terça-feira, dezembro 23, 2025

Terça, 23.

O verdadeiro, o autêntico retrato do país e dos nossos governantes, ficou afixado na série de entrevistas ao assalto a Belém. Esta linguagem pode parecer rude e inapropriada, mas reflecte, sem qualquer respeito, a impressão com que fiquei do pouco que vi e escutei – verdadeira feira da ladra, ódios, ambições  pessoais, desrespeito pelos portugueses, choldra, descoberta de sumidades que se encobrem atrás de figuras sem grandeza e personalidade. A democracia cairá com gente deste jaez.  


segunda-feira, dezembro 22, 2025

Segunda, 22.

As coisas complicam-se entre a Venezuela e os EUA. Trump julga-se o senhor do mundo com capacidade e poder para o dominar ou subjugar. Até agora impediu as frotas aéreas de cruzar os céus do país, atirou a matar sobre embarcações que diz serem dos piratas da droga, apreendeu cargueiros com combustível, ameaça depor Maduro. Tudo isto, diz ele, para proteger a América do peso das drogas. 

         - Há instantes, andei a distribuir bolos-reis pelas pessoas que durante o ano me ajudam nos trabalhos da quinta: Piedade, José Manuel, Correia (com o tractor), Oleg mecânico do carro. Com este último, sendo ucraniano, tive uma conversa sobre a rendição que se prepara em Washington e Moscovo. Ele é de opinião que Zelensky não cederá nenhum bocado de território para a Federação Russa e disse isto com uma tal veemência que parece ter chegado aos ouvidos do ilustre presidente do seu país. 

         - Isto de ser advogado, palrador televisivo, criador de factos e tradutor de normas políticas, pareceres, elogios a este e àquele, num país pobrezinho, rústico, onde quem tem olho é rei, dá um conforto financeiro de em dois anos ver a conta bancária crescer 700 mil euros!!!

         - Enquanto isto, os sem-abrigo, nos últimos nove anos, cresceram 260 por cento! Rica democracia tão desigual que em 50 anos não conseguiu abolir a pobreza que se mantém sólida nos dois milhões e meio de pobres.  


domingo, dezembro 21, 2025

Domingo, 21.

Lá fomos, sob chuva e trânsito medonho, a Alcabideche para assistir à missa de corpo presente em louvor do Guilherme Parente. Não conhecia aquelas paragens e muito menos a empresa americana que me dizem tomou conta do negócio da morte e tudo o que ela envolve e como produto o corpo humano associado ao acontecimento social no momento da descida à terra. Não sei quanto é que aquilo custou, sei que o serviço foi impecável. Ponho de parte tudo a que assisti, e quedo-me pelo final quando a filha do Guilherme, Maria, agradeceu aos presentes a presença. Nas suas costas estava uma tela do pai invocativa da ressurreição de Lázaro (João, versículo 11) por quem o artista tinha especial devoção. Acontece que a Maria escolheu aquele quadro-presença do pai e só depois veio saber que Guilherme faleceu no dia de S. Lázaro, 17 deste mês. Não há coincidências, há mistérios que não se explicam e são por isso mesmo aqueles que nos cobrem de esperança. 

         - Os nossos inteligentes e honrados políticos que em Bruxelas trabalham que se desunham, renderam-se às leis jurídicas, e não compreenderam, mais uma vez, que Putin não parará na retoma da Ucrânia e quererá acabar com a União Europeia e fazer voltar ao império soviético os países que o tresloucado (como eles dizem) Gorbatchov permitiu separar da grande Rússia. Quem traduz a burrice, é Teresa de Sousa quando considera que “Era uma decisão política (o apoio financeiro à Ucrânia), não era um debate jurídico como alguns quiseram fazer querer. Fredrich Merz e Von der Leyen defenderam este mecanismo. Uma maioria ampla de países-membros estava disposta a apoiá-lo, mas bastou Orbán e um homenzinho da Flandres para obstar. Assim não são os milhões da Rússia congelados nos bancos Belgas que aguentarão os custos da guerra, mas os impostos dos países membros da UE. Putin e Trump, Orbán e De Wever, e mais uns quantos rejubilam. Quanto mais cretinas forem as decisões europeias, melhor para a reviravolta que está a acontecer no mundo.  


sexta-feira, dezembro 19, 2025

Sexta, 19.

