sexta-feira, julho 31, 2020

Sexta, 31.
A história divulgada no Público pelo jornalista Paulo Pena (chapeau, excelente) sobre a venda pelo Novo Banco de 13 mil imóveis ao preço da chuva, a um fundo nas Ilhas Caimão, sem que as instituições – Banco de Portugal, Regulador, Governo e deputados – autorizassem ou conhecessem o negócio, é mais um daqueles enigmas que querem que embuchemos! É evidente que a operação é legal, embora seja imoral tendo em conta o que nós já pusemos dos nossos impostos na instituição bancária. Todos sabem isso, mas para se armarem em sérios e conquistarem votos, dramatizam, fingem desconhecer, inventam cabalas, quando a operação foi comunicada e aceite pela CMVM. Que mundo este! Que política esta!

         - A desgraça bate-nos à porta. Os números não mentem nem ajudam a enfeitar a “confiança” dos governantes. Em Portugal, no segundo trimestre deste ano, o PIB derrapou 14%. Mas não estamos sós. Os EUA andarão por -33%, a França 16,8%, a Espanha 16,9%, a Itália 15,8% e passo. Há muitos portugueses a passar fome, os gastos com o coronavírus descarrilaram e sabe-se lá quanta corrupção não houve à conta da aflição de António Costa para travar a pandemia. É da ambição dos homens: numa guerra há sempre uns quantos que fazem fortuna.

         - Andava danado com o facto de não conseguir pôr o corta-relva a funcionar, mais a mais depois do arranjo e afinação que paguei. Até que esta manhã recebi a visita do Raul. Logo o levei para junto da máquina e pedi-lhe explicações. Ele, à primeira, fez ouvir o motor e de seguida uma fumarada saiu do impulsor. “Isto tem óleo? Acho que sim.” Raul espreita a certificar-se e conclui que na vinheta está no fundo. Toca de enfiar pela goela abaixo do truc o líquido. De novo posta em marcha, a fulana desfalece e cala-se. “Isto tem gasolina 95? Suponho que sim.” Desenrosca a tampa do depósito e exclama: “Mas isto não tem uma gota! Como assim!”, disparo eu, boquiaberto. Embebeda-se a sujeita e com ela bem inchada, Raul puxa a corda e a máquina voa das suas mãos para de uma assentada cortar metade do espaço junto à piscina. “Agora quero eu experimentar!” Milagre, milagre, o corta-relva desliza ao fim de meses de birras e num instante terminei a outra parte do relvado. Como é isto possível, Santo Deus! Dá para perceber? Não dá. Aselha, débil mental, despassarado, e não te alcunho de nomes piores porque estou a falar de ti, meu grande burro... Como é possível que vivas isolado, num espaço maravilhoso é certo, sem criadagem nem recursos, e consigas dizer que és feliz? Mistério.

         - Este diário não é só reflexo do seu autor, é também a radiografia de um tempo, de um povo, de um mundo. Derramadas nos seus milhares de páginas, estão as alegrias e tristezas dos homens que fizeram as memórias dos acontecimentos, as narrativas singulares da palpitação dos dias, com toda a carga vivencial que a loucura humana carrega.


         - Custa-me anotar nesta altura desumana, quando tanta gente sofre ou passa necessidades, mas em nome da verdade e pensando nela, daria de muito bom grado um pouco do dia feliz que me coube hoje desfrutar.   

quarta-feira, julho 29, 2020

Quarta, 29.
O João há oito dias telefonou-me a pedir um texto que protegesse os pintores e escultores junto da Sociedade Nacional de Belas Artes que, como outros artistas, passam por um momento difícil. Disse-lhe que essa não é a sua nem a minha missão, sobretudo tendo em vista uma classe que nunca se uniu na defesa dos seus interesses nem fazendo nós parte dela. Contei o projecto ao Guilherme, ontem. Mas ele está de acordo com o Corregedor e diz que eu devo pensar no assunto desde que seja pago. Indignei-me. E expliquei que aos amigos não se cobram gestos como este. Ele tornava à baila com o preço. Desisti.

         - Há uma semana recebi alguns telefonemas a dizer que me viram no jornal da SIC. O Carmo foi ao ponto de afirmar que me deram um plano que me destacava do conjunto dos amigos com quem estava a conversar. Detesto. Não dei por isso. De contrário, fazia como já fiz à RTP1, TVI e SIC que vieram para me entrevistar – corria com eles. Que direito tem esta gente de expor quem se reserva? Sobretudo quando não foram autorizados nem preveniram os visados! Há por aí quem daria a vida por uma imagem sua na TV, forma de afirmarem que são alguém e estão vivos. 

