Sábado, 29.
O espectáculo desumano da migração que
foge dos países em guerra ou onde há fome, parece não comover a Europa de
Bruxelas. Há anos que o baronato do euro assiste insensível ao drama, à morte,
ao enriquecimento de uns quantos, que extorquem antes de condenar à morte
milhares de homens, crianças, mulheres. Como se tivesse passado por todos eles
uma criminosa amnésia que não os leva recordar que há sessenta anos muitas das
suas famílias e alguns deles passaram pelos mesmos caminhos de fuga, o mesmo
mar, as mesmas angústias, os mesmos sofrimentos e humilhações. Não conseguem achar
uma estratégia para fazer face ao drama que não tarda atingirá um milhão de
pessoas, mas encontram saídas para afundar numa folha de cálculo os países que
ousem praticar políticas económicas que saiam da página Excel por eles traçada.
Para estes incompetentes, estes chicos espertos, é mais fácil reduzir
ordenados, aumentar impostos, atirar para a miséria os pequenos povos que os
fazem inchar de orgulho e presunção, que pensar a maneira de acolher aqueles
que fogem dos conflitos que eles e os Estados Unidos criaram. Os grandes
problemas que dizem respeito às pessoas, eles não possuem dimensão para os
resolver. São economistas – e isso diz tudo.
- Como o furgão frigorífico que foi encontrado há dois dias na estrada
que liga a Hungria à Áustria, com pelo menos 70 pessoas lá dentro entre
crianças, mulheres e homens, por mero acaso por uma patrulha de trânsito. Para
estupefacção dos agentes os imigrantes estavam todos mortos e já em estado de
putrefacção, devido à falta de ar e ao facto de terem sido deliberadamente
abandonados pelos criminosos condutores do veículo. Não é só o mar Mediterrâneo
que está juncado de cadáveres, são também as montanhas, as estradas, os portos
desta Europa governada por uma seita de palermas que nada entende de coisa
nenhuma. A tragédias destas os políticos da União Europeia responde que não os
chateiem porque estão de férias.
- Ontem, nas nossas deambulações pela Baixa, em todas as lojas que
entrávamos, Conceição e eu, instalava-se uma espécie de frisson. Eu explico. Sou de fácil abordagem e tudo me interessa que
diga respeito ao ser humano com quem tenho a honra de falar. Vai daí, num
ápice, emergia uma atmosfera divertida, como se empregado e cliente se
conhecessem de longa data. Com medo que a minha amiga se sentisse incomodada, pu-la
de sobreaviso: “Não sei se lhe incomoda a minha maneira de ser” e logo ela
muito rápida: “Os aristocratas procedem assim com todas as pessoas.” Bum catrapus.
Levanta-te, aristocrata.