A maior praga do capitalismo é a exploração e a dos novos-ricos a exibição. Vem isto a propósito da aglomeração de uns quantos Maserati esta semana na Baixa. Obrigados a parar nos semáforos do Rossio, aceleravam os motores e debitavam um ruído insuportável pelos escapes – maneira de os transeuntes parar para os admirar. A polícia que, portanto, os devia multar, ficou estupefacta. 

         - Outro dia, aproximei-me de um quiosque na Av. da República e logo fugi quando li o que a foto regista. Debandei não fosse o cheiro nauseabundo perseguir-me... A esquerda – Livre, BE, a dos cãezinhos – adoram a universalidade da cidade.

          - Luís Montenegro passou um atestado de menoridade ao Ministério Público. Depois de mais de um ano e queda de um governo, veio o parecer da inventora Spinumviva. Afinal a montanha pariu um rato. Tudo o que a oposição andou a dizer contra a sua idoneidade, caiu com o processo pura e simplesmente arquivado. Admiram-se? Eu nem um pouco. A democracia em Portugal é um campo de batalha que não dá tréguas. Vale tudo para subir ao púlpito do poder. Que tristeza!  

         -  O único estadista europeu que se distingue da maioria amorfa, é o chanceler alemão. Todos estão reunidos mais uma vez para salvar a Ucrânia, e todos não pensam senão em si mesmos. Zelensky com grande dignidade, apela à ajuda convicta que expulse Putin das suas fronteiras, mas os senhores da UE preferem reuniões, discussões, almoços e jantares – são a imagem de um rebanho tresmalhado. Luís Montenegro diz banalidades. António Costa exibe sempre aquele sorrisinho que ainda não chegou ao sorriso pateta de Durão Barroso mas para lá caminha. 

         - Almocei com o João e a companheira do filho. Repasto agradável que só aceitei porque o vi muito em baixo. Amanhã vamos assistir à missa de corpo presente em despedida do Guilherme Patente na igreja de Alcabideche.  Mas já hoje soube da morte do poeta Gil de Carvalho. Sem palavras. 


quinta-feira, dezembro 18, 2025

Quinta, 18.

Faleceu o meu querido amigo Guilherme Parente, afundando-me ainda mais na depressão que tantas mortes me causaram. A nossa amizade remonta à saída da minha adolescência  e foi não só construída pelo seu enorme talento artístico, mas também pela sua personalidade boa, afável, edificante. Admiro a sua pintura, o seu jardim encantado de onde nunca saiu e nele ficou nos espaços das telas até ao fim da vida. Deu-me a triste notícia o João quando tinha acabado de sair da Fnac onde estivera com o Filipe. Logo me dirigi à igreja de S. Domingos para uma prece em sua intenção. Todos se vão, numa espécie de urgente debandada, deixando-nos abandonados num mundo a cair aos bocados, sem Deus, prisioneiro dos bens materiais, sem ética nem espírito construtivo,  que não identificamos como nosso, tais e tantas são as batalhas que nos reduzem ao silêncio e à escravidão. Descansa, enfim, em paz meu saudoso amigo. 

Num dos nossos muitos almoços. 



terça-feira, dezembro 16, 2025

Terça, 16.

Quando tudo tomba à nossa volta, que devemos fazer? Foi a saudosa Annie que partiu a 25 do mês passado, a Clara Pinto Correia, a Piedade que está nas últimas, um vizinho que saiu de casa e foi atropelado à sua porta por um condutor que se pôs em fuga, e não sei mais quem que eu conhecera ou com quem me cruzara alguma vez. Fui-me abaixo com este cerco de vazio que me tomou e tudo tenho feito para retomar o ritmo da vida de então. Assim, ontem, sob chuva torrencial fui a Lisboa solucionar a questão dos óculos que não ficou resolvida da última vez que estive na Fabrica dos Óculos, ao Chiado. Desta vez, entendi que não valia a pena lá retornar, posto que o trabalho é para profissionais competentes e, a conselho do Carlos Neto, enfiei numa loja do ramo, perto do Saldanha, dirigida por dois oftalmologistas e ali mandei fazer outros óculos das lentes à armação. Paguei 600 euros e espero reclamá-los ao primeiro estabelecimento. Talvez por andar sensível, o facto de não poder ler com os dois olhos (fecho o esquerdo), criou-me uma pequena depressão e devido ao esforço picadas no cérebro. Desde Maio que venho sofrendo deste incómodo para quem os dias passam entre leituras e escrita, é desmoralizante. Também retomei hoje a piscina. Lá reencontrei os velhotes, de língua afiada contra os políticos, tratando-os de “cabrões, o que eles querem é tacho”. Este epiteto, atirado por um bando de velhos nus, torna-se cómico e não transporta senão uma risada a quem ouve. Outro problema que não foi resolvido foi a passagem dos documentos criados no anterior Macintosh para o novo. Vou amanhã almoçar com o Filipe (meu anterior criativo) que me garantiu tudo fará para arrumar o assunto.