         - Reservei a manhã para encarar as chatices. Muni-me, pois, de imensa paciência sabendo em que país vivo. Assim, estive desde as 9 ao meio-dia a tentar ser ressarcido da soma que gastei na compra da viagem TAP Lisboa/Budapeste/Lisboa. Falei com sete pessoas, outros tantos departamentos, repeti ao que vinha vezes sem conta, anotei, entrei e saí do site da companhia, por fim, ufa!, ao cabo de três horas consegui enviar o protesto de reembolso apenas para satisfazer o João Corregedor que todos os dias insiste comigo para que o faça. Está feito! Amanhã vou mandar cópia à Provedora da Justiça e à Deco. Se tenho esperança em receber um tosto? Nenhuma. Mas já agora que estou embalado, ainda tentarei a sorte com a UE sobretudo para reaver as centenas de euros que o Hotel Atrium Fashion (que não aconselho a nenhum leitor) me surripiou. 

         - As minhas histórias africanas no Fertagus. Ontem, distante de mim, seguiam duas negras: uma ao telemóvel, falando para todos os passageiros, sem máscara, espécie de Isabel dos Santos no cabelo, no pote barrigão, nos gestos de rainha de Luanda; a outra mais cordata, de máscara, rindo, discreta. O vazio do que dizia foi, a dada altura, travado por uma senhora que seguia perto e a intimou para que pusesse máscara. A dama fraldiqueira à moda sanzala, não ligou nenhuma e prosseguiu no seu falar indígena. Foi quando me levantei e fui direito a ela e disse: “A senhora é obrigada a pôr máscara nos transportes públicos e se não o fizer imediatamente, na próxima estação, chamo o segurança e acrescentei: olhe que a multa é de 135 euros.” A mulher pareceu esgrouviada e diz para a amiga: “Ouviste: cem euros de multa!” A outra não respondeu. Então a Isabelinha dos Santos, sacou da mala a máscara. “Está a ver assim fica bonita.”

         Na mesma carruagem, assim que entrei, vi que o espaço reservado às pessoas com incapacidades estava ocupado por uma mulher africana cujas nádegas enchiam um banco e meio. A mulher logo que me viu, levantou-se e tratou de carregar a mala grande, outra mais pequena e um saco para me dar o lugar. Disse-lhe: “Deixe-se estar e obrigado. Eu vou procurar assento mais adiante.”  Despedimo-nos com um sorriso de orelha a orelha. Há negras e negras; como há brancos e brancos, amarelos e amarelos.


         - Tentei pôr o corta-relva a trabalhar – em vão. Definitivamente eu e as máquinas não nos tratamos por tu. Tempo quente. Meia hora de natação. O romance ruminou todo o tempo, mas o tempo não parou para ele se estatelar nas páginas do computador.

terça-feira, julho 28, 2020

Terça, 28.
É a praga estival, a altura em que Portugal inunda com catastróficas imagens as televisões internacionais – os incêndios. Idanha-a-Nova está em brasa, como já estiveram outros milhares de hectares de serra. Um ou outro bombeiro morreu em acidente de trabalho, a maioria parece ter sido fogo posto – o habitual.

         - As mulheres de Zuckerberg quando acordei pelas sete da manhã e abri a janela do quarto, já estavam debruçadas sobre a vinha, no tric-tric facebookiano. Nunca ouve um minuto de silêncio até ao meio-dia, altura em que abalaram atarantadas de calor. Nem elas se calaram um segundo, nem o capataz que falava pelos cotovelos. Estas cegarregas tecem com seu canto as invejas que correm à desgarrada nas ditas redes sociais.  

         - Quando cheguei ao cimo da estação Metro-Chiado, passada a portinhola, antes de subir as intermináveis escalas rolantes, deparo com um rabinho bem feito assomando dos calções leves, que não pude identificar a quem pertencia, estando a personagem de costas a tomar café ao balcão do stand que ali existe. Parei, hipnotizado e a pensar no amor entre sebes, campos de milho, dunas e todos esses sítios solitários que o vento varre de epopeias em consagração das delícias que o corpo em tempo de pandemia sem olvidar aparta. Depois, para sossegar os sentidos em rebuliço, disse: “Que interessa a tentação se não podemos pecar.”  


         - Que bem se esteve hoje na esplanada da Brasileira! Apareceu o Guilherme entre outros com quem estive à conversa até tarde. Ele convidou-me para ir almoçar ao Aqui Há Peixe, perto do Teatro da Trindade. Recusei porque é caro e sempre que lá vou esbarro com ex-ministros e aquelas adendas dos secretários de Estado. É uma clientela barrenta, oleosa de importância, que ele corteja porque vende mais facilmente a sua pintura. Percebo e até aceito, mas não me unto daquela relevância.

domingo, julho 26, 2020

Domingo, 26.

