segunda-feira, fevereiro 29, 2016

Segunda, 29.

Eu como os meus leitores sabem sou um acérrimo lutador contra a União Europeia. Com o tempo fui-me tornando um revoltado, um intratável defensor da saída de Portugal do euro, um aliado dos países que são capacho para a meia dúzia dos prepotentes que fazem dos mais pequenos, pobres e periféricos o que querem. Para não falar da eterna questão entre Norte e  Sul que dentro da União é tratada com sobranceria, achando os países ricos e portanto do Norte que só eles são trabalhadores e os outros esbanjadores e ronceiros os do Sul. Nas sucessivas crises que a UE tem atravessado, talvez a actual seja a mais perigosa. No centro está a migração e no olho da tempestade a Grécia. Como o problema foi mal atacado desde o início, a Europa inteira fechou-se nos seus tacanhos medos, alheou-se dos tratados, reinventou políticas e aproveitou o momento para cada membro refazer a sua própria história e voltar às regras antigas onde a autoridade territorial suplanta a que Bruxelas impõe. Sempre tive a sensação que cada país o que quis foi organizar-se em torno da política económica indo tudo o resto de arrastão. Por isso, nunca a União conseguiu agregar interesses em torno das grandes questões e a fragilidade das conexões em vez de unirem acabaram por dividir. Aqui chegados, passando por cima de tantas normas já deslaçadas, chegou-se ao ponto de cada um fazer os acordos que muito bem entende à revelia das directrizes de Bruxelas. Assim, o chamado grupo de Visegrado – Hungria, Polónia, República Checa e Eslováquia – e o grupo dos países balcânicos reunido e torno da Áustria – Albânia, Macedónia, Montenegro, Bósnia-Herzegovina, Bulgária, Sérvia, Croácia – criaram uma muralha interior no seio da UE, deixando de fora a Grécia. Com este inacreditável plano a que os grandes e poderosos países da UE nada fizeram para obstar, a Grécia ficou só, abandonada à sua tragédia que é o drama de milhões de seres humanos largados à sua sorte. Tsipras tão odiado quando lhes fez frente, bate o pé e diz não querer ser o “armazém de almas”, mesmo que lhe dêem dinheiro a rodos. Abandonaram-no, não cumpriram o que com ele combinaram, depois de toda a humilhação que causaram a ele e ao povo grego. Alexis Tsipras faz o que pode, mas pode cada vez menos. Ameaçou que não “aprovará nenhum acordo no Concelho Europeu se o fardo da crise migratória não for repartido”. Justamente aquilo que nenhum outro membro do clube quer ouvir falar. Os milhões de seres humanos (dizem que a tragédia é já superior à da Segunda Guerra Mundial) que chegam às fronteiras ou aportam às praias gregas, só tem comovido os povos europeus e são eles que tudo têm feito para dissuadir os desumanos animais políticos que os governam dos seus egoísmos.

sábado, fevereiro 27, 2016

Sábado, 27.
A campanha do BE a favor da adopção por casais gay é infame. Não tanto pela mistura indecente à imagem de Jesus Cristo, mas porque transforma uma evidência em provocação inútil. Que todos os crentes possuem dois pais (o espiritual e o biológico), é um facto que só os transcende num destino de ligação eterna, numa simbiose de amor que nada tem a ver com a união heterossexual e muito menos homossexual. O aproveitamento de Cristo para uma tal “conquista” a mim ultrapassa-me. Não compreendo como podem os homossexuais querer adoptar a vida ronceira dos heterossexuais, quando têm tido uma liberdade que faz inveja aos casados, alheia aos comportamentos normativos que os prendem a obrigações e existências de uma banalidade de morte. Acresce que Jesus Cristo não escolheu o casamento como forma de vida.  