         - Até porque a enfiada de leituras, entre Julien Green e o último volume de Bíblia traduzido do grego por Frederico Lourenço, somam 1774 páginas. É obra!   

         - O ex-adjunto da Ministra da Justiça, professor universitário, Paulo Abreu, de 38 anos, foi detido por crimes de pornografia e abuso sexual de menores. Fala-se em mais de 500 crimes. Parece que uma boa parte foram executados do seu gabinete ministerial. Surpreendidos? Eu nem um pouco. Basta ouvir falar, naquela lengalenga que nunca mais acaba e é sempre a mesma só divergindo o papagaio, os candidatos a Belém. É tudo tão pobre, parece até que à medida que o tempo passa, a palração torna-se toda igual, amassada, untada, acabada num pez odorífero insuportável.  

         - A propósito. O professor Marcelo voltou a surpreender-nos. Declarou que não quer nada do seu cargo presidencial: carro, combustível, motorista, secretária, gabinete, reforma. Até nisso é original e desinteressado das mordomias oferecidas gratuitamente (que diferença entre Cavaco, Soares, Eanes). Apenas fica com a reforma de professor universitário. Quanto ao mais, o futuro está traçado: aulas na universidade da Califórnia, uma parte do ano lá, a outra cá, a biblioteca pessoal vai para Celorico de Basto de onde é originário, a basta. 


domingo, dezembro 14, 2025

Domingo, 14.

Há duas coisas de que faço a máxima parcimónia: comer e medicamentos. Fujo das duas como o diabo da cruz. Todavia, deu-se o caso de as dores que tinha no pescoço não abrandarem. Então, sexta-feira, tenho encontro com o João na Brasileira, entrei na farmácia ao lado para falar com uma farmacêutica. Depois de ouvir as queixas e os remendos que fui pondo para as sarar, deu-me um anti-inflatório muito publicitado na TV: o Voltarem. São umas pastilhas do tamanho da unha mindinha, transparentes, rolantes, que fizeram o milagre de afugentar as dores. Tomei duas daquelas insignificantes coisas e logo o mal se foi. Continuo como sempre me aconselhava o Tó de fazer e só amanhã suspenderei o milagroso bicho. Dito isto, olhando e tornando a mirar aquele minúsculo insecto, lembro-me das experiências que por vezes faço no meu corpo. Um exemplo. Uma sopa já traçada que não quero deitar fora, experimento como reage o estômago dando-lhe uma colher apenas da panaceia. Então não é que o corpo se recente e embora não tombe desmaiado diz-me que recebeu mal a visita da peçonha. É de admirar a Ciência que com uma espécie de pulga-comprido, produz saúde.  

         - Agora ando em maré de mulherio; os rapazinhos e os homens secretos de olhares românticos, desapareceram. Ontem, uma copeira, que não me recordo de a ter visto, embora ela diga que me conhece, encetou comigo um diálogo maluco que começou pedindo-me que adivinhasse a sua idade. Olhei-a: rosto redondo, sorridente, lábios finos olhar cortante de quem está habituada a enfrentar o imprevisto, pequena de formato, voz insinuante e leitosa. “Uns vinte anos.” Ela sorriu, insistiu para que a mirasse bem, e por fim disparou: “trinta e cinco.” Na realidade parecia mais nova, mas para mim era-me completamente indiferente a idade e tudo o mais, porque não sou atraído por palpites nem me derreto por quem se me atravessa ao caminho carregando o sortilégio do imprevisto. O que se seguiu, é dos tempos presentes: as mulheres adquiriram a arte do engate e são mais eficazes que os homens. Penso, contudo, que eles cedem mais depressa à tentação da cama que elas. Elas rondam o quarto, sentam-se aos pés da cama, olham em redor, admiram o enfeite dos lençóis, e deixam para depois o que parecia a ele ser satisfeito de imediato. 