Embora eu seja critico em relação a Rui Rio, não posso deixar de me curvar ante certas atitudes do líder do PSD que me vão directas ao coração. É o caso destas certeiras e lógicas afirmações: “Percebe-se agora o apoio de 15 milhões de euros do Governo a este sector (referia-se aos media em antecipação de publicidade como forma de compensar o sector da crise provocada pela Covid-19), realmente as despesas são muitas e a crise é grande. Aguardemos agora notícias sobre o apoio público socialista à dispendiosa contratação do novo treinador do Benfica.” Esta observação, precede uma outra a propósito dos 15 milhões de euros de impostos “irem ajudar a pagar os programas da manhã e o Big Brother”. Não posso estar mais de acordo e assino de cruz. Talvez a contar com os 3,342 milhões que cabem à TVI, esta anunciou que vai contratar uma tal Cristina Ferreira por um ordenado anual de 3 milhões de euros!! A fúria da empresa é tal, que parece que na fila dos futuros empregados, está aquele que me pisca o olho sem dizer claramente ao vem, se gosta de abafar a costeleta ou se aquela piscadela não passa de uma originalidade à portuguesa ou se ele aprendeu com uma das suas personagens (o homem é escritor) a arte de engatar de longe... Que miséria de país! Isto nem país é antes uma reles cage aux folles.

sábado, julho 25, 2020

Sábado, 25.
O relatório do Tribunal de Contas que trata da análise aos gastos com a Covid-19, é surpreendente sob vários aspectos. Nem vou referir-me à disparidade de preços nos contratos por ajuste directo para máscaras e viseiras onde, por exemplo, a Câmara de Oeiras gastou qualquer coisa como 9,8 milhões, Lisboa 4,4 milhões, Oeiras 3,2 milhões. Quero espantar-me com a capacidade financeiras destes municípios, que gastaram mais que o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge e outros organismos a nível nacional. O espantoso para mim, é a riqueza em dinheiro líquido das câmaras por esse país fora. Antigamente ninguém queria ser um simples presidente de junta, de câmara e assim. Hoje eles batem-se com unhas e dentes por alcançar essa mina de oiro que manobra milhões por ano. De onde vem tanta riqueza? Dos impostos, bem entendido. Os cidadãos pagam cada vez mais impostos, sobretudo o Imi que foi a nascente preciosa que faz mover todas as ambições. Não há capanga nenhum que não ambicione aquelas cadeiras. E quando toca a haver mão livre como no caso da aflição da Covid, é vê-los meter ao bolso somas astronómicas. Há máscaras cirúrgicas compradas a 2,5 euros cada! Uma amiga que mora em Cascais a quem eu contei este facto, diz-me que uma coisa é a propaganda outra a realidade.

         - Ontem, em discussão com o João, falou-se do ditador Putin e do seu regime comunista. O meu amigo empolgava-se com os 80 por cento de votos que deram à criatura poder até 2036; eu contrapus que os mesmos 80% outorgaram ao Estado Novo o domínio ditatorial por quarenta anos. Mas Putin foi mais além na dança de cadeiras entre ele e Dmitri Medvedev. Farto de dançar, fez uma lei para si próprio. Os regimes democráticos da Europa, deviam abster-se de fazer negócios com países onde impera o terror de um só homem.

         - Vá-se lá compreender os autarcas e os governos. O bebé Nestlé quer vedar o centro de Lisboa aos automobilistas e reduzir os carros que entram todos os dias aos milhares na cidade. Os socialistas, social-democratas, comunistas, esquerdistas e até a direita, alinhando com o popularucho que não percebe nada de nada, pregam a favor do Planeta, do CO2, do buraco do ozono e de não sei mais o quê, proíbem tudo e mais alguma coisa, infernizam a vida dos cidadãos, eles que eu nunca vejo nos transportes públicos. Mas logo se abrem em competências, em júbilo, em vaidades pacóvias quando conseguem atrair, neste caso para o Algarve, o campeonato de fórmula 1. Então esquecessem-se dos compromissos com o clima, os decibéis, a saturação da atmosfera, o perigo para as pessoas, os oceanos, as florestas, as cidades, o campo. Falam mais alto os negócios, o gás carbónico não existe. Acham que é de levar a sério esta pandemia populista que nos governa?  

         - Ontem tive um serão mais longo que o habitual. No ARTE passava a vida palpitante do duo Simon and Garfunkel. Dizia-se quando o LP saiu, em 1970, que os dois eram namorados e só o seu amor pôde produzir o magistral Bridge Over Troubled Water. Seja. Nas tintas. O facto é que o disco e a sua música sem mácula, atravessaram o tempo e ainda hoje se ouve com emoção. Numa altura em que a maior parte da música que se produz é lixo, e os músicos para se afirmarem têm de se mascarar, tatuar, exibir violência e atestados de menoridade, eles apresentaram-se simples, sem nenhum apetrecho pessoal salvo a riqueza do seu trabalho. Em palco, Paul Simon, vai ao ponto de cantar de braços cruzados, com uma simplicidade e naturalidade contagiantes, deixando que a música entre nos corações dos milhões de espectadores daquela maneira sublime. Quanto do que era desceu da memória para unidos me transportar de novo aos anos turbulentos que foram os meus! Pudesse eu esquecer tudo e começar a vida do ponto onde a perdi para a pessoa que sou hoje!

         - Um vento fresco varre o espaço consentindo um dia mais ameno. Vou experimentar nadar depois do acidente. Se conseguir fazer sem problemas meia hora de natação, considero o assunto encerrado. Sinto-me desde ontem mais confiante. Esta manhã adiantei até uma página no Matricida.