quinta-feira, julho 02, 2020

Quinta, 2.
O autocrata Putin acaba de receber por artes que nós conhecemos do tempo de Salazar, a concordância para se manter no poder até 2036! Nesse ano terá 83 anos e será o dirigente que mais tempo governou com rédeas apertadas o país. Josef Estaline ficou-se pelos 26 anos.

         - Regressar a mim, trancar-me na concha de intimidade que redimensiona e reinventa o equilíbrio, o desejo absoluto de silêncio, de escutar a voz que nos segreda o que não ousamos pedir aos deuses e prosseguir, hirto, como se não houvesse obstáculos e os dias se abrissem à tona dos céus inacessíveis. É pedir muito? É. Então, cala-te. Embrulha-te em ti próprio e deixa o tempo incendiar de luz a memória das horas adornadas no logro do passado.

         - Andou aí um técnico a manhã inteira a subir e a descer ao telhado. Veio de Santarém de propósito e custou-me mais barato que os “técnicos” que por aqui proliferam. Da parabólica saiu um fio pelo interior da parede directamente para o lixo e entrou outro para seu lugar. Acertados os parâmetros de captação de imagem e som, eis que volto a ver os telejornais que duram apenas meia hora e me dão o essencial dos horrores do mundo, sem ter que gramar aquele que me pisca o olho não me conhecendo de lado nenhum nem eu gostar de homens de avanços acessíveis; aquele outro que, emproado, vomita as notícias untadas de sangue; ou ainda aquela outra ensandecida pela juventude que derrama do cálice a idade disfarçada.

         - Nunca nada está duradouro por muito tempo. Nos tempos modernos, cada um à sua maneira, vive atormentado por pequenas-grandes coisas, a maioria insignificâncias que nos chagam a paciência. Se o acesso ao mundo rasgado nas páginas do ecrã ficou resolvido, logo se instalou outra preocupação na forma líquida. Há uma semana que tenho em formação diária o lençol de espuma que a foto documenta. A água está claríssima, mas não posso nadar sem o perigo de apanhar alguma bactéria. Levei a foto ao “técnico” com loja aberta há anos mas, como era de prever sendo português, ele respondeu-me que nunca tinha visto nada assim e ia saber a razão junto de alguém que soubesse mais do que ele. Bref.


         - Ouço o vento que varre o silêncio e a tarde reconstitui-se-me em esperança. Silêncio abraça-me nesta hora do teu reino. Preciso tanto do teu amplexo...


         - Terminei o livro do Tordo. Mas hoje não estou com paciência para o analisar. Preciso de espaço até porque não desejo melindrar o autor se por hipótese ele deitar uma breve espreitadela a esta página – não desejo nem ele merece.