sábado, julho 11, 2020

Sábado, 11.
Discutia-se a política de António Costa sendo eu muito crítico. Às tantas, sem argumentos que contrapusessem os meus juízos, diziam que ele é muito simpático. Respondi que não era isso que estava em causa, não é com simpatia que se governa, mas com acção e eficácia. Porque um político – sobretudo estes da nova geração – são acima de tudo 15% de autenticidade; 55% de mentira e 30% de hipocrisia. Não governam para o povo, mas para o partido, isto é, os seus interesses.

         - Sempre tive dificuldade em entender que a democracia ponha nas mãos de um só homem plenos poderes como no caso das democracias presidenciais, ou até do primeiro-ministro. Quando o sistema é parlamentar, vá-que-não-vá; mas se ele é presidencial como se sai quando na presidência está uma abécula? Deixo de lado os EUA e concentro-me no Brasil. Bolsonaro, em período de expansão da Covid-19, acaba de vetar uma lei do Congresso em favor dos chamados indígenas. Nesse documento ficou lavrado que o Governo Federal devia fornecer água potável, camas hospitalares, higiene e tudo o que obstasse a propagação da pandemia. Sendo um povo vulnerável, devia merecer maior atenção da parte do Estado. O pateta presidente (com minúscula), argumentou que o projecto legislativo ia contra o “interesse público por criar despesa obrigatória sem demonstrar o seu impacto orçamentário e financeiro”. É revoltante! Sobretudo quando a taxa de mortalidade por coronavírus no povo abandonado é de 9,6, quando no Brasil todo é de 5,6%. Sem falar nos últimos e alarmantes números: 70 mil mortos; 1 milhão e 800 mil infectados.

         - Sempre que encontro um volume da vasta obra de Aquilino Ribeiro, compro-o. Sobretudo se for daqueles do seu tempo, com o sinete do autor, forma de não ser roubado pelo editor... Pasmo, rebolo-me de prazer a lê-lo! Dizia-se no seu tempo que nenhum romance do criador de O Malhadinhas, devia ser lido sem o dicionário ao lado. E hoje? Os candidatos a escritores, e mesmo os que em bicos de pés aspiram ao Nobel, serão eles capazes de perceber este naco de prosa? “Pela estrada, passavam romeiros de outras terras, misto de pé e de cavalo, raparigas de xaile dobrado à cabeça, e empoleiradas por cima do xaile as soquinhas, homens de lódão na mão e registo no chapéu, os ricos e pacatos de escancha-perna, no seu asno, tep-tep, imagem do João Ratão na facécia dum humorista. Passavam por golfadas, e as suas vozes na tarde serena repercutiam com um timbre tão cristalino que nem reflectindo a própria claridade celeste, sem fimbria de nuvem que a marcasse.”  (Volfrâmio, pág. 30, ed. Bertrand).

         - A propósito de Aquilino. Outro dia, estando sem parabólica, liguei a televisão no canal 1. João Soares a quem devo carradas de generosidade (ele quis editar-me e eu, estúpido, impus exigências talvez demasiadas. O registo desses tempos está aí algures neste Diário), estava como comentador no jornal presidido pelo Nobel escritor dos Santos. Falavam de autores. A dada altura diz o ex-ministro da Cultura: para mim Aquilino foi o maior escritor do século XX e no século XXI você. Não estou certo se foram exactamente estas as palavras, mas o sentido é este, nem se o fez por ironia, não me pareceu. O certo é que aquele que escreve a granel, até ali interpelava-o, agressivo, muda e exibe um ar contente da silva e amocha transformando-se num boneco de peluche com a cabeça grande dourada. Pobre João Soares que já deu provas da sua grande capacidade e inteligência, ter-se prestado àquele ridículo! O enorme escritor nem precisa daquele salamaleque, tendo em conta que usufrui, indevidamente, e sem pagar um tosto da publicidade que o lugar lhe oferece sendo os espectadores, gostem ou não, vejam ou não aquele olhinho maroto a piscar no fecho da emissão. Em qualquer país culturalmente evoluído, não são permitidos aqueles avanços provocadores. Se ao menos o homem nos dissesse ao que vem...


         - Calor abrasador. À parte uma ida ao super, fiquei todo o santo dia resguardado em casa onde o trabalho nunca rareia  Pelas quatro e meia natação. Cumprida, de resto, durante toda a semana, à excepção dos dias que dei um salto a Lisboa. Foi uma semana em cheio, depois do começo recheado de problemas com a água. Exibo já uma pele tisnada do campo que faz parar o trânsito onde ele não existe. A perna que as raparigas modernas ajoelham em adoração, agradece.