terça-feira, maio 30, 2017

Terça, 30.
O BES de má memória e o Novo Banco de memória tóxica, foi a fotografia a preto e branco do Portugal dos pequeninos. Neste reino dos pequeninos, incluo os políticos, os gestores públicos e privados e toda essa granja de gente que vegetou e vegeta debaixo da sua capa rodada florescente de ouro e pedras preciosas. Acontece que tive conta na caverna de Ricardo Salgado desde muito novo, na Praça do Brasil, ao Rato. Este mês recebi uma carta daquela dependência, solicitando-me “a retirada dos valores guardados no cofre” que aluguei quando o Chiado foi incendiado. Na altura, morando ao fundo da Rua de S. Marçal - apesar de ter o santo do século III por protector -, temi por uma série de cadernos manuscritos e fui à pressa protegê-los no banco. Bom. A casa forte, situa-se na cave do edifício e para lá entrar temos de descer umas escadas, passar por divisões estreitas que a funcionária vai abrindo e fechando, até chegarmos ao coração da segurança e aí ficarmos encerrados até voltarmos a chamar pela guardiã que nos aprisionou. “Por favor, liberte-me da cela 63 (número do cacifro)!” A funcionária veio com um largo sorriso no rosto bonito e eu mostrei-lhe os valores que durante tantos anos pus em segurança e ela: “Pois, são as suas joias!”

         - “As joias” carreguei-as a tarde inteira. São 12 cadernos de capa negra plenos da minha escrita na época escorreita e contam o percurso de muitas vidas que se cruzaram com a minha. A mochila onde as enfiei, ia rebentado e com ela as minhas costas. Passei depois no Corte Inglês para comprar o jantar e mais qualquer coisa. Enquanto por lá deambulei, atenuei o peso entregando a mochila à guarda da loja. A rapariga, quando pegou nela, exclamou: “O senhor traz aqui uma bomba ou quê!” Abri o saco e disse-lhe: “Está a ver! Isto na realidade não parece, mas é uma bomba ao retardador!”

         - Curioso ou nem por isso. A nosso vendedor de afectos transformou-se no papagaio da senhora Merkel, mas vendendo a imagem de legítimo senhor da nova orientação europeia. Não sei se ele se apercebe que a nova organização geoestratégica do mundo, precede o período próximo de um conflito terrível. Alguém devia perguntar ao nosso irrequieto presidente, se Portugal é uma realidade ou uma fantasia.

         - Há dias, para obedecer a um compromisso que tinha em Lisboa, tomei o comboio das sete da manhã. A gare do Pinhal Novo, tendo sido pensada para grandes voos, é vasta e com ares de avenida. O espectáculo das muitas gentes que a travessavam àquela hora – miúdos a caminho da escola, funcionários públicos, povo dos serviços, turistas, anciãos rechonchudos viajando não sei para onde - era surpreendente e deixou-me por algum tempo fundeado no sonho de todas aquelas vidas simples, decerto difíceis, talvez poéticas, quem sabe. O mais surpreendente porém, foi a tele-dependência daquele mundo moderno, todas e todos montados no telemóvel, um corrupio de sms dedilhados com furor, uma lengalenga inútil, constante, as palavras embrulhadas no sono murado no cérebro como aranha manipuladora dos afectos, palpitando aquela corrida como a derradeira e numa despedida plangente deixar do outro lado registada a voz que o mausoléu não pode guardar.  


         - Abri a época piscineira.  

segunda-feira, maio 29, 2017

Segunda, 29.

A senhora Merkel, resumindo as duas cimeiras em que participou – NATO e G7 – preveniu: “Nós europeus, temos de agarrar as rédeas do nosso próprio destino.” Implícito está a introdução de uma nova forma de ver o mundo arrastada por Donald Trump e pela saída do Reino Unido da União Europeia. Por outras palavras, o velho continente, madraço, corrupto, povoado por um batalhão de políticos que partilham as benesses e a vida-airada, mais uma vez, quer meter medo aos povos dizendo-lhes que quem não está com ele está contra ele e, portanto, sem Europa unida em torno do euro, bem entendido, será a desgraça. Alguns apostam no pobre Chou Chou para a dinamizar, outros espreitam a oportunidade para introduzir novas e mais apertadas formas de viver, onde os países pobres sustentam os países ricos. Ninguém pára para pensar e ver que a Europa desde a sua fundação económico-financeira, nunca conheceu a paz, nem teve o reconhecimento dos povos em eleições livres. Tem sido sempre a instabilidade, os impostos a subir, a autonomia a desaparecer, a prepotência a reinar, a pobreza a alastrar. A política hoje é espectáculo, aldrabice, idiotice, hipocrisia e incompetência. Os povos ajudam à festa, a desgraça tapa-se com uma partida de futebol, uma ida a Fátima, um fado triste dedilhado num beco umbroso de um qualquer lugar imobilizado na nossa charlataneada existência.

