Terça,
9.
A
Annie telefonou no retorno da sua viagem ao Vietnam. Estivemos à conversa para
cima de uma hora. Trouxe de lá um vírus de tal modo violento, que está à carga
de antibióticos fortíssimos. A coisa parece não ter corrido bem entre ela e a Françoise,
ambas socialistas de gomo. A primeira mais caviar e champanhe, a segunda cerebral
e romântica. Françoise de quem gosto muito, tomou-se de súbito pela rainha de
Inglaterra exigindo de todos aquilo que se achava no direito devido ao preço
exorbitante do projecto. Annie e Robert, sendo diferentes no modo de tratar
quem os serve, amuaram e às tantas tiveram mesmo de dizer do seu desagrado. Eu
conheço o género. Já aqui abordei o tema e compreendo perfeitamente o que
sentiu a Annie ao ter que lidar com este esboço novo-rico alarve que alastra
por todo o lado. Eu tenho um grande respeito pela empregada de caixa ou pelo
empregado de mesa, admiro a sua generosidade no trato com pessoas que não
conhecem de lado nenhum, e estou sempre pronto a perdoar “qualquer coisinha”. Acho
até que o verdadeiro aristocrata é aquele que não descrimina, que tem mais
respeito por quem o serve que por essa casta de oportunistas que escalaram a
política para se servir. Depois, quando nos aproximamos daquelas personagens
arrogantes, vemos que não passam de gentalha sem cheta nem princípios, para
quem a relevância das suas pessoas vem da importância dos sacos de plástico
onde guardam uns míseros euros e escondem a sua condição de favela.
- Aqui no “Alegro somos todos nós” (que
maravilha de originalidade! Eu que trabalhei anos a fio como copy, ao lado
disto, sou uma nulidade!) onde venho diversas vezes trabalhar e onde me
encontro, uns lamechas admiradores dos livros, montaram entre os dois pisos do
parque de estacionamento, um recanto com uma estante repleta de livros, duas cadeiras
e um candeeiro. Supunham eles, provavelmente, que estavam num desses países
civilizados da Europa central ou então tinham a pretensão de desviar o português
dessa atarantação colectiva e fanática que é o futebol. O facto porém, das n vezes que por ali passo, nunca vi
ninguém interessado nas belas Citações de
Bocage (o livro está como sempre esteve desde que inauguraram esta grande
loja de materiais de construção, preso por uma corrente revestida, assim como
todos os outros dispostos na estante: O Recruta
de Robert Machamore, o Diário de um
Banana de Kinney admiráveis e de sustança
e representativos da moderna literatura) e nunca leitor algum se deu ao
trabalho de virar a página.
- O tempo corre contra os infelizes
que estão nos escombros dos prédios aldrabados derrubados pelo sismo a Sul de
Taiwan. Parece que pelo menos uma centena de pessoas está em agonia e os
bombeiros ouvem ainda passadas quarenta e oito horas gritos de socorro. O
número de mortos, subiu para quase cem.
- Plantei uma dúzia de Sparaxis que
trouxe de Paris, limpei o pátio do lado Norte da casa, comecei a abrir a cova
para transplantar uma figueira.