Terça, 30.
Ontem,
à mesa da Brasileira, a discussão ocorreu elevada. Como a semana passada não
pude ir um único dia a Lisboa, o António Carmo telefonou a perguntar-me se
tinha morrido. Decerto fez o mesmo com os demais amigos, porque apareceram
tantos que tivemos de ocupar várias mesas. Grande debate sobre a obra de
Aquilino Ribeiro. Eu disse a dada altura que o transmontano não poupa a Igreja
em muitos dos seus livros, logo o simpático arquitecto corroborando da minha
afirmação acrescentou que não era menos verdade que o autor de Quando os Lobos Uivam tinha um sentimento
profundamente religioso. Profundamente não sei. O que talvez fosse natural atendendo
ao facto de ter passado alguns dos melhores anos no seminário. Depois, sem
programa estabelecido, passámos ao recorte de muitas das suas fabulosas
personagens. Aquilino deixou-nos na realidade uma paleta de figuras que
perduram através dos tempos e chegam até nós intactas na caracterização que
delas faz o escritor. Muitas ainda aí andam, religiosos e políticos, como legado
para os autores vindouros continuarem a desconstrução do que nos pretendem ocultar.
Forma de falar. Em verdade a literatura vigente, não constrói nenhuma figura
nem os “escritores” sabem fazê-lo, como os actores não sabem encarnar os papéis que lhes cabe
representar. A literatura de hoje, salvo raras excepções, é blá blá de
esplanada. Quero dizer, não se passa nada.
Mais
tarde, no Príncipe, onde abancámos e a nós se juntou o Paulo Santos, Alexandre
e o pide africano, do nada, a pretexto de o Paulo e eu agendarmos uma ida a
Alenquer conhecer o museu Damião de Góis, o Irmão, misturando tudo, fazendo-nos
subir do Sul ao Norte de Portugal, vimo-nos em pleno século XIX às voltas com o
Liberalismo, o charmoso D. Miguel e a perversa mãe D. Carlota Joaquina. Uma
discussão nasceu em torno destas personalidades. D. Carlota, pelo seu carácter
e influência que teve sobre o filho mais novo, o jogo que fez com D. Pedro, é
para mim uma personagem de romance. Muito riso e cumplicidade entre o Paulo e
eu que, sendo guia turístico em muitas alturas da sua vida, tem frescos os
acontecimentos maiores da arte e da cultura nacionais. Terminei a tarde no
atelier do Guilherme na companhia do Carlos, rememorando amigos, situações,
acontecimentos ligados à pintura e à vidinha de certos senhores hoje montados
no palanque da democracia e, naturalmente, muito democratas. Carlos despejou
meia garrafa de uísque.
- A dança das editoras que eu pensava
terminada, voltou. Nova proposta me foi feita obrigando-me a responder deste
modo.
Cara R. C.,
Surpreende-me o seu
e-mail, mas como sou educado, respondo sempre a quem me escreve mesmo aos
leitores do blogue que são inúmeros e com temas que por vezes me dizem muito
pouco.
Eu julgo que pertence
à C. E.. Acontece que pensei que tinha ficado claro na excelente e franca
conversa que tive com o seu colega L. R., Director de Edição, que as condições
que me propuseram não me interessam. É como se os trabalhadores do mundo
inteiro, de repente, tivessem de pagar para trabalhar. Eu dediquei dois anos da
minha vida à concepção de “O Pesadelo dos Dias Felizes” e 20 anos à realização
de “O Rés-do-Chão de Madame Juju”, trabalho há um ano em O Juiz Apostolatos.
Veja se compreende. Não tenho qualquer luxo ou vaidade em me ver editado, o meu
trabalho literário é sagrado e como tal deve ser respeitado e... venerado.
Estes são o décimo e décimo primeiro títulos que escrevi. Pertenci ao Conselho
de Leitura de uma editora respeitada, conheço o mundo editorial. Portanto...
Cordiais saudações.
Helder de Sousa
Helder de Sousa
- O polvo estende os seus tentáculos por
todo o lado. Só hoje centena e meia de agentes da Judiciária andaram a
fiscalizar residências, casas, escritórios, centrais de advogados em busca de
material que autentique a corrupção que por aí anda à solta. Em causa está o
juiz Rui Rangel, José Veiga (olha que tais!), Luís Filipe Vieira entre muitos
iluminados do futebol. Sobra ainda dois membros do governo José Sócrates cujos
nomes a Procuradoria não divulgou, acusados de peculato. Grande dia para os
homens da Polícia Judiciária às ordens da impoluta Procuradora Joana Marques
Vidal. Espero que em breve passem uns dias a fiscalizar as câmaras e juntas de freguesia
hoje transformadas em centrais do suga-suga.