falar da vida alheia no meio do oceano verde que as embrulhava fui regar, depois com a roçadora limpar uma parte em frente a casa (é a quarta vez), depois com a machada cortar grossos troncos de malvas e por fim retirar da tona d´água os flocos de algas minúsculos que se foram desenvolvendo de ontem para hoje e são consequência de não querer encher os bolsos aos abastados administradores do chinês Xi Jinping ping ping.  

          - A propósito do ilustre imperador. Há dois meses, tendo havido aqui nos CTT talvez mudança de carteiro, a conta da eléctrica chinesa chegou-me depois do prazo para pagamento. Vai daí, zelosamente, pois então, na factura seguinte foi-me facturado 1,25 € de juros. Escrevi a protestar e na troca de cartas, chegou-me uma que mereceu da minha parte a seguinte resposta:  

« Sr. Director Pedro Fernandes, por quem sois ! 

A resposta que me deu foi arrogante e autoritária a lembrar a Companhia que no passado, por ser única, fazia o que queria. 

Não preciso que me diga a quem me devo dirigir para reclamar o abuso, conheço muito bem a ERSE e já a ela me dirigi com proveito. Se a eléctrica chinesa não tem culpa do atraso dos correios, eu ainda menos. Sim, irei pedir à ERSE que estude o problema por atingir, decerto, muitos consumidores. E também à Provedora de Justiça porque acho que isto é igualmente uma questão de justiça. Como calculará, não é a quantia de 1,25 € que me empobrece (já gastei em selos, deslocações e tempo muito mais), mas a moralidade da mesma. Bastava ter-se dado ao trabalho de consultar o meu passado enquanto cliente, para ver que não encontra uma só factura liquidada com atraso ! Uma só ! 

E já agora, se me permite, como teve a gentileza de me aconselhar a ERSE, também tenho redobrado gosto em o esclarecer que quem decide ficar (ou não) como cliente da sua companhia, sou eu !  

Atentamente, 


P. S. – Espero não me estar a dirigir (o nome é rigorosamente o mesmo) a um grande amigo, economista, e pessoa com quem privei muitos anos até o perder de vista, mas por quem continuo a ter uma profunda e grata amizade. Se assim for, convido-o para um almoço como no passado acontecera tantas vezes ! O café está pago antecipadamente : 1,25 €… »  


terça-feira, junho 29, 2021

Terça, 29.

A coisa está de novo preta. O número de casos por coronavírus não pára de crescer e hoje anda ao nível de Fevereiro quando a hecatombe tomara o país por inteiro. Agora, se tudo isto tivesse uma lógica e o que diz o Governo fosse para levar a sério, as medidas que então se tomaram deviam já estar a ser implementadas. O argumento é o facto de haver uns 40 por cento de vacinados. Claro que com quarenta por cento da população imunizada, estamos muito longe da protecção geral. Isso, para os políticos e homens de negócio, não conta nada – a economia vale mais que os cidadãos, muitíssimo mais até porque nos encontramos quase na banca rota de novo. (Chiu, nada de interjeições!)  Estes estão entregues à sua sorte e espero que sejam mais sages que aqueles que os governam. 

         - Apresso-me a registar o que o Público dizia há dias: um terço dos senhores deputados tem outras formas de governar a vidinha airada. Ainda querem que eu ponha minha vida nas mãos de semelhantes gananciosos. 

         - Vivemos semanas a fio a levar com a imagem de um país melhor que os melhores do mundo, a meterem-nos na cabeça que iríamos repetir a dose de sermos o primeiro do futebol europeu e quiçá mundial, que temos o melhor do Planeta entre nós; Chefe de Estado, Presidente da Assembleia, primeiro-ministro viraram comentadores desportivos, o primeiro chegou a dizer que o futebol era mais importante que a Covid-19, as televisões fartaram-se de nos impingir a arraia-miúda do jornalismo, andámos suspensos de uma imagem fabricada no tempo do Estado Novo e vai-se a ver somos medíocres, fracos, sem garra, jogadores de papel. Perdemos vergonhosamente e caímos vergados ao peso daquilo que nunca fomos – “os maiores”. 

         - Há um ministro do executivo de Johnson que foi apanhado embrulhado com uma colaboradora, beijando-se como dois jovens apaixonados. São ambos maiores, mas isso, aproveitado pelos jornais, traduziu-se na demissão do pobre beijoqueiro: perdeu o posto e talvez a casamento. Se falo desta futilidade é para a comparar com o nosso autarca de Lisboa. Embora tenha entregado inocentes aos seus algozes chineses, russos, israelitas e passo, numa prática aberrante e pidesca, permanece no cargo e não há quem o arranque de lá. Uma democracia vê-se nestes pormenores.   

         - Passei uma parte da manhã de domingo a desenrolar as técnicas do robot da piscina. Que coisa fascinante! Que prodígio tecnológico! A dada altura, vendo-o agatanhar as paredes, a aspirar o fundo, a deslizar à tona da água, bem-disse quem o imaginou e tive por resposta: “também eu te saúdo pela capacidade que tiveste em me pôr a trabalhar”. De facto! Esta cabecinha pequenina, retirou lá dentro o resto de lógica que a vida deixou de ter, para a aplicar na descoberta de um parceiro que me vai facilitar imenso a vida. Nunca tive a água tão limpa e nunca gastei tão pouca água e energia. 


domingo, junho 27, 2021

Domingo, 27.

Absolutamente de acordo com Nuno Palma e sem qualquer entravo assino de cruz tudo o que ele escreve hoje no Público. O artigo é a resposta a Fernando Rosas que há uma semana, também no mesmo jornal, tece laudas sectárias sobre a política de desenvolvimento de Portugal no tempo do Estado Novo. Diz Palma: “Portugal continua a ser dos países mais atrasados da Europa a nível educativo, mesmo entre os jovens (eu diria até entre eles); continua a ser dos mais próximos da Turquia, mesmo para as gerações posteriores ao 25 de Abril.” E pergunta: “Também isto é culpa do Estado Novo?” Quem me lê regularmente, verá neste texto muito das minhas críticas e referências ao estado actual do país. Quando falo – e muitas vezes o faço – da tremenda decepção que é para mim a esquerda, refiro-me precisamente a aspectos enunciados pelo professor, mas também ipsis verbis à obsessão em professar: quem não é por mim, é contra mim. Dito de outro modo, só é verdade aquilo que vem da esquerda, tudo o mais é um retorno ao passado fascista, evidentemente. Mesmo quanto à cultura que no artigo é abordada, pessoalmente, não vejo relação de causa-efeito na melhoria social e cultural presente. Sim, dizem as estatísticas que há menos ou quase nada de analfabetismo, e isso em que é que se traduz quando vemos o que por aí vai. O país concreto, inter-relacional, solidário, tratando assuntos com alguma profundidade, relacionando-os entre si, entre épocas, entre regimes é porventura do conhecimento instituído de hoje? Temos indústria? Gente culta que não ande ao sabor da corrente? Políticos com amplidão de forma a construir o futuro? Ou estamos como sempre estivemos: Deus, pátria, futebol? Uma classe média cada vez mais encostada à baixa, na maneira de pensar, de articular o dia-a-dia, resignada e submissa, dependente de subsídios, reformas, do dinheiro ganho através do comércio que mais facilmente permite fugir aos impostos? Vencemos a pobreza? Somos enquanto povo mais civilizado? Temos políticos honestos, esclarecidos, visionários? Álvares Garoupa, citado por Palma, acrescenta: “O Estado Novo foi um regime do seu tempo, que até conseguiu fazer reformas a nível educativo, de justiça e de integração europeia.” Claro, toda esta análise é feita a partir do passado, antes de Salazar chegar ao poder e a relação que tanto um como o outro fazem, é uma viagem no tempo comparando o antes do Estado Novo e o depois da segunda Grande Guerra. A democracia leva 50 anos, tantos quantos o Estado Novo e eu o que vejo em muitos domínios é uma paragem, uma litania permanente entre esquerda e direita, uma maratona permanente pelo poder, e já agora uma imensa procissão de políticos corruptos a caminho dos tribunais...  É por sermos tão dependentes das esmolas da UE, que somos dos mais acérrimos povos a defender o patrão, aquele que nos tira a fome. 


sábado, junho 26, 2021

Sábado, 26.