         - Outro dia, no Amoreiras, depois de largar o Filipe, cruzei-me com uma beauté que me atirou uma olhada provocadora. Segui caminho como uma donzela recatada que não liga ao primeiro que lhe sai ao caminho... Entrei numa loja, depois noutra e quando estava na terceira indeciso se devia ou não comprar a peça de mobiliário original que me cativou, ei-lo ao meu lado interessado também na mesma pequena estante. Aí, porém, o sorriso estatelou-se por assim dizer no seu rosto bonito, onde uma barba mal semeada traduzia a pouca idade. Murmurou não sei o quê tão baixo que não percebi. Como devia andar por um metro e oitenta, as palavras volatilizaram-se sem que eu abarcasse ao que vinha. O seu rosto porém, dizia-me qualquer coisa, parecia-me familiar, sem que eu descortinasse de onde. Vim a saber à noite já em casa, quando liguei a televisão e o vi na frente representando a personagem de uma dessas telenovelas que preenchem o serão dos portugueses. Suspirei: a ton âge, jeune homme!

         - O Inverno chegou enfim! Poucas noites acendi a lareira, mas há três dias que ela é uma presença sussurrante no salão. Como um ser a quem podemos abrir o coração, as flamas enchem as horas de um diálogo aconchegante e apaziguador. Se ela pudesse testemunhar tudo o que ouviu ou retribuiu, o pequeno mundo daqui floriria num clarão de secretas inquietações e florescências cativantes.

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sexta-feira, fevereiro 26, 2016

Sexta, 26.
Anteontem estive todo o dia em Lisboa. Ontem meti na cabeça que tinha de aproveitar a tarde soalheira para me atirar ao trabalho no jardim onde os acantos foram eclipsados pelas silvas e urtigas. Trabalho minucioso devido ao perigo de sair com as mãos picadas ou cortadas pelos picos que se escondiam no denso silvado. Como as minhas luvas já quase não possuem dedos, a tarefa revelou-se arriscada e demorada. Para não falar na dor de rins que trabalhos deste jaez provocam, ainda que desta idade não passarei nem da morte escaparei.  

         - Convidei o Filipe para almoçar. Levei-o ao Block House, no Amoreiras, onde se come muito bem, com atmosfera e calor humano impecáveis. O Filipe foi meu criativo durante uns anos e é um rapaz porreiro e original, para além de um profissional polivalente com ideias e métodos de trabalho que fogem à rotina criativa. É também alguém com quem se pode contar e que persegue pelo estudo e o número de maquetes a ideia que está subjacente à directiva do produto e do seu targuet para falar como os publicitários e os homens do marketing. Está mal aproveitado e infeliz na agência onde trabalha e faz pena ver um artista e um ser humano daquele tamanho perder-se na floresta dos oportunistas do ramo. Em equipa solta-se, só definha.

         - Passei no Corte Inglês para comprar o jantar. Pelos altifalantes soube que temos mais um escritor: Alexandre Patrício Gouveia que ali é gestor e dizem-me que também comentador não sei em que canal. Os editores não se podem queixar: nobéis não faltam. Talvez falte a Literatura, mas quem escreva encontra-se em paletes por todo o lado. Nem é preciso concorrer ao prémio Leya. Ao senhor Patrício Gouveia já só lhe faltava esse óscar que era ver o seu nome associado à imortalidade da escrita. Parabéns. Mas acautele-se: as meninas e os meninos tontos que se exibem nas televisões, passam-lhe a palma. Agora que o meu amigo soube diversificar os seus negócios, ninguém o nega. Parabéns, uma vez mais. Tenho a certeza que vai despromover Saramago, Vergílio Ferreira, Agustina, João Tordo, Lídia Jorge, Rosário Pedreira e tutti quanti, e com um pouco de talento, quem sabe, Pessoa e Camões. Hoje é tudo uma questão de sorte, dinheiro, influências, traficâncias – e isso o meu amigo possuiu para dar e vender. Olhe, sabe que mais, como sou seu amigo, aconselho-o a seguir a estratégia de José Sócrates que nessa como em muitas outras matérias é mestre: compre a edição toda e ofereça-a aos seus milhares de admiradores - fica com a consagração no papo e não tarda será estudado nas universidades portuguesas como o empresário de grande sucesso. Assim sem mais.   