         - São já 12 a vítimas mortais de ataque terrorista contra a comunidade judaica na Austrália e pelo menos 29 pessoas foram feridas. Um grupo anti-semita atacou quem estava na praia de Bondi, Sydney, passando a tiro quem encontravam. Mais de mil crentes estavam no areal em celebração do Hanukkah do Chabad, um movimento judaico hassídico (que dá coragem religiosa, alegria piedosa).  


quinta-feira, dezembro 11, 2025

Quinta, 11.

São muito curiosas estas greves que dão fins-de-semana prolongados, pagos, contra os desarranjos e prejuízos para a maioria dos trabalhadores do sector privado que fica sem ganhar por culpa dos “revolucionários” sindicalistas. Eu também não ponho a minha assinatura em alguns dos enunciados da futura lei, mas penso que seria necessário deixar chegar ao fim as conversações para ver o seu desenlace. Assim é um tour de force inútil que só serve as manigâncias partidárias. Por aqui, reina a animação. Tudo está aberto e os trabalhadores camarários e outros, gozam o dia em compras de Natal. Que país! 

         - Outro dia passei na Brasileira. Um dos moços simpáticos que servem às mesas, veio para mim e disse: “Sente-se, faça-nos companhia.” Por ali me quedei, com efeito. Entretanto, turistas ia chegando e ele, no seu inglês que para o caso mais não seria exigido, lá se ia desenrascando. Veio-me à memória aquela frase de Bismarck, o terrível chanceler austríaco: “O dom das línguas é um dom de empregado de café.” 

         - O Fertagus é sempre para mim a galera de observação. Quando cheguei à gare para obliterar o bilhete, encontro uma negra pequena de porte, nem gorda nem magra, de olhos esverdeados que me fixou num  isto de interesse e desafio. Disse-lhe: “Estava à espera que a máquina não funcionasse!” Ela riu-se e disse: “Gosto de ver essa luz verde a acender e a apagar. – Que não seja por isso – respondi – pode aqui ficar até à meia-noite.” Nesse momento o comboio pára e eu dirijo-me para ele. Ouço, então, nas minhas costas: “Vai para onde?” Não respondi e entrei. No interior ela pergunta-me se conheço Foros de Amora, digo-lhe que não e ela, sem mais aquelas, convida-me a ir ao seu bairro. “É muito amável” e enfio os olhos no jornal. Reparo que ela não tira os seus de mim e quando chegou à estação, tornou: “Venha conhecer a minha casa.” Para não a decepcionar, atirei: “Noutra altura.” 

         - Outro dia o Jornal Público trazia este título: “O que me dá tesão no meu trabalho é eu ser o meu rato de laboratório:” Quem o afirma, é uma autora brasileira que pelos vistos tesão não lhe falta. Esta geração dos ditos escritores, cheios do talento de que o vazio os abastece, expõem-se à saciedade ao empolamento de si mesmos, como se a literatura fosse um meio de ser alguém surfando a onda da ociosidade dos tempos presentes. 

         - Às vezes, ao ligar o televisor, dou com um professor universitário que explica a nossa língua. A simpática personagem é cativante na forma e no conteúdo, mas surpreende-me quando diz: “Quais é que são...” Eu, não sendo catedrático, diria “Quais são...” pura e simplesmente. 

         - Temo que Zelensky tenha de capitular face aos EUA e à Rússia. Ele é a cópia de De Gaulle e o melhor estadista que o mundo tem. Mundo entregue a um monstro sem preparação para o cargo nem deontologia, abrasado pela loucura dos negócios como inspiração divina. 

         - Com esta beleza tive tudo o que quis. Por isso hoje, estando saciado, dou-me ao luxo de não querer nada. 


Foto tirada pela Annie em Óbidos.

terça-feira, dezembro 09, 2025

Terça, 9.

Todo o santo dia o Céu num choro convulsivo e eu recolhido no aconchego das palavras de Julien Green. 