A forma de governar nos dias de hoje dizem eles, é com o povo, quando devia ser com e para as pessoas. 


sexta-feira, junho 25, 2021

Sexta, 25.

A desgraçada deste nosso querido país advém em grande medida da corrupção, compadrio, laxismo, faz-de-conta, incompetência, mas também da qualidade de políticos que nos governam. À parte raras excepções tudo é rasca, leviano, sem sentido democrático nem qualidade intelectual e humana. Na rectaguarda deste quadro, está a “mercearia partidária” onde todos se servem segundo padrões cooperativos, a necedade faz o resto. Repare-se na forma como a Bélgica, por exemplo, olha os seus cidadãos. Aquela coisa do futebol vai ser jogada em Sevilha. Logo o governante belga, advertiu os seus concidadãos para terem o máximo cuidado pois é alto na cidade o índice de coronavírus. Que diz, em idêntica circunstância o Presidente da Assembleia, Ferro Rodrigues, deseja que os que puderem rumem à cidade e lá se encontrarão os deputados e portugueses endinheirados no jogo entre Portugal e a Bélgica. Esta salada de fantasias e interesses, vai acabar por nos desgraçar a vida a todos – os que gostam e, sobretudo, os que não apreciam futebol. 

         - Fui a Lisboa montado no carro porque tinha de trazer o robot espanhol para limpar a piscina. Pensava, antecipadamente, na loucura do meu acto, imaginava as filas, o pára- arranca, as bilheteiras à entrada da ponte e mil e uma acções como acidentes, bate-chapa, carros parados por aqui e por ali. Qual o meu espanto, o trânsito fluiu como água, o calor não incomodava e num tiro pus-me no Corte Inglês. Dali fui ao encontro dos amigos na Brasileira, onde a Covid-19 nunca por ali passou, nem desceu paulatinamente o Chiado. A reinação era medonha, toda a artéria parecia a Costa de Caparica num dia luminoso de praia; multidões de jovens, nacionais e estrangeiros, de pernas ao léu exibindo com insolência físicos de faz-de-conta, carnudos de vómitos, e rostos aureolados da inocência de antigamente, quando os apetites sensuais se disfarçavam com a timidez. Esta juventude, com aquilo que Deus lhes deu, não entusiasma, não porque não haja que entusiasmar, mas porque o que oferecem não tem sal nem açúcar nem picante nem nenhum aditivo de graça que nos faça corar de gozo e espanto.    

         - O Sr. Luís que há pelo menos quatro anos não vinha gradar o terreno, quando ontem aqui chegou, abriu os abraços e clamou: “Esta quinta é muito bonita! A casa é muito bonita, é das quintas onde costumo ir a mais agradável.” Depois vendo a entrada sem erva, as traseiras do lado da piscina limpas, perguntou: “Foi o senhor que roçou a erva? Eu, não a roçadora -  disse, divertido. É preciso coragem, isto dá um grande trabalho! O que tem de ser, tem muita força – respondi.” 

         - Tempo quente. 34º por aqui. Fecho a semana com apenas seis horas consagradas ao romance – uma tristeza. 


quinta-feira, junho 24, 2021

Quinta, 24.

Marcelo. Estou tão farto de o ouvir falar sobre tudo. Digam a sua excelência que se cale, faça férias, pelos menos uns quinze diazinhos. Para nossa saúde e seu repouso. Já não o posso ouvir, mete-se em tudo, discursa sobre tudo, não há pachorra. Pitié, pitié

         - O país atravessa o desastre de duas pandemias em simultâneo: a chinesa e a da patetice do futebol. 

         - A senhora Merkel que está de saída de cena e vai fazer muita falta à Europa, criticou e muito bem Portugal por ter consentido a entrada dos adeptos ingleses no jogo do Porto, e os que invadiram o Algarve não tem muitas semanas. O governo socialista como diversas vezes tenho dito, põe a economia à frente das vidas daqueles que jurou defender. Num país de apedeutos, este pormenor passa completamente ao lado. 

         - Está já anunciado a saída para Setembro, do segundo volume do Journal Intégral de Julien Green. Pelo que vejo, esta edição abarca apenas 5 anos (1940-1945) e tem 1.408 páginas! O autor em vida, dizia que o que foi publicando era menos de metade do que havia escrito. Está-se a ver. 


terça-feira, junho 22, 2021

Terça, 22.

“Menos notável e muito menos inédito é o facto de ter culpado os subordinados, que castigou. Não muito original é também o facto de se ter ilibado de qualquer responsabilidade política.” Palavras de António Barreto referindo-se a Fernando Medina que eu, se me permitem, torno extensivas a toda a classe política que nos governa. 

         - Desta vez vou nomear o seu nome: Adão e Silva. O comentador que tantas magnificências teceu a António Costa por todo o lado onde celebra a sua sapiência política ou de historiador, não sei bem, foi nomeado pelo seu ídolo para a comissão das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril, durante cinco anos, não me enganei, cinco aninhos rechonchudos, pela módica quantia mensal de 3.745,26 euros, mais 780,36 para despesas de representação. Não se diga que Costa não é um homem reconhecido. Se a tudo isto juntar o ordenado de professor auxiliar no ISCTE, colaborador do Expresso, jornal Record, RTP, RSF temos um sardanapalo de alto coturno. Esta nobreza da subserviência, que ama de amor fátuo os pobres, despeja estatísticas, compara números e épocas, sistemas políticos e faz da folha Exel a sua bíblia, não repara que os estratos mais frágeis da sociedade continuam a viver sem dignidade enquanto eles vivem à grande e à francesa. Se Deus me deu algum dom, e esse foi a facilidade de escrever e reflectir, ponho-o ao serviço daqueles que ainda mal sabem pensar, embora o país democrático diga que o analfabetismo pertence ao Estado Novo. Segundo as suas estatísticas, em 1970, havia 29% de analfabetos; hoje somos um país de gente cultíssima. Basta ouvir falar os senhores deputados, ministros e jornalistas para percebermos em que nação vivemos. 

         - Ai vida, vida! Nem a velhice deixas descansada. No que a mim me toca, nem a dor posso viver no ripanço.  

         - Passei na farmácia, em Lisboa, e o farmacêutico, assim que me viu: “Esteve cá o meu Simão e ofereceu-me uma prenda que me deixou (um leque de mãos) ...” Desaparece. Volta daí a instantes com os três volumes do meu Diário editados e pede-me que os autografe. Digo-lhe não faço isso a granel. Faz uma cara desconsolada de menino infeliz. “Está bem – digo – um de cada vez. Hoje levo um, na próxima semana outro e depois o último.” Abriu um grande sorriso: “Veja como o meu Simão é querido.” 

segunda-feira, junho 21, 2021

Segunda, 21.

Entrego aos iluminados comentadores políticos a descoberta das razões que levaram os franceses a deixar as mesas de voto regionais às moscas. Para mim retenho o estado da democracia: quase setenta por cento dos eleitores não exerceram o seu direito de voto! Todavia, já oiço dizer que os grandes derrotados foram Macron e Marine Le Pen. Como se vê nada muda nunca. 

         - Ontem já não tomei o Ben-u-Ron, hoje terminei o antibiótico. A partir de agora é o organismo que fica entregue à sua sorte. 

         - O Brasil ultrapassou os 500 mil mortos por coronavírus; em todo o mundo são 4 milhões! 

