quarta-feira, agosto 19, 2015

Quarta, 19.
Não sei o que se passou ontem na SIC para oferecer aos seus habituais expectadores aquele telejornal de horrores. Parecia a TVI que é uma espécie de Correio da Manhã em versão televisiva. Balsemão devia ter mão naquela gente. De contrário, qualquer dia, tem a foleirada da TVI e do Correio da Manhã à porta a reivindicar direitos.

         - Perguntam-me se eu não acho que a foto do modelo masculino é arte. Não sei. Pode ser. Sobretudo porque ela imediatamente me remeteu para Paris, Museu de Orsay, onde admirei pela primeira vez o excitante nu de Gustave Courbet. Então, digamos, que a fotografia é a versão masculina do artista francês – e fiquemo-nos por aqui... Mas também pode ser, ocorre-me agora, uma tela de Conceição Costa das que ela expôs na Galeria Monumental o ano passado.




         - Os acidentes com bicicletas sucedem-se causando mortes e feridos. Eu tenho pensado um tanto sobre o assunto enquanto sou confrontado na estrada com os ciclistas e toda a sorte de comportamentos da parte destes e dos automobilistas. E cheguei a uma conclusão: as estradas e o ritmo do trânsito hoje, não se coaduna com a existência daquele tipo de veículo em convívio simultâneo com os carros. Ou as cidades se reorganizam do ponto de vista da circulação, criando traçados e circuitos diferentes ou as bicicletas deviam ter espaços próprios para os seus adeptos. Um pouco como o que acontece com os circuitos de automóvel e karting. Insistir do ponto de vista do ambiente em pôr as pessoas a deslocar-se em cima de um objecto tão frágil, é correr o risco de transformar as estradas em verdadeiras pistas de morte. Se andar de bicicleta é um desporto, então que se siga os mesmos princípios do futebol, do basquete, da natação e por aí adiante, isto é, construam-se espaços destinados à sua prática.

Coisas que falharam nas minhas experiências campestres este ano. A secagem ao sol e à sombra das ameixas; a plantação por estaca das abóboras. O que resultou: a construção de caixotes para os morangos; as curgetes por estaca; umas quantas ervas aromáticas; a rega das hortênsias apenas de manhã cedo, a multiplicação dos nenúfares. Os prazeres que também os há: a apanha dos figos todas as manhãs, a contemplação das hortências finando-se com a dignidade de uma velha senhora, as maçãs mudando de cor, as uvas amadurecendo, o crescimento dos dióspiros, o silêncio cristalino ao romper do dia, a leveza do ar antes do sol chegar, a atmosfera renovadora quando desço para o pequeno-almoço, a presença do Black que me espera à entrada da cozinha, o tecido do orvalho em bolinhas translúcidas sobre o relvado, o ligeiro desfalecimento das folhas das laranjeiras, o reflexo do céu espelhado à tona da água da piscina, a aurora cantada pelo cuco, a casa que eu acordo com o meu passo cai-que-não-cai, o ciciar das osgas debaixo do telheiro, a harmonia que está queda por todo o lado, a surdina presença do mistério em sombras anunciando-se, o café tomado no lounge, o murmúrio de paz cobrindo a natureza de todas as esperanças...


         -Terminado o Sofista comecei deliciado o primeiro volume dos Textos Filosóficos de Marco Túlio Cícero. Notáveis as notas introdutórias de J. A. Segurado e Campos. Dá prazer ser português coetâneo de gente deste calibre. Não tenho palavras para definir a qualidade e profundidade e conhecimento que Segurado e Campos possui e partilha generosamente connosco. E pouco me importa se ele gosta ou vai ao futebol. Quando qualquer de nós apreende a realidade num todo, os pormenores são de nenhuma importância. A portugueses destes, eu curvo-me.