domingo, maio 28, 2017

Domingo, 28.
Há um acontecimento que merece ser realçado porque reorienta os costumes e a moral no sentido progressista da vida: a aceitação do outro nas escolhas que o coração impõe, o corpo aceita e os impulsos juvenis glorificam. Foi o que aconteceu na Escola Secundária de Vagos, Aveiro. Duas raparigas foram vistas a beijarem-se com volúpia, prontamente ostracizadas pela direcção da escola. A surpresa, porém, chegou dos colegas de ambos os sexos que se interpuseram com uma gigantesca manifestação contra a homofobia. Um aluno chegou mesmo a dizer à imprensa “ter sido a única vez que a escola esteve toda unida”, outra aluna reclamou os mesmos direitos para as colegas como para qualquer outro casal. Enfim, a juventude no seu melhor e capaz de deixar a ilha das imundices hipócritas para alcançar o deserto da solidariedade, da compreensão e da aceitação do outro.  


         - O comendador Cristiano Ronaldo, anda a contas com o fisco espanhol que o investiga por fraude fiscal. Aliás, esta parece ser a história dos nossos comendadores. Muitos dos agraciados com a comenda, honraram o país com a ganância própria dos simplórios. No caso, ao que diz o El País, o Estado espanhol pensa que a fraude atinge os 15 milhões! É típico dos que nunca tiveram nada. Apanhando-se com qualquer coisa, tudo é pouco e é vê-los gritar: "SIMMMMMM quero mais, muito mais! Milhões! Triliões! Cagalhões!"

sábado, maio 27, 2017

Sábado, 27.
Os assassinos do jovem David Duarte que morreu no hospital de S. José de aneurisma  por falta de cuidados médicos em Dezembro passado (os foliões clínicos optaram pelo fim-de-semana como qualquer funcionário público irresponsável), foram ilibados de responsabilidade e consequente prisão por acto criminoso. O Ministério Público arquivou o processo, servindo-se do charabiá jurídico incompreensível e pouco abonatório para a justiça, considerando que “resultou de acto ou demissão no desempenho de cargo ou função e não de acto ilícito, culposo e punível”, selando deste modo uma decisão selectiva que compromete não só a democracia como e Estado de Direito. Depois não se queixem do que dizem os portugueses sobre tudo isto a que chamam vulgarmente República.

         - Eu bem fujo do Príncipe, mas acabo lá a almoçar. É que aquele grupo é tão interessante, estou tão em sintonia com ele, que resvalo e caio desmaiado na cadeira com apoplexia de riso, discussão, anedotário, falatório sobre arte e artistas numa barafunda umas vezes avinagrada, outras saborosa. Entre nós há o excelente sentido de humor e critica. O mesmo se passa com o João. Falámo-nos já eu estava na Brasileira e ele recusou vir ao nosso encontro. Antes de deixarmos o restaurante, avisa-me que sempre virá. Estando todos passados – eu menos que os demais -, mas com suficiente discernimento para seguirmos, como habitualmente, o Guilherme para o seu atelier em frente onde João Corregedor nos espera. Lá em cima, a altercação dura até às sete e tal da tarde: política, religião, figuras e figurões num cruzamento de ideias absolutamente dissemelhante, mas onde, à parte a bebedeira do Carlos que se tornou insuportável e um pouco a do Alexandre entaramelada, todos os outros puderam, com vigor e tom, exercer o prazer do debate, incluindo um ex-padre também presente. Enquanto isso, o Guilherme com entradas por saídas na tertúlia, pinta. Como é possível que alguém possa trabalhar naquela algazarra! A dada altura o João, no seguimento do meu elogio ao Papa Ratzinger, chama à coadura a “Teoria da Libertação” que, segundo ele, o Papa Emérito proíbe. Contra-argumento que não é bem assim, uma vez que o movimento introduziu no ministério sagrado da evangelização, a política. Recordo-lhe a expressão de Marx segundo a qual se queres destruir a religião, impinja nela a política. João desconhecia este princípio marxista e a conversa ficou por ali ante o júbilo do Carlos, aos berros, no combate do nosso deputado e amigo.


         - Mais um acto criminoso contra a igreja Copta levado a cabo provavelmente pelo Daesh. A operação ocorreu contra o autocarro que transportava os fiéis para o mosteiro de S. Samuel, no sul do Cairo. Nela morreram 28 pessoas entre crianças e adultos. Os coptas são uma das comunidades cristãs mais importantes do país, com 12 por cento de egípcios.

sexta-feira, maio 26, 2017

 Sexta, 26.
Um inquérito sobre religião ontem no jornal das oito na SIC, revelou números bizarros levando os autores do “estudo” a afirmar que Portugal é hoje um país de costas voltadas a Deus. Mas depois ouvi uma das autoras do trabalho falar de ideologia quando se referia a religião e fé... Tudo muito ligeiro, muito televisivo, muito ao gosto do espectáculo típico das redes televisivas. Enfim! Que Deus lhes perdoe, pobres ignorantes!