         - O PSD, PPM, CDS convidaram, perdão, forçaram um homem ligado ao futebol para ser presidente da Câmara de Gaia. Ao fim de semanas de pressão, o homem respondeu-lhes à letra, demostrando mais uma vez o que é o enxurro partidário neste pobre país: “Ao longo de três meses fui sujeito a pressões, intimidações e ameaças. Tentaram impor-me o pior da "mercearia partidária" (fabulosa designação) e tentaram envolver-me nas mais inacreditáveis negociatas de lugares. Enfim, quiseram obrigar-me a empregar os beneficiários do rendimento mínimo da política. Não conheço este PSD que, em Gaia, está prisioneiro de quem só lhe faz mal, para fazer bem a si próprio. Não quis acreditar que fosse possível fazer política com base nos piores princípios da espécie humana. Mas, aqui, em Gaia, no meu partido de sempre, é o que se passa." Quem assim fala não sou eu, é António Oliveira ex-treinador do futebol. Honra lhe seja feita. 


sábado, junho 19, 2021

Sábado, 19.

A casa. Olho-a de um modo diferente quando o sofrimento me invade. À minha volta aperta-se o cerco de refúgio, de fortaleza, e o meu olhar enche-se de ternura por estes espaços onde me sinto em segurança e paz. Há uma espécie de imperturbabilidade que a toma por inteiro, de modo a dar-me aquilo de que estou necessitado: um certo contorno na viagem das sombras, uma opacidade de luz que fecha o enquadramento onde os meus olhos pousam por ordem do coração e imposição da dor, reduzindo o salão a uma divisão secreta, onde estou estirado na chaise longue inspirando a atmosfera que contribui à minha recuperação. Cada elemento que a compõe – livros, quadros, sofás, móveis, mesas, estantes e objectos – dispostos há anos quando os trouxe da casa de S. Marçal, ainda impregnados do impulso que me tomou quando pude deixar o Príncipe Real e instalar-me no campo, todo esse entusiasmo do jovem-homem galopando o destino, é agora, nesta hora de tibiezas, neste recolhimento de uma intimidade de metástases psicológicas que ferem, isolam, o último refúgio acampado na misericórdia dos dias e das horas que por ínvias esferas se metamorfoseiam em recordações sólidas, intensas como este fim de tarde que agoniza diante dos meus olhos turvados de mágoa. De quando em vez um amigo lembra-se do pobre solitário, particularmente a Alice e o António que falam todos os dias, e o mundo entra nestes muros trazendo a renovação na esperança, a confiança no silêncio ligeiro povoado pela passarada que nada sabe do que se passa dentro dela. E no entanto, não me vendo assomar à porta espreitam pelas janelas a certificarem-se se estou bem e a convidarem-me para um passeio ao sol tímido que dá saúde e introduz no coração as energias perdidas. Sorrio-lhes e volto a fechar-me no latejo das picadas que a miúde sinto. Estiro-me no sofá e quase me entrego a um sono moribundo, daqueles que não recuperam, antes nos atiram para o poço da desgraça. Dou conta que os meus autores estão mudos a olhar-me com compaixão. Ouço os mais aristotélicos ou os estoicos a puxarem pelo meu moral afundado no lodo da imagem de mim. Mas o tempo imobilizou-se, o sol desapareceu e tenho esperança que amanhã será outro o dia. Antes porém, a casa será invadida pela noite e fechadas as portadas, as luzes acendidas, o conforto cingindo-me a alma, sou o guerreiro que ficará de alerta e combaterá o desespero, a febre, e toda a panóplia de enfermidades que não tenho vida para suportar... 


sexta-feira, junho 18, 2021

Sexta, 18.

Aqui estamos nós impedidos de sair para onde nos apetece. A partir de hoje e nos próximos fins-de-semana ficamos confinados ao distrito que nos abriga, Isto porque os casos de coronavírus aumentaram substancialmente. Somos qualquer coisa como 2,9 milhões de reclusos na Área Metropolitana de Lisboa. Pergunto eu: então não era previsível? Mais uma questão inocente: que política é a da DSG? Será que tanto o Governo como o organismo da saúde não sabem em que país vivem? O povo que educaram ao longo de 50 anos de democracia? 

         - O que por aí vai com os dinheiros da “Bazuca”! Quem conseguir ocupar o poder durante os próximos anos, vai sair rico. Os partidos já só sonham com a parte que lhes cabe dos 1,8 biliões de euros que deverão começar a ser distribuídos a partir de Agosto. Dizem, ufanos, os nossos amantíssimos governantes, que fomos os primeiros a entregar o estudo de aplicação do euromilhões e fizemo-lo às seis da madrugada! Merecemos, portanto, ser recompensados em primeiro lugar como bons pobres que somos. Recordo-me que já em Janeiro deste ano se dizia que o bolo devia chegar no início do ano, dada a pobreza que cresce pelo país. Agora está apontada a esmola para Agosto. A ver vamos o que nos dizem a Hungria e a Polónia. 

         - Passei a noite em claro com dores. Pelas quatro da madrugada desci à cozinha para tomar um Ben-u-Ron e daí a algum tempo desapareci mergulhado no sono. Não sentia propriamente a ferraille, mas sangrava, tinha dificuldade em salivar. Andei toda a manhã tonto, ainda com dores, estendi-me na chaise longue do salão e passei pelas brasas. O resto do dia, foi passado ao telefone, a fazer as papas que devo comer até segunda-feira. Isto não e pera doce! O António que é medricas com a saúde, dizia-me que preferia ir fazer de novo a guerra na Guiné que submeter-se a uma operação destas. E de facto. No bloco operatório, anestesiado, não se sente rigorosamente dores, mas o trabalho do médico vi-o através do cérebro. Fui acompanhando todos os passos, sentindo a broca a perfurar o osso, depois a entrada dos parafusos, a aspiração dos pequenos pedaços de carne, as agulhas, os dedos do cirurgião. Mas o que me perturbou até às lágrimas, foi o gesto humano do Dr. Pedro Santos de quando em vez acariciando-me o braço como a dar-me coragem para o que era na realidade difícil. A dada altura ele disse: “Está tudo a correr muito bem, a empatia que temos um pelo outro conta muito.” Referia-se, decerto, à conversa que trouxe ao diálogo a irmã que comigo trabalhou na antiga Emissora Nacional. 


quinta-feira, junho 17, 2021

Quinta, 17.

O fardo da pandemia não nos larga. As vozes agoirentas já nos anunciam a chegada da quarta vaga da Covid-19. Enquanto a primeira irrompeu no Norte, esta começa a Sul, em Lisboa. 

         - Adoro os dias como o de ontem. As horas passando numa ronceirice fraterna com os livros, as pequenas coisas, os insistentes olhares sobre o passado para reter o que o tempo quer apagar. Em dias assim, apesar do que expus, não são dias inúteis onde nada de importante acontece. Pelo contrário. São dias robustos, abastados de múltiplas coisas que se foram arrastando quando as horas e os dias pareciam encalhados algures num corpo que não me pertencia. Digo a mim mesmo que não quero fazer nada e depois, a pouco e pouco, como uma chamada à razão, eis que levanto uma mão de livros da mesa do salão para ir lá acima arrumá-los nas estantes; tomo notas dos sublinhados para fichas no computador; vou lá fora trabalhar um pouco no jardim; faço um almoço diferente, mais apurado, como se fosse domingo e eu tivesse o tempo todo à minha disposição; admiro pela enésima vez o interior da casa, detendo-me nas telas do Carlos R. Pinto onde descubro há mais de trinta anos um detalhe novo; contemplo através das janelas as árvores cujo movimento é sempre dissemelhante, reinventado pela luz, as sombras, a projecção do azul do firmamento; respiro este silêncio divino, carregado de anátemas de tempos idos, hoje sublime porque me envolve num paraíso terreal, construído para desfazer o homem que aqui permanece na concupiscência que teima em não o  largar, espécie de pesadelo que tem de carregar até ao fim dos seus dias; escuto a inesperada canção da chuva que me acordou, os olhos no céu pardacento, nas criaturas vegetais iluminadas pelo prazer dos pingos massajando-lhes os dorsos tenros; impregno-me desta massa compacta de vida, respiro-a, absorvo-a na certeza que retenho a centelha de vida que me há-de fixar a este chão de alegrias múltiplas, a este silêncio pejado das vozes juvenis do Universo imaterial, aqui transudadas para erguerem os dias do dilúvio da felicidade imortal de mundos inacessíveis...  