         - Há uns dias que ando cheio de dores no pescoço, resultado, seguramente, de muitas horas de escrita e leitura. Ontem o Vítor quando falámos sobre o lançamento do seu livro, Imagens de Dom Sebastião, no Palácio da Independência e a que eu não pude assistir,  lembrei-lhe que na nossa juventude, o vi uma vez com o mesmo problema e perguntei-lhe como o tinha solucionado, resposta aplica Voltarem – o medicamento dos dias de hoje. Fui sempre relutante a adquirir fármacos publicitados na TV por indicação do que nos diziam em casa. Contudo, esta manhã, sob chuva torrencial, precipitei-me para a farmácia. O farmacêutico conhece-me, foi da mesma opinião do meu amigo. Chegado a casa, untei a parte dorida e agora, às 15,30 já quase não sinto dores. 


segunda-feira, dezembro 08, 2025

Segunda, 8.

A China não se levanta do enorme incêndio de há duas semanas ocorrido em Hong Kong. Pelo menos 150 pessoas pereceram e centenas de feridos. Grande parte do trágico acidente deveu-se ao bambu com que antes se erigiam os prédios, mas também à corrupção (ela está por todo o lado, mesmo nos regimes comunistas) que impede as populações de a denunciar nas ruas ou fazê-lo duma forma ciciante devido ao cinismo do Governo. 

         - Assisti por fastio ao debate entre António Seguro e Catarina (não sei quê perdi o sobrenome). Aquele confronto devia servir às universidades de estudo e realidade do Portugal de hoje. Contudo, ele diz-nos porque razão os portugueses reduziram o BE a lixo de beira de estrada. Espero, sinceramente, que Seguro seja o nosso Presidente da República. 

         - Black que eu pensava ter repugnância aos ratos não ousando comê-los, ontem ofereceu-me o espectáculo à porta da cozinha enfiando em três tempos um simpático ratinho que eu imaginara tinham há anos desimpedido este espaço. Foi a entrada para logo emborcar uma malga de ração seca e molhada. Anda sempre esfomeado, mas a barriga pende já o que me vai obrigar a reduzir-lhe as doses. A namorada que não me largava a porta, desde que teve dois filhos e eu por duas vezes os fui deixar no vizinho que adora gatos e tem, inclusive, a ajuda da Câmara para os alimentar, nunca mais aqui pôs os pés. Mas Black, fiel à escolha que fez do seu dono, aqui permanece aparentemente feliz. Espera-me ao portão e no caminho até casa, dá-me sapatadas nas pernas.  

         - A vida retomou o seu ritmo em Paris. Annie, querida amiga, ficou enterrada no cemitério de Cambrai em mausoléu de família. Robert regressou a Paris e, por momentos, ocupa-se em organizar a casa a seu modo. Vai passar o Natal com o filho da mulher a Strasbourg enquanto a Laure passará com a irmã em Carcassonne. Disse-me que o nosso relacionamento é para continuar, insistiu que eu devia ir passar algum tempo a Paris, mas eu tomei um certo recuo porque nada é como foi em quase quarenta anos. Entretanto, Françoise, reclama a minha presença no apartamento vizinho daquele onde o nosso anafado José Sócrates viveu. 

         - No fertagus que me remeteu a casa, sentados nos bancos para prioritários, uma branca e um negro em frente dela. Ela praticamente estava nua: uma mini-mini saia, um decote que não servia senão para expor as mamas grandes e tesas, as coxas grossas, os dois envolvidos numa marmelada que levava as senhoras africanas a desviar o olhar não de cansaço, mas de vergonha. Olhei o preto pelos seus vinte e cinco anos e aqueles olhos de vencedor, pareciam expandir a loucura de ter atravessado o Oceano para encontrar a branca esborrachada, rainha dos seus sonhos, orgulho da sua raça e condição.


sábado, dezembro 06, 2025

Sábado, 6.

