Terça, 31.
Portugal faz pena. Transformámo-nos num
povo apático, sem energia anímica, entregue à turba de mangas-de-alpaca que nos
dão ordens directamente do edifício mastodôntico, espécie de aquário de onde os
peixes graúdos nos agridem, humilham, submetem, escarnecem, manipulam, roubam,
empobrecem e fazem dez milhões de um povo nobre que outrora deu cartas à Europa
e ao mundo, escravos a ganhar para os seus luxos, o seu trem-de-vida, a sua
avidez, a sua orgulho. É triste ver o Presidente da República andar de gabinete
em gabinete, a esmolar por caridade à senhora Merkel que não nos afogue na
miséria, nos poupe à pena de morte económica, ao castigo de mais austeridade
que só nos afundou e nos deixou por duas gerações a pagar com língua de fora os
juros do que nos emprestaram. Hoje, dá-me para pensar que talvez a nossa gente
tenha razão em se refugiar no futebol, na Senhora de Fátima, e na baixeza dos
programas televisivos: telenovelas em cadeia, concursos onde se ganha alguns
patacos, royalty shows, sessões de culinária, espectáculos festivaleiros de uma
mediocridade insuportável... Perdida a liberdade e a independência nacionais, somos
o que quiserem fazer de nós – miseráveis felizes ao sol por enquanto gratuito,
tocados pela letargia e o vazio.
- Diz o Índice Global da Escravatura que em Portugal existem 12.800 escravos.
Enganaram-se ou não observaram com atenção. Para mim deve rondar os 90 por
cento, mas por conveniência de ordem vária, não contaram com a miséria, a indigência,
a triste vida da maioria da população com salários de sobrevivência e às ordens
do fisco para quem destilam de sol a sol de língua de fora. Pura e simplesmente
não lhes convém.
- Séneca:
Quand nous sommes accablés d´infirmités,
insupportables à nous-mêmes et aux autres, c´est un signe que les dieux nous
font pour nous inviter à les rejoindre.