Segunda, 8.
Voltemos
ao artigo de frei Bento Domingues. Decerto os leitores mais assíduos deste
Diário, encontram no dizer do monge pregador, muitas semelhanças com aquilo que
de quando em vez eu verto para estas páginas e desde há muitos anos. Isto
porque quanto mais reflito sobre a palavra de Jesus Cristo, à medida que vou
avançando no estudo da Bíblia, hoje na comparação do texto traduzido por
Frederico Lourenço, sou levado a interrogar-me sobre a figura de Deus, se é que
Deus possui figura ou qualquer representação corporal. O que eu quero expressar
é a concomitância com a raiz divina na sua essência primeira e aquilo que os
tempos trouxeram até nós. Há dois elementos que têm transferido imenso
sofrimento à humanidade propalados pela Igreja de Roma: a ideia de que somos
seres vindos ao mundo para padecer horrores e que não fomos feitos para a
felicidade. Mais: a simples palavra do Senhor, seja ela qual for, é uma cruz de
stresse e dolências que temos de carregar. Não fomos feitos para nenhuma
espécie de bem-estar e gozo terreno. A Igreja elegeu em primeiro o direito o
prazer sexual, à escolha da santificação do corpo, como aquele em cujas
adulações cai o selo da eternidade e o afastamento definitivo à santidade
através da ressurreição – princípio matriz da nossa união a Deus. Durante
séculos reconheceu ou consentiu na pena de morte, enquanto ia carregando
eunucos e desesperados a viver com o seu próprio corpo no chamamento gritante
que na adolescência nos impele às maiores loucuras, esquecendo-se que esse
mesmo corpo que deseja, cede e se levanta perante os perigos da incerteza e do
martírio, foi obra do Criador. Ora, o que acontece, é que não somos santos e,
por isso, somos arrastados pela beleza, o murmúrio sensual de um corpo passando
junto de nós, o odor que desperta nos sentidos o desvario, a precisão de
satisfazer as necessidades primárias que nem o avanço da civilização proibiu e
deviam ser momentos de santificação não fora o controlo que a Igreja exerce
sobre cada um de nós. Ela, a Igreja, faz depender a passagem por este mundo, da
aceitação do sofrimento que os judeus causaram a Jesus Cristo e que O levou à
morte. A mim basta-me saber que alguém sofreu não para se orientar nas riquezas
e poderes terrenos, mas por amor de todos os homens seja qual for a sua origem
ou crença religiosa. A verdadeira mensagem, a mais original, a que reúne todos
os princípios que dão consistência e sentido à vida é o Amor. Até então,
ninguém à face da terra havia divulgado um tal conceito que ainda hoje é tido
por escandaloso. Esse Amor vem de Deus que utilizou o seu Filho para no-lo
transmitir. Assim como a igualdade. Somos todos iguais em Cristo. Claro que
tais premissas foram um escândalo que não podia passar atendendo aos poderes da
Sinagoga e da autoridade romana. “Gostará Deus do sofrimento de quem mais ama?”
pergunta frei Bento Domingues. Claro que não. Mas foi ao abrigo desse pseudo
desejo que o clero susteve, controlou, amarrou os fiéis analfabetos e manobrou
o poder temporal apropriando-se dele. Deus na boca dessa gente de barretes
vermelhos, é um sádico, um tirano, um prepotente. Ainda que eu não tenha
detectado no NT dos Evangelistas nada que remeta para a sexualidade, a
violência (aqui, talvez no tocante aos vendilhões do templo, sobretudo, em João
(2-15-16) algum desnorte que surpreende), fora isso, o percurso de Jesus Cristo
na terra, foi a divulgação da mensagem do Pai, quase toda em parábolas, as
muitas curas que fez e o confronto com os poderes instituídos, as ideias
feitas, tudo sob o manto enternecedor do Amor. Se cada um de nós vir no outro a
imagem de Deus, mesmo que seja aquela que enquanto humanos identifiquemos com
Jesus Cristo, o mundo e todas as criaturas que nele vivem conhecerão o paraíso
na terra.