É uma tristeza abrir os jornais e constatar a pobreza moral a que Portugal chegou. A corrupção está por todo o lado, o abandono das pessoas à sua sorte contínuo, instalou-se uma espécie de aceitação ou lassitude que tudo engrandece transformando a sociedade numa comunidade de gente rendida, gasta, impotente. Aqui e ali, puxando a brasa à sua sardinha ideológica, alguém grita que no tempo da outra senhora também havia corrupção e compadrio, para desculpar ou encobrir o que hoje impera sem interrupção em todo o país. Os arautos das doutrinas humanistas, não querem ouvir falar dos dois milhões e meio de pobres que vergonhosamente persistem, da juventude alienada a valores supérfluos, deitada numa fantasia que a vai fazer sofrer e aderir a ideais extremados, os pobres escumalha na extremidade da sociedade que os dispensa por demasiado caros e inoportunos, os velhos deixados à antevisão da miséria, os imigrantes – como me dizia no fertagus uma santomense – vivem pior aqui que nos seus países, deixados à sua sorte por aqueles que pregam a doutrina do humanismo e dos Evangelhos (“vinde a mim os infelizes”), para depois taparem os olhos quando os vêem na rua com mantas de cartão a cobrirem-se do frio, da vergonha e slogans que lhes prometem aquilo que sabem nunca alcançarão. A esquerda chique não passa disso mesmo – um punhado de fala-baratos, que não descola do tempo do fascismo, não compreende a sociedade de hoje, vive embrulhada no conforto das suas ideias ocas, sonhando com a ressurreição de Marx, Lenine e Estaline. Não se aguenta, é insuportável, vazia, faz dó. É dela que saem os Venturas e os ditadores que em breve governarão o mundo. Fala, rapaz, estás cada vez mais de direita – bichanam os que estão cada vez mais de esquerda. 

         - O nosso almirante, candidato a Belém, saiu-se com esta: "Se a ministra da Saúde está a falhar, o primeiro-ministro também está", portanto ele se encarregará da sua substituição. Dou-lhe um conselho: Não vá por aí se chegar a Presidente da República – comem-no vivo. E se António Costa voltar com o seu Ministro da Saúde, vai ter de cumprir o que diz. Não me admira que na segunda volta, os comunistas apõem o homem das vacinas. 

         - Vimo-nos livres daquela figura sinistra, viúva de muitos séculos, mas não nos vimos livres do imposto Mortágua, dito IMI, mais uma bela obra da encardida geringonça. Já agora, uma pergunta inocente: porque razão no tempo da geringonça não houve greves e muito menos gerais como a que nos anuncia o PCP que consigo empurrou outros sindicatos? O direito à greve, devia ser repensado, porque ele é feito segundo os interesses políticos dos partidos e nunca dos trabalhadores que, querendo trabalhar até porque não o fazendo não recebem, ficam impedidos. Outra pergunta ainda mais inocente: porque é que ao longo dos tempos, tantos sindicados foram aparecendo quando antes praticamente haviam dois valentes: CGTP  e UGT?  

         Que dizer do apoio da FIFA a Trump - uma vergonha a demonstrar de que lado está a associação dos futebolistas e seus interesses comuns.

         - O senhor José andou aí e fez um trabalho notável ao dizimar de raiz as silvas, algumas grossas como pulsos, serpenteando sobre as laranjeiras. Custa-me caro, privo-me de muita satisfação, mas não choro o dinheiro que lhe passo para as mãos. 


quinta-feira, dezembro 04, 2025

Quinta, 4.

Neste entretanto, veio em meu auxílio o último volume publicado Toute Ma Vie de Julien Green. É curioso que em vários momentos difíceis da minha vida, Green fez-me companhia introduzindo uma espécie de luz ora intensa, ora matizada pelas suas próprias agruras. Com ele tenho passado longos serões e, para minha fatalidade, numa semana avancei 200 páginas naquela letra miúda que tanto mal faz aos meus olhos. Não se trata de uma distração, é puro saber varrido pelos dias onde a presença de Deus e do Diabo são constantes, sexo e amor numa salada de emoções difíceis de compatibilizar, mas onde a sensibilidade, o espírito, a cultura do autor faz-nos próximos dos seus dias, ou antes dos seus anos. É uma vida descarnada. Do ponto de vista meramente literário, nunca a literatura conheceu um testemunho tão humano e plangente. Corajoso escritor que, tendo vivido em assunção antes e no pós-Segunda Guerra, nem por isso se escondeu atrás de uma moral hipócrita que endeusou, por exemplo, François Mauriac, Martin du Gard, Gide, Jacques Lacretelle  e tantos outros da sua geração. 