         - A Piedade trouxe-me os primeiros figos. São escuros por fora e vermelhos por dentro. 

         - Registo estas entradas sob o efeito da dor dos implantes. Tenho um saco de gelo numa mão e escrevo com a outra. Que dizer? Hoje muito pouco, apenas o facto de achar uma maravilha a evolução destas técnicas. E ainda o facto de agora poder passar pelo socialista François Holland sem que ele diga: “Ali vai um pobre desdentado.” 


quarta-feira, junho 16, 2021

Quarta, 16.

Talvez a verdadeira geringonça seja a que os partidos conseguiram em Israel. É certo que foi para correr definitivamente (espero) com o corrupto Netanyahu; ainda assim é de louvar o acordo que arrasta todas as correntes políticas da direita à esquerda. A nossa “geringonça” ao lado daquela, é um pequeno negócio de interesses mesquinhos e vaidades esparsas. 

         - Fui ontem ao encontro da pintora Teresa Magalhães respondendo ao seu pedido de véspera. Ela quis oferecer-me o catálogo da exposição que teve lugar na Galeria Valbom, em Lisboa, e conta com o texto do entretanto falecido António Rodrigues. Os convites para expor agora que Marcelo R. de Sousa oferece o físico ao combate à Covid e ao primeiro-ministro, alargam-se e ela quer absolutamente que eu autorize a inserção do meu texto numa próxima exposição. Já lhe expliquei que o referido escrito foi pensado para uma temática especifica, mas ela teima que pode figurar em qualquer uma. Bom. Justamente os textos que escritores e estudiosos de arte, críticos e amigos têm o bom hábito de acrescentar às exposições como material de apoio do visitante. A Maria João com quem estive segunda-feira, entregou-me dois catálogos da exposição – um para ela, outro para mim -, sobre o tema Casa dos pintores Martinho Costa e Rui Macedo neste momento patente na sua galeria. Quem faz a apresentação é o escritor Gonçalo M. Tavares com um texto francamente... É pena porque o tema tem pano para mangas como se costuma dizer. Esperei que a Teresa acabasse de ler o que traduzira da pintura Gonçalo Tavares e logo ela: “É fraco, não diz nada.” Talvez diga, mas com outras palavras e sensibilidade. 

         - Parece que anda aí mais um campeonato não sei de quê, porque jogos disto e daquilo entopem a informação deixando de lado os verdadeiros problemas da humanidade. E do que quero falar é, justamente, de humanidade. Vi no canal 2 francês uma imagem impressionante que me comoveu. Um jogador tinha caído de súbito inanimado no relvado em pleno jogo. Depressa foi socorrido e parecia ter morrido no mesmo instante em que soçobrou. Logo os companheiros, em lágrimas e expressões de horror, cercam o infeliz evitando que as câmaras assassinas das televisões filmassem o triste acontecimento. Este gesto de uma humanidade sem fim, revela os corações frágeis que a informação desumanizada dos nossos dias não respeita nem venera. Quanto pior melhor é o rasto absurdo da notícia. Face a um mundo onde triunfa a vulgaridade, um gesto destes é de enaltecer. 

         - A dor do lado direito da região lombar que me levou em Janeiro ao hospital da Luz, não há meio de passar. Basta que pegue na roçadora uma horita, para ficar estragado dois dias seguidos. Conclusão: tudo patina por aqui. Hoje não deixei este espaço radioso e meti ombros a tarefas mais ligeiras como limpar o terraço nas traseiras da casa, apanhar meia-dúzia de ameixas, adorar as figueiras que abarrotam de figos, nadar. Dizem-nos que hoje e amanhã a chuva vai voltar. Com efeito, ela já caiu forte no Norte com estragos consideráveis na agricultura e casas. Tempo, portanto, incerto. As horas foram intervaladas com trabalho exterior, este registo, revisão do romance. Desse ponto de vista, jornada plena. São 17 horas e seis minutos. O Sol deu um ar de sua graça pelo meio-dia e espreguiçou pela tarde a dentro. As hortênsias disseram-me há instantes que agradecem. Uma abelha ferrou-me num braço, outra numa mão. Amanhã vou descascar a dentuça de cima. Chega por agora. 


terça-feira, junho 15, 2021

Terça, 15.

Falei ontem que o país anda desgovernado, mal eu pensava que a coisa está de tal modo preta que era possível haver esta troca de galhardetes: 

António Costa na sequência  do tal “comigo o desconfinamento não volta para trás” de Marcelo: “Ninguém pode garantir que não se volta atrás no confinamento e que o Governo adotará em cada momento as medidas que se justifiquem perante o estado da pandemia."

Resposta, arrogante, de Marcelo: "Por definição o Presidente nunca é desautorizado pelo primeiro-ministro. Quem nomeia o primeiro-ministro é o Presidente, não é o primeiro-ministro que nomeia o Presidente."

Até pode ser, mas quem mostra que melhor compreendeu a tragédia dos meses de Janeiro a Março, é António Costa. Honra lhe seja feita.

         - Primeiro lutei para as ver crescer, agora luto para não as deixar morrer. Refiro-me às hortênsias e à vida tout court




segunda-feira, junho 14, 2021

Segunda, 14.

A sensação que tenho é que isto anda sem rei nem roque. No país instalou-se uma espécie de anarquia onde vale tudo menos censurar as autoridades. O único que ainda está sob controlo é o zé povinho, tudo o resto anda à solta fazendo o que muito bem lhe apetece. O minúsculo partido IL (Iniciativa Liberal), montou, contra o parecer da DGS, um arraial popular em Santos; admoestado prosseguiu chamando-lhe “uma acção partidária”; o número de casos por Covid-19 está aumentar não só na Grande Lisboa como por todo o lado, mas o Presidente da República diz, num tom de eu quero posso e mando, que com ele “o desconfinamento não volta para trás”; os especialistas e médicos avisam que não é ainda tempo para festejos, novas estirpes do vírus estão aí, e os hospitais começam a encher, Marcelo responde que não são eles quem governam são os políticos, as festanças agrupam aos olhos da polícia centenas pessoas, ninguém ousa intervir; as praias estiveram a abarrotar este fim-de-semana, não apareceu autoridade para controlar... Eu que viajo nos transportes públicos, noto a diferença de comportamentos, numa de tudo ao molho e fé em Deus. Os políticos – Presidente da República, primeiro-ministro, deputados – estiveram na origem criminosa dos milhares de infectados depois do Natal e Ano Novo, dos milhares de mortes, da vida por um fio que nos assustou enquanto povo, mas não aprenderam nada – um voto vale mais que muitas vidas, as rivalidades provincianas mais que SNS.    

         - Li no editorial do Público uma coisa que ignorava: o RGPD (Regulamento Geral de Protecção de Dados), custa qualquer coisa como 140 milhões de euros por ano! Portanto, existem meios que nos protegem por direito. Então como foi possível que o bebé Nestlé os tivesse furado sem que nenhuma instituição desse por isso? 

