quinta-feira, agosto 13, 2015

Quinta, 13.
Ontem andei numa roda-viva. De manhã, fui à Brasileira encontrar-me com os meus artistas que me reclamam presença amiúde; dali desci ao Rossio para me encontrar com o Pascal com quem combinei almoçar assim como com o Simão e ambos baldaram-se. Livre, como tinha que ir visitar a Conceição internada no IPO para uma operação estética, acabei almoçando no CI e dali fui ao encontro da minha amiga. Tudo feito a penates. Dos barcos ao Chiado, deste ao Rossio, do Corte Inglês ao hospital e depois a Sete Rios para apanhar o comboio que me devolveu ao sossego. O calor não era tão violento como nos dias anteriores. Todavia, a atmosfera estava pesada, qualquer coisa perturbadora pairava no ar, fatigando, arrastando as pessoas que caminhavam lambendo os passeios com as solas dos sapatos. Na Baixa, como vem sendo habitual, a praga dos estrangeiros apanhados nas malhas dos oportunistas que lhes sugam os ossos até ao tutano. Isto vai acabar mal. Os portugueses não são povo de estudo, de trabalho aturado e persistente. À indústria, à ciência, preferem o negócio, o ganho de dinheiro rápido, se possível com pouco trabalho e muita reinação. A seguir vem as lágrimas, o desespero, a inveja, a cobiça. É assim, sempre assim foi.


         - Arrasto-me para vir aqui debitar uns quantos comentários cada vez mais esparsos. Tenho as atenções à entrada de Santa Cruz da Trapa onde não ouso penetrar. Por várias vezes pus o pé do outro lado, mas recuei sabendo que dali a cinquenta páginas encontro o vazio, a dor de me separar das personagens que fazem parte da minha família, aquela que eu escolhi e por consequência me estreita de profundos e sinceros afectos: a heroína principal Juju, mas também José Tormentoso, Abílio Menezes, Engrácia, o velho Lascas, Leonor da Conceição, Sebastião, Serafim, o José da casa dos cromados, o torneiro, Jeremias Carrapato e tantos outros que me adoptaram e com quem fui tecendo laços de amizade e convívio ao longo destes dois anos e meio. A chegada a Santa Cruz da Trapa é uma espécie de subida ao Gólgota não só da personagem principal, como de todo o romance. É também lá que tudo acaba, que a escuridão me invade, que o frio da montanha se instala no esgotamento que me toma todo o corpo, nas lágrimas de saudade que assomam contra minha vontade aos meus olhos cansados e me deixam paralisado diante da folha, como se estivesse face a um precipício e soubesse que dali para a frente tinha a morte por destino ou quem sabe por salvação.