         - Andava eu a magicar (há dias que não tínhamos notícia de um novo caso) já com uma ponta de felicidade na dobra dos dias que, finalmente, do país haviam sidos erradicados todos os políticos corruptos e que o pobre juiz Carlos Alexandre podia agora dormir uma noite inteira sem os vampiros a rondar-lhe o descanso, quando se apresenta outro ilustre togado, no caso procurador da República, de nome Orlando Figueira, indiciado de vários crimes, iguais em matéria e ganância aos demais, quero dizer, corrupção passiva agravada, branqueamento de capitais e falsidade informática, mas com um pormenor que não é de somenos importância – ligações criminosas ao vice-presidente de Angola. Seguiu direito para Évora, não sei se para a cela 44, onde o esperam outros dirigentes do mesmo prestígio e amor a Portugal e à causa democrática. É tempo de erguerem uma estátua à porta do estabelecimento prisional ao insigne magistrado Carlos Alexandre.

terça-feira, fevereiro 23, 2016

Terça, 23.
Estranho, estranhíssimo sonho ao raiar da manhã. Talvez devido às preocupações com o meu romance, foi a Maria Barroso que decido pedir que intercedesse junto de algum editor. Ela pede-me um tempo para ler O Rés-do-Chão de Madame Juju. Dois dias depois telefona-me a dizer que o meu trabalho a entusiasmou a um ponto tal que já falou com dois editores recomendando-lhes a obra. Acordo, risonho e cheio de confiança no futuro. As primeiras orações da manhã, foram por ela em jeito de agradecimento.


         - O Orçamento como se esperava passou com os votos de PCP e do BE. Eu até compreendo a opção do ministro das Finanças e em certo sentido gostaria que as coisas corressem bem para provar aos tecnocratas de Bruxelas que há mais mundos para além dos manuais traçados numa folha Excel. Mas tenho dúvidas. Acho que o dinheiro não é elástico e dentro em breve estamos todos metidos numa grande alhada. A despesa pública não desce, os funcionários reclamam isto e aquilo, todo o mundo pensa que estamos ricos, esquecendo-se que ricaços só José Sócrates e a equipa de políticos que escolheu governar governando-se. Depois, não me esqueço do que me dizia e empresariado que conheci de muito perto. Segundo eles quando ganhavam dinheiro à tripa-forra era com o PS no Governo. Acresce que o PCP e o BE (este mais acomodatício), não se vão manter de braços cruzados quando o PS cair na real e começar a pôr em prática o manual de Passos Coelho ou da troika ou de Bruxelas.

segunda-feira, fevereiro 22, 2016

Segunda, 22.
Li com interesse a entrevista que o veterano da psiquiatria deu ao Público de ontem. Não corroboro com tudo o que diz o médico António Coimbra de Matos, mas no que diz respeito à caracterização do português quase assino de cruz. Vejamos algumas passagens.

Quando as pessoas não se revoltam, é que se suicidam; quando se sujeitam, quando não têm condições para protestar com mais veemência.

Somos um bocado passivos. Os espanhóis são mais agressivos, revoltam-se muito mais.

(Somos) mais delicados, mais medrosos. Somos um país de medrosos.

Nos casais homossexuais, há mais frequência de conflitos, de separações. São menos estáveis, de uma maneira geral.

Há uma maior quantidade de traços de psicose, narcisismo, borderline. Porque há uma menor intimidade entre as pessoas. As relações são mais superficiais, menos íntimas, menos vinculadas, mais anónimas. De maneira que não há familiaridade. Deixou de haver confiança, a colaboração mútua.


         - O irmão do ex-presidente dos Estados Unidos que teve a veleidade de se candidatar à presidência, meteu o rabo entre as pernas e zarpou. Ninguém acreditou no pequeno homem. Esperemos que se lhe siga o palhaço Donald Trump. Do lado democrático, o único que é original para a América e digno de ocupar o cargo é Bernie Sanders. Quanto à senhorita Hillary Clinton já demos para aquele peditório. Seja como for são duas boas notícias, esta neste mês e para o próximo a corrida de Cavaco Silva de patins para o Algarve, vivenda Mariani, perdão, Gaivota Azul. Ufa! Ufa!