         - Gostaria de acrescentar algo ao que disse falando de Julien Green outro dia (ver Segunda, 7). Abrindo ao acaso o seu testemunho pungente, deparo com esta entrada, sublinhada por mim, sem data, de 1940, pág. 1241, que revela a minha observação: “Le vice commence où finit la beauté. Si l´on analysait l´impression que fait un beau corps, on trouverait quelque chose qui s´apparante à une émotion religieuse. L´oeuvre du Créateur est si belle que le désir de la transformer en instrument de plaisir ne vient qu´après un sentiment confus d´adoration et émerveillment.”

         - Ontem despachei-me para a Brasileira manhã cedo. Pensava eu poder trabalhar sossegado mas, para grande surpresa minha, o café abarrotava de turistas sem máscara num convívio antes coronavírus. Sentei-me no interior, na mesa do fundo, e aí fiquei isolado de tudo por duas horas. Reli vinte páginas da primeira parte de O Matricida e quase chorei de desgosto. Constatei, mais uma vez, que a rotina, os dias pautados pelo trabalho perseverante, são imprescindíveis à actividade da escrita. Um romance tem de nascer da obsessão, da escravatura, da entrega absoluta. De contrário, é como um passeio pedestre ao longo duma avenida onde nos cruzamos com muita gente sem vermos um só transeunte. A tarefa, esta, é muito difícil, mas não vou desistir mesmo que tenha de recomeçar trinta, quarenta vezes. Para me compensar, fui almoçar ao Corte Inglês. Escolhi o exterior com aquela vista sobre a cidade banhada de sol. Pouca gente, uma aragem suave rodopiando, um princípio de algo balbuciado entre os ruídos lá longe e os sortilégios da memória desassossegadamente presentes. 


sábado, junho 12, 2021

Sábado, 12. 

Congratulo-me com a onda de indignação que por aí vai devido ao desleixo e indiferença do “socialista” que está à frente da autarquia de Lisboa. De todos os quadrantes menos, claro, do seu partido, chegam vozes de protesto e denúncia de outros casos que o sujeito ignorou no passado. A forma que os do seu partido por todo o lado têm de exercer o poder: laxismo, autoritarismo, ignorância, falsa propaganda, dossiers mal estudados, projectos de conveniência, etc.. O nosso homem de seu nome João Miguel Tavares que leio com frequência sem que sempre esteja em sintonia com ele, esclarece-nos hoje no Público: “Passámos uma semana a falar das celebrações dos 50 anos do 25 de Abril e, vai-se a ver, os mesmos que andaram a encher a boca com a importância da democracia, estão agora a desvalorizar o facto de a CML ter práticas dignas do Estado Novo. É isto Portugal. E ninguém leva a mal.” Claro que ainda bem que se fala e pratica a democracia, caro João Miguel. 

         - É inquietante que o jornal Público volte a fazer o ponto de situação da Covid-19 como fez durante meses quando o bicho não nos largava. Isto prova que os novos casos estão a fugir ao controlo. De facto, há mais mortes e o número de infectados em Lisboa e na grande Lisboa começa a ser preocupante. As mortes acumulam-se e são já 17.044, a capital está acima do limite de risco – 120 casos por 100 mil habitantes. 

         - António Costa esta semana saiu-se com esta a propósito do turismo: "Esta crise (pandémica) demonstrou bem a fragilidade de alguns dos sectores económicos mais robustos, mais promissores e que foram áreas de especialização natural em muitas regiões. É o caso do turismo.” Depois: "Isso significa que nós, cada vez mais para o futuro; não podemos depender tanto e só de um sector económico, temos de ter a capacidade de desenvolver e de ativar outros sectores económicos, porque novas crises podem surgir e não podemos estar tão fragilizados perante essas crises como estivemos desta vez."

         - Em Setembro de 2018, a conversa era outra: “Não há turistas a mais em Portugal. Pelo contrário, temos de aumentar a intensidade do turismo” e de “melhorar e diversificar a oferta”. Se o sector vale hoje 8% do PIB, ficou traçado o objectivo de chegar aos 10%, a média do peso que o turismo tem no espaço europeu.” 

         Até que enfim, excelência! Só falta agora passar das palavras aos actos! 

         - Outro dia almocei com o Carlos Soares que tinha regressado do Porto onde a sua obra de pintor e desenhador foi mostrada a um grupo de entendidos em arte. Ele oferece-me de quando em vez um desenho e começo a guardá-los numa pasta ciosamente. Aqui há tempos brindei-o com dois livros meus e logo recebi este desenho a partir do terceiro volume do Diário publicado. 


sexta-feira, junho 11, 2021

Sexta, 11.

O delfim de António Costa, pelos vistos, é useiro e vezeiro a expor aqueles que nos pedem asilo e protecção aos seus algozes. Uma tempestade tem assolado o país porque o homem não é só nulo, é também manhoso, faz-se de inocente e sabe porque o seu patrão lhe ensinou, que a melhor técnica é entregar a borrasca ao tempo que tudo sepulta e esquece e varre da memória dos gentios. Outras vozes, entretanto, se levantam contra a nulidade que governa Lisboa. São imigrantes aflitos, que passaram pelos mesmos métodos e viram o resultado plasmar-se nas suas vidas. Todos têm hoje medo, já não se sentem protegidos, mas não podem regressar aos seus territórios governados por ditadores, oligarcas ou tiranos. É incompreensível que seja uma autarquia, por grande que seja, a enviar documentação directamente aos governos de origem dos que por cá ficaram para fugir à repressão, à prisão e porventura à morte. Como muitos dos que hoje ocupam pastas governamentais fizeram para escapar à ditadura do Estado Novo. Se o homem não se demite e ainda por cima utiliza a prática de atacar a oposição para ganhar terreno, que os lisboetas lhe retirem a confiança nas eleições que brevemente ocorrerão.

         - Contudo, há na origem deste procedimento, uma espécie de bandalheira pública que remete quem nos governa para o laxismo tão querido à governação do Estado. A forma impositiva como hoje se pedem informações sobre a nossa via privada – bancos, administração pública, empresas, Google e outros sistemas informáticos, supermercados, companhias de segurança, fornecedores de água, electricidade, comunicações, etc. – sem que saibamos o que vai acontecer aos nossos dados, como se todos estes organismos, incluindo o Estado, nos tratassem como seus servos sem direito à nossa reserva, à nossa dignidade, ao direito a não responder ao que se nos afigura ir para além do razoável. Outro dia, no banco, passaram-me para as mãos uma página A4 cheia de perguntas qual delas a mais íntima. Respondi apenas a três e disse que ao resto me recusava. Eu pude bater o pé porque o meu tout petit bout de rechesse mo permitia. No rol até o diploma de doutor pediam!!! Bem sei que neste país de analfabetos, de gentalha de uma importância sem igual, pronta a largar o nome de família pelo título disto e daquilo, ser tratado por doutor é não só ter as portas do inferno abertas como as do céu, pela simples razão que os corruptos, os assassinos, os novos-ricos, os políticos com e sem ideais, toda essa gente rasca, rica e poderosa, viaja ao sabor das suas conveniências e prestígio. É por isso que na Assembleia da República onde há tantos doutores, engenheiros e, sobretudo, advogados foi instituído o principio do tratamento entre todos de “senhor deputado”. Mas há mais, o retrato deste país governado por insignificâncias, forjado na CGD, apesar de inquéritos pidescos, pergunta-se como foi possível que certos “clientes” pudessem ter ficado a dever milhões à instituição de todos nós??? Mistério. 

         - Anteontem refugiei-me num café perto do meu dentista e trabalhei duas horas no romance. Como andei arredio da história desde 11 de Maio e hoje voltei a ela hora e meia, portanto, sem a entrega que este género literário exige; para encontrar o fio à meada como se costuma dizer, imprimi as 60 páginas da primeira parte. Sobre elas trabalharei nas próximas semanas e verei que rumo me permitem as personagens trilhar. Um romance é uma prisão para o romancista; vive-se atrás das grades onde somos cativos da vida pujante que atapeta as suas páginas. 

