segunda-feira, maio 09, 2016

Segunda, 9.
Nós, no século XXI, queixamo-nos do mundo, do nosso país, da nossa cidade, da nossa rua e fazemos muito bem. É sinal que mantemos o espírito vigilante e não caímos na sonolência que atinge a grande maioria das pessoas e, sobretudo, não deixamos descansados a miudagem intelectual que nos governa. Mas, se formos atentos, se gostarmos do conhecimento, podemos aprender como chegámos até aqui e qual a parte dos nossos predecessores no resultado humano e social em que hoje vivemos, sendo certo que sem eles não tínhamos o legado de que usufruímos. Talvez muitos de nós sejamos inclinados a afirmar que não vale a pena o esforço de alerta permanente porque sempre assim foi, os ricos cada vez mais ricos, os pobres cada vez mais pobres, o poder alheado dos cidadãos, habitando o toutiço do império num conluio e satisfação como a máfia napolitana ou as confrarias disto e daquilo. Todavia, se somos dados à leitura, aprendemos que o nosso esforço solidário pela verdade, não começou em nós, nesta altura, neste enquadramento histórico, mas vem sendo exercido pelos nossos antepassados, à vezes pelos mesmíssimos motivos, utilizando o pensamento e a raiva na mesma proporção e no mesmo espírito de justiça. Dois exemplos.

Johann Wolfgang Goethe, em Setembro de 1786, parte de Weimar para uma longa viagem por Itália e só regressa a casa no ano seguinte. Em 29 de Dezembro de 1787, estando em Nápoles, regista esta passagem no seu Diário: Passa-se aqui o que se passa em toda a parte, e aquilo que poderia acontecer comigo ou por minha intervenção deixa-me entediado antes mesmo de acontecer. Temos de nos decidir por uma capelinha e participar nas suas paixões e intrigas, elogiar artistas e diletantes, minimizar a concorrência, aceitar tudo o que vem dos grandes e ricos. E havia eu de rezar também aqui esta litania colectiva que me faz ter vontade de fugir deste mundo?   

Dois séculos depois, em 1938, Ernst Junger está em viagem a Rodes e anota no seu Diário: L´énorme avidité de notre époque pour les tombeaux et les ruines inconnus. Elle constitue, dans  le domaine métaphysique, la contrepartie de la passion économique pour les gisements de pétrole et de charbon.

Dois registos diferentes, uma mesma consciência de factos que continuam hoje a interpelar-nos, numa sociedade onde parece faltar o rumo e o lugar de cada um de nós, mas onde, contudo, somos impelidos a abrir caminho ao futuro mais equilibrado e digno das gerações que nos sucederão.  

         - Guilherme Parente não pára. Esta manhã na Brasileira, rubriquei a minha presença com vernissage para sábado, de mais uma exposição com este título curioso: “De um lugar onde não há sapos”, em homenagem a Geronimus Bosh.


         - Para me encontrar com os meus divertidos amigos, estando os senhores trabalhadores do Metro em assembleia, e talvez por isso as escadas rolantes paradas ou avariadas, tive que escalar desde o fosso da estação do Chiado até ao café a penates, degrau a degrau. Quando cheguei à rua, não sabia se coxeava para a esquerda, para a direita, para trás ou para a frente, porque todo eu balançava desnorteado. Também para o caso pouco importa, posto que coxeei como deve ser, não é verdade. Bom. Sobre isto, há a acrescentar que fui corrido a chuva dançante desde que deixei Palmela até aos braços dos meus artistas. Pelo Chiado andava tudo doido, turistas e lisboetas ou provincianos aportados à capital. De nada servia o guarda-chuva, pouca utilidade tinham os chapéus e bonés. Mesmo assim, alguns franceses haviam estacionado a sua sensaboria turística nas esplanadas tocadas a ventania. Nisto como no resto há para todos os gostos. Ficamos conversados por hoje.