         - O ARNm é uma molécula que copia as instruções do código de ADN, que estão no interior do núcleo das células, para outras estruturas celulares chamadas ribossomas, onde são produzidas proteínas. Quando foram criadas formas sintéticas de ARNm, em 1961, os cientistas logo pensaram usá-las para pôr as células a fabricar substâncias terapêuticas. Deste modo, treinam o sistema imunitário para reconhecer o vírus, em caso de infecção. ARNm (de mensageiro).  


quinta-feira, junho 10, 2021

Quinta, 10.

O pais está putrefacto e esmagado pelo sistema que o alimenta. Não há dia nenhum que não se conheça o nome de mais um criminoso saído da cartola da classe política, dum banco, duma instituição pública qualquer. Somos governados por uma seita de salteadores que nos leva a carteira e a vida. A mais recente veio do lado do “socialista de esquerda” que com arrogância e sentido ditatorial comanda hoje o ministério das Infraestruturas. O seu antigo chefe de gabinete quando o pimpão exercia funções de Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Nuno Araújo, que também foi deputado e mais não sei o quê que esta gente sabe ir buscar chorudos ordenados até à cabeça de Karl Marx, está metido num inquérito por factos relacionados com a celebração, por ajuste directo, de aquisição de serviços entre uma sociedade comercial que controlava, os municípios e a empresa pública, numa manobra que incluía mais do que uma firma sob a sua alçada. O seu amigo, Pedro Nuno Santos, interrogado pelos jornalistas, respondeu nada saber. E deu às solas. Quanto a António Costa, não me admira que termine em versão Durão Barroso, embora sem o sorriso pateta. 

         - A Câmara de Lisboa enviou os nomes, moradas, e-mails e outros dados pessoais dos organizadores da manifestação anti-Putin e a favor do jornalista Román Protasevich detido em Moscovo, para a embaixada russa e Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia, expondo assim os envolvidos no direito ao protesto, à retaliação por parte de um ditador comunista que oprime e proíbe e condena quem se mostre contrário ao seu poder discricionário. O mais surpreendente na forma de dirigir a autarquia pelo bebé Nestlé, é a irresponsabilidade dos seus actos. À parte a propaganda que é mestre, tudo o resto é feito de qualquer maneira, em cima do joelho, escudado pela lei que aplica célere quando lhe convém. Pois para mim este seu acto mereceria a exclusão do posto de imediato. É muito grave tendo em vista as consequências para aqueles que aceitámos ter a nossa guarda e confiaram na segurança que lhes proporcionávamos. Saúdo a intervenção de Jerónimo de Sousa que me surpreendeu, ao considerar grave a atitude do Presidente da Câmara de Lisboa. Chapeau

         - Ontem voltei a ter uma lamentável discussão com o João. Conheço-lhe as tendências, a argumentação, o teor da cassete, mas mesmo assim, levado na corrente da amizade, caio de novo numa altercação que não me leva a nada. Fiquei muito incomodado, sobretudo porque ele não percebe que tudo o que apoia a Putin, Xi Jinping ping ping e a outros do mesmo género, é precisamente o que ele – e bem – combateu no tempo do Estado Novo. “Tu condenas sempre a esquerda” diz-me com uma ponta de tristeza no voo da voz. “Sim, porque vocês pretendem ter a palavra, a autoridade ideológica, a única, e fazem do poder trampolim para se arrastarem como ímpares mensageiros da verdade. Tudo o que o centro ou a direita produz é condenável. E porque para mim a grande desilusão é a esquerda.” Dou, todavia, graças à democracia que me fez ver aquilo que a ditadura me escondeu. Mas não preciso de ser deste nem daquele partido, sou pelo valor da dignidade, da governação para todos e com todos, contra os dois milhões de pobres, contra o senhor Costa que põe o amigo na direcção das Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril e paga-lhe em cinco anos 300 mil euros, contra as reformas de miséria, contra o estado da saúde e seus operadores, contra os salários eternamente baixos, contra as regalias de deputados e políticos, contra a classe política que mais parece e se igualha à monarquia, contra as reformas principescas dos senhores deputados em meia-dúzia de anos de trabalho, contra o mau funcionalismo público, contra as arbitrariedades praticadas aos cidadãos, contra as assimetrias de toda a ordem, etc. etc. etc.. Não necessito de nenhum partido a dizer-me o que devo e como devo pensar – basta-me ser filho de Deus para abarcar em mim toda a vasta e nobre dimensão humana.  

         - O espetáculo das hortênsias que lá fora alindam o espaço, entrou para dentro de casa garças à Piedade que com as flores tem uma intimidade particular. Os meus olhos pousam como borboletas nos encantos florais que só ela sabe construir. Vou fazer meia hora de natação. 

Até o gato se abriga do calor debaixo do caramanchão de beleza 




quarta-feira, junho 09, 2021

Quarta, 9. 

Emamnuel Macron levou uma bofetada de um francês que o esperava num daqueles banhos de multidão onde os políticos atestam da sua popularidade. Não vou dizer que estou de acordo, de maneira nenhuma. Todavia, o que é um simples tabefe com os murros que eles nos dão em plena cara quando nos impõem leis estúpidas que são urdidas nas sedes dos partidos e nos transtornam a vida para sempre; o que é um ténue sopapo quando nos roubam milhões, traficam influências, compram decisões e nos encravam a vida com teorias absurdas que só os preservam a eles no poder! Estamos tão fartos de aldrabões, vigaristas, gente sem qualidade, incompetentes e chicos-espertos que tarde ou cedo cenas como aquela se multiplicarão, quanto mais não seja como tubo de escape para coisas maiores e mais graves. Em nome da democracia, é-lhes consentida toda a espécie de arbitrariedades, arrogância, imposição de ideais políticos, etc. 

         - Todos sabemos que a UE é um grupo de gananciosos onde cada um trata dos seus interesses. Nela aplica-se como fato cortado à medida o velho ditado: “Cada um trata de si e Deus de todos. Foi o que aconteceu com Espanha que mandou controlar as fronteiras não deixando passar o português que ao seu território ia comprar caramelos. Logo se revoltou o Presidente da República, primeiro-ministro e ministro do Negócios Estrangeiros, argumentando que eles têm mais tinhosos com covid que nós. Ante tanto barulho, veio de Espanha trazido pelo bom vento a informação: tratou-se de um engano, miseráveis portugueses. Sorriram os de cá e o Presidentes de nós todos que está na Madeira de bom clima e boas praias, silvou de lá: tudo acabou em bem e não se fala mais nisso – todo o pagode do “contenente” amochou.   


segunda-feira, junho 07, 2021

Segunda, 7.

Ontem procurei na Net pelo segundo volume do Journal Intégral de Green. Embalado, li alguns artigos sobre o escritor e verifiquei que os articulistas continuam a dizer que ele foi um “escritor católico e espiritual”; embora em vida se tivesse fartado de combater tal ideia e sempre a recusasse com veemência. Green conhecia-se e tinha a determinação de deixar escrito o “pecador” que foi, as corridas loucas por rapazes que lhe coube em sorte penetrar. Viveu na dor, na impossibilidade de dominar a catastrófica necessidade de sexo, do qual foi escravo pelo menos até aos 40 anos (veremos no tomo 2 se foi para além de 1940. O escritor nasce a 8 de Setembro de 1900 e morre em 1998). Na parte final do livro, vamo-nos apercebendo quanto o desassossego sexual apoquenta o escritor e como ele se coloca perante a doutrina de Jesus Cristo e a culpa que os seus dias derramam sobre o homem crente que Green foi. 

         - Todas as sinfonias de Beethoven ontem na ARTE. Eu assisti à Quinta, Sexta, Sétima Oitava e Nona (esta às 20 horas de Lisboa) executadas em vários países com pivot a partir de Estrasburgo. Magnífico. A Sinfonia nº 7, transmitida julgo que do anfiteatro de Delfos. Identifiquei o lugar onde estive há uns 20 anos, os diferentes níveis do monumento grego que calcorreei sob uma extrema fadiga e um sol de chumbo, com o Monte de Parnaso a cercar a paisagem a perder de vista. Só o entusiasmo, a excitação de tudo conhecer, tocar, viver me impeliam a ir sempre mais longe. A Ode a Alegria aconteceu no Palácio de Schonbrunn nos arredores de Viena, onde estive pela segunda recentemente. Este ano, comemora-se por toda a Europa culta, o 250 aniversário do compositor.  

Delfos no Monte Parnaso. 


         - A Hungria está de joelhos diante da China! Os chineses já por lá andam há um tempo, mas agora pretendem construir uma universidade com o seu próprio dinheiro. A loucura expansionista do Sr. Xi Jinping ping ping não pára. O que dirão agora os párocos da nossa esquerda sobre Viktor Orban, nomeadamente, João Corregedor grande amante do comunismo e inimigo do senhor que governa em três eleições sucessivas o país: 2010, 2014 e 2018? 

         - A contra-argumentação de António Costa à iniciativa de Boris Johnson em obrigar os seus compatriotas a quarenta à chegada do Algarve, parece conversa de mulher a dias. O Reino Unido fez muito bem em sair da UE, a prova está agora nas decisões que toma sem ter que as submeter ao grupo de corruptos de Bruxelas. Costa e os outros não lhe perdoam a independência e quer com o seu discurso levar os súbditos de sua Majestade a estar contra o seu chefe de Estado. É o jogo habitual do socialista – sujo.    

         - A dúvida permanece: temos gato ou gata. A Piedade tem a resposta: “Apalpe-lhe a coisinha”, e eu: “Não tenho o hábito de andar a apalpar a coisa de macho!” 


domingo, junho 06, 2021

Domingo, 6.

O PCP incompreensivelmente sempre esteve contra o confinamento. Vai daí, sendo a junta e a câmara dele, as festas de Pinhal Novo não podiam faltar até porque são mais importantes em votos que o coronavírus chinês. O largo em frente à estação de comboios, está transformado num arraial de montanha russa, carros de choque, carroceis e tudo o que anima a malta. Esta é a imagem do que poderá vir a ser a regionalização tão querida da esquerda. O país vai andar a duas dimensões e os interesses partidários e dos caciques à velocidade da luz. 

         Estive a ler no Público o artigo de três páginas do homem da democracia liberal, João Miguel Tavares. É uma peça cheia de contradições e não propriamente um texto corrido, mas antes tópicos para um trabalho melhor pensado. Gosto de o ler porque ele documenta-se bem e leva atrás do trabalho de pesquisa a crítica mordaz que é habitualmente a sua e me agrada sobremaneira. Exemplo. Escreve ele a dada altura: “O grande problema da política portuguesa não é o radicalismo dos seus extremos – é o conformismo do seu centro.” Logo no parágrafo seguinte: “Aquilo que nós precisamos, e não temos, nem sequer como desejo, é de um radicalismo do centro, ou de um  centrismo radical.” Em que ficamos? Então num caso como noutro não é de radicalismo que se trata e, portanto, ambos reprováveis?  

         - Desde que terminei a leitura de Alegria que me tenho remetido à badalação livre dos dias, espreitando de quando em vez o romance e arquitectando no meu cérebro o batismo de Volodymir no tempo em que por ordem de Estaline a Igreja Ortodoxa foi banida, as igrejas incendiadas ou destruídas, e ele teve que ser batizado depois da meia-noite na catedral de Anadyr, às escondidas das autoridades de Tchukotka. À parte isto, constantes idas a Lisboa, ora à oftalmologista, ora ao estomatologista, numa dança que não sei dançar e sou pouco dado a apreciar. Amanhã lá tornarei.

         - Mergulhei hoje e espero continuar a fazê-lo até Setembro. Então voltarei a adormecer a água e deixarei este Portugal dos pequeninos para uma temporada em Paris. Regas quotidianas. Silêncio. Plenitude das tardes quentes no oceano de verdura e cânticos da passarada. A casa cheira à obra de Julien Green quando o li pela primeira vez numa tarde de verão como esta. Essa recordação traz-me sucessivos momentos de luz, de serenidade, de harmonia. O Sol descarrega radiações incandescentes para dentro destas paredes. Aqui respira-se saúde e paz e a 6ª Sinfonia de Beethoven converge de cada canto desta sala para centro do universo.  


sábado, junho 05, 2021

Sábado, 5.
A imagem arrepiante do jornalista Román Protasevich a responder a perguntas estudadas diante das câmaras de televisão da Bielorrússia, visivelmente sedado, transporta-nos ao tempo dos gulags de Estaline, Khrushchov, Brezhnev e por fim Putin. Era sinistra, trovão medonho que troou sobre milhões de russos, reduzindo-os a seres sem dimensão humana, manipulados e forçados a aceitar uma seita de criminosos que se apoderou das suas vidas e da Santa Mãe Russa. Espero que o Ocidente e os EUA onde a democracia se estabeleceu acredito definitivamente, conjuguem esforços para isolar regimes totalitários que só vingam ajudados pelas trocas comerciais com o mundo livre. Todas essas ditaduras comunistas de um só homem, apoiado nas forças armadas, não deviam merecer a consideração dos países civilizados onde a palavra é livre e o pensamento plana sobre divergências salutares que não oprimem antes consentem a diversidade e a liberdade de expressão.

         - Voltemos ao sujet que atraiu Teolinda Gersão: a incapacidade de entre duas grandes guerras os artistas (muitos) assumirem a sua homossexualidade. O burguês Thomas Mann, tendo construído a sua vida sob um embuste, obcecado pela fama, pelo dinheiro, a vida lá no alto, privando com os gananciosos, “os industriais”, num faz-de-conta constante. Foram raros os escritores que assumiram e trabalharam sem a capa das personagens femininas que se percebe terem reacções, paixões, gostos e sentimentos próprios da identidade masculina, em puro travestismo. André Gide que sempre se esteve nas tintas para o que dizia a foule, os rapazes imberbes por preferência, nunca se privou de correr Paris no seu encalço. Ele sabia porque o romancista lhe havia transmitido, que Julien Green mantinha um diário, digamos, “indecente”. Os dois escritores falavam disso, Green conheceu o sucesso logo no início de carreira, escondendo a sua natureza sexual atrás das personagens Adrienne Mesurat, Moira, Leviathan e tantas outras, atribuindo-lhes atitudes e gostos que vivia com homens e rapazes com quem mantinha relações sexuais – e foram centenas. Mais tarde, num momento de desespero por não poder ser sincero (ele era pela verdade), lamentou ter-se ajustado à moral burguesa, simulada e tergiversante, afirmando que as personagens femininas dos seus livros não passavam de homens dissimulados. Aliás, Paul Morand, havia dito o mesmo no seu Diário, ele que não pôde ler o Diário ad mortem de Green, entendido como era em mulheres... . Gide expôs-se e ao fazê-lo acrescentou à sua obra a imortalidade. Hoje continua a ler-se Gide e muito menos Green, apesar de ser um grande escritor. Mas o autor de Les Faux-Monnayeurs foi corajoso, e conseguiu agitar as mentes e submetê-las a outros valores e ciências sociais. Muitos dos escritores contemporâneos de Julien Green, disfarçaram os seus gostos em casamentos de fachada. Como ainda hoje se passa com alguns dos meus amigos, dos vossos amigos porventura para quem a vida nunca poderá ser uma travessia feliz, nem para eles nem para as mulheres e muito menos para os filhos. Não são felizes no murmúrio consigo mesmos, como nas relações do quotidiano – há sempre algo que lhes passa ao lado, uma vida dupla que se derrama na escuridão, no submundo da consciência, uma personalidade que não se aperfeiçoou. Acabam por morrer escondidos da vida plena, insatisfeitos com a covardia que os tomou como uma doença sem cura nem salvação. E até o adorno que a mulher é, diluísse na mentira que os atormenta para todo o lado – o outro que o observa detecta o que eles com denodo querem esconder. É uma obsessão. 

         - Pelo Algarve vai uma debandada apressada. Boris Johnson travou entusiasmos portugueses e, sempre atento e indiferente à política cúmplice e desastrosa da UE, ordenou que a partir de segunda-feira todos os nacionais que chegarem de Portugal ficam sujeitos a quarentena. Daí os aviões não têm parança e os areais de ouro esvaziam-se estorvando assim os entusiasmos de António Costa e Marcelo de Sousa, as duas argentarias da desgraça airada. Que diabo, Mr. Johnson, listen to me: o Algarve é sol e mar e ali o coronavírus não é convidado a banhar-se! 

         - Dia magnífico. Trabalhei na mesa no terraço de manhã e à tarde comecei, enfim, o tratamento da água, estendi as espreguiçadeiras, abri guarda-sóis e olhei deslumbrado o céu de azul imaculado. Eis que o Verão chegou! Aleluia! 

sexta-feira, junho 04, 2021

Sexta, 4.

As diferenças no mundo de hoje são cada vez mais abissais; o fosso entre ricos e pobres, é criminoso e inumano. O caso das vacinas fala por si: 1 em 5 estão vacinados nos países ricos; nos países pobres 1 em 5000!

         - “A ERC é uma instituição partidarizada e/ou governamentalizada que, nos casos politicamente relevantes, se tem revelado mais regulada que reguladora, sendo habitualmente ocupada por comissários políticos.” Estas palavras são de Francisco Teixeira da Mota e juntam-se ao que eu registei aqui (domingo, 30). Estamos tramados. Ao abrigo da democracia, criam-se os mesmos esquemas de censura queridos dos regimes ditatoriais. Ainda a propósito da lei que regula a “desinformação” ou fact-cherkers ou fake news ou a saloiice da classe política e jornalística. 

Fátima Bonifácio dizia há dias no Público: “A Democracia tornou-se um regime oligárquico que governa para a oligarquia que a capturou. Essa é a verdade nua e crua… Os eleitores, coitados, têm de escolher entre o que os partidos lhes oferecem. E oferecem-lhes o mérito, o patriotismo, a honestidade e a decência? Não. Oferecem-lhes a mediocridade (técnica e política) a subserviência, a falta de escrúpulos, o seguidismo acrítico e tantas vezes – demasiadas vezes – a ganância pessoal….”

         - Mais um dia consumido em voltas e reviravoltas em Lisboa. Tomei café com a Teresa Magalhães e dei-lhe conta da minha estranheza em não a ver na homenagem às pintoras portuguesas que a Gulbenkian inaugura em breve. Mais a mais porque o  Museu possui algumas obras dela do período chamado Pop Art daí a minha surpresa e dela. Fui depois à CGD assinar o acordo do empréstimo, mastiguei qualquer coisa a caminho do dentista e voltei para casa no Fertagus quase vazio (na ida foi o mesmo) decerto devido ao fim-de-semana prolongado para muitos lisboetas. 


quinta-feira, junho 03, 2021

Quinta, 3 de junho.

Eis dois pedaços de prosa separados por um século. Este de Fialho d´Almeida, escrito em 1910: “Certos presidentes da república, que são monarcas a dias, nesta época em que as guerras são mais de bolsa que de exércitos, e em que para os indivíduos até os códigos de honra preconizam, em vez de duelos, indemnizações pecuniárias.” Saibam quantos..., pág. 88-89, Ed. Livraria Clássica Editora, 1924. 

Ou este, do escritor britânico Julian Barnes em entrevista a Isabel Lucas: “É sempre perigosa a noção de que um homem forte é a resposta a uma crise democrática. (...) Até que ponto um governo pode ser processado por assassínio? Podem continuar sem problemas não tendo tomado precauções, não tendo tomado as decisões certas, fazendo coisas estúpidas e egoístas, assinando contratos com amigos do governo que não têm competências provadas e produzem máscaras falsas? Há tantos indícios de corrupção à volta do que tem sido feito com a covid. Por outro lado, é maravilhoso como o sistema de saúde se tem portado. Os médicos, os enfermeiros, os auxiliares estão cansados e muito zangados com o modo como os políticos os têm tratado.” Os meus leitores mais atentos e com memória sólida, lembrar-se-ão que estas mesmas dúvidas e certezas já eu aqui as expressei por várias vezes, para não falar das comorbidades das suas vítimas. 

         - Acerca do tema, a resposta do primeiro-ministro ao susto pandémico durante a final da taça não sei de quê no Porto, depois de ter andado a fugir dias às perguntas dos jornalistas, a resposta que deu foi um espanto de irresponsabilidade, imprópria para o cargo que exerce. Daí que o senhor “penso eu de que” o tenha convidado a demitir-se. O chefe do FCP está lixado – o homem não lhe perdoa. 

         - Outro dia pegou-se-me uma saudade profunda de Simone de Beauvoir. Logo subi à biblioteca de cima e trouxe o livro La force de l´âge e durante todo o serão, revi sublinhados e comentários que fiz no livro de 700 páginas. Comprei-o, em Paris, em 1968. Esse era um tempo em que havia verdadeiros intelectuais, gente que remava contra a maré, era a consciência do povo e a da sua época. A França e a Inglaterra tinham muitos de referência que nada têm a ver com os papagaios dos nossos dias, que escrevem livros por encomenda, pequenas histórias que a mim me dão sono, mas os editores dizem ser aquilo que os leitores gostam. Pois que lhes façam muito bom proveito. Enquanto eu tiver uns 10 mil livros aqui para ler e reler, não tenho curiosidade em perder o meu precioso tempo com histórias mal escritas de lana-caprina. Não leio para passar o tempo, “para me distrair”, leio para aprender, conhecer, irmanar-me com os seus autores, acompanhar o tempo que me coube viver, elevar-me em espírito às coisas que autenticamente nunca estão resolvidas e abrem brechas cavadas no nosso ser.  

         - Toda a semana numa correria maluca para Lisboa. Pareço aquelas velhas desocupadas que coleccionam hospitais e médicos. Amanhã lá voltarei ao dentista. Ontem, tendo entrado no dos Capuchos às nove, só saí perto do meio-dia. Um horror! Fui de seguida ao encontro do João Corregedor com quem almocei no Adega da Mó completamente vazio. O dono lamentou-se-nos a falta de clientes, nacionais e estrangeiros. Este choro ouço-o por todo o lado, em conta-corrente com o entusiasmo de António Costa e Marcelo. Que acabaram de de confinar o país, isto apesar do número de novos casos por infecção estar a aumentar em Lisboa e grande Lisboa. A economia oblige. Também ontem a balbúrdia era imensa devido à greve dos transportes. Fui daqui no Fertargus verdadeira lata de sardinha. A Covid-19 a espreitar cada corpo para se instalar. Mas penso que as pessoas são mais lógicas e prevenidas que Costa; desistiram de frequentar restaurantes, espaços apertados, e por agora fazem uma vida diferente. É esta a impressão de quem frequenta o povo, os seus lugares, os seus ritmos. O resto é política que não bate certo com a realidade. O Reino Unido já pensa de novo em manter restrições a quem chega de Portugal. Vamos ver por quanto tempo o governo vai sustentar os seus delírios. Prazer imenso, imenso por não ter deixado este paraíso um segundo hoje e ter ficado horas colado à beleza luminescente das hortênsias.