         - E como vai o mundo, irmã Agnes? Tenebroso. Desde que o tresloucado Trump assumiu o poder, as nações paralisaram e a humanidade está em permanência de alerta ao imprevisto. Ele que persegue o Nobel da Paz, instaura desassossego, morte, conflitos, desordem e temores por todo o lado. São uns a seguir a outros os países tratados de assassinos e miseráveis, fedorentos e drogados. À Venezuela pretende invadi-la com o pretexto de sacudir os gangues da droga e assim impedir o espaço aéreo de um país soberano. Não gosto minimamente de Maduro e do seu regime, mas não deixo de lhe dar razão na defesa que faz do seu território. Na Faixa de Gaza diz que o plano de paz por ele estruturado continua de pé e no entanto, de ambos os lados, HAMAS e forças israelitas, prosseguem os atentados e as mortes de civis e crianças. Na guerra da Ucrânia, quer implementar os objectivos de Moscovo, negoceia directamente com Putin, sem chamar à mesa das negociações o principal interessado, Zelensky. Esta semana opinou e decidiu barrar a entrada nos EUA a uma dúzia de povos e escorraçar os que estão há muitos anos sob a bandeira americana. E ainda o caso dos mexicanos que foram tratados abaixo de cão. Quem mais rejubila é Putin e o seus negócios; esfrega as mãos de contentamento pelo estado de graça que Trump lhe proporciona, chegando a avisar a Europa que está pronto para a guerra.  

         - Por cá é a habitual política de chinelo. No balancear da campanha para as presidenciais, arribam os interesses corporativos e pessoais de assalto ao Ministério Público que acusam de tudo e o seu contrário, como se os executivos do poder, PS e PSD, nada tivessem a ver com a degradação da justiça, Os meus leitores conhecem o que penso dos governos de António Costa cujas desgraças ainda hoje somos vítimas e do seu papel em Bruxelas para o qual suponho não ter qualificações à parte ser uma espécie de secretário da senhora von der Leyen. Contudo, nada disto me obsta a ficar do seu lado na intentona que o levou a pedir a demissão de um governo maioritário, montada pelo Ministério Público que criou um casulo de suspeitas que agora se vieram a revelar falsas. É esta leveza de acções, este escapar dos segredos dos dossiers, este empurra para lá e para cá, que transformou todo o edifício judicial num monte de lixo.  


quarta-feira, dezembro 03, 2025

Quarta, 3 de Dezembro.

Com imensa dificuldade tenho conseguido encarar a vida depois do falecimento, dia 25 de Novembro, da minha querida amiga Annie. Conhecemo-nos quando fui enviado a Paris fazer uma série de reportagens sobre a condição dos emigrantes algum tempo depois do 25 de Abril de 1974 e desde então fomos aperfeiçoando e desenvolvendo um relacionamento de uma nobreza sem igual. Ela tinha sempre as portas abertas da minha casa e eu a dela ou antes as dela. Os telefonemas eram consecutivos, as viagens que fizemos juntos muitas, as discussões sobre arte, literatura, política nunca se afastaram dos nossos encontros.  Por vezes ela era como eu dizia uma socialista tirânica, mas passados alguns minutos éramos uma só pessoa na sagrada amizade que nos ligava. Sei que está no lugar eterno que pelo muito que deu aos outros merece; e também sei que de lá velará por mim. Dizendo-se agnóstica, quando eu lhe dizia que pedia a Deus que a protege-se, respondia: “És o único que me fala assim. Obrigado, Helderrr.” Acredito que agora, confrontada com a realidade, nessa ressurreição a que todos aspiramos, o teu agradecimento pelas minhas preces, seja retribuído em louvores pelo nosso reencontro.  Um beijo, terna amiga. 

Há três anos em visita ao museu Rodin, Paris. 


Há dois anos aqui em Palmela.  




domingo, novembro 23, 2025

Domingo, 23.

E depois, pensando melhor, há tanta coisa em comum no triunvirato que se reuniu na Casa Branca. O anfitrião anda a contas com o processo Jeffrey Epstein onde se mistura pedofilia e negócios, Mohammed bin Salman, o ditador que governa com botas cardadas a Arábia Saudita e mandou assassinar e esquartejar o corpo do jornalista Jamal khashoggi e o jogador de futebol que nos EUA teve um processo por violação de uma jovem. Tudo boa gente.  

         - Tudo é permitido à IA. Assim começou a circular nas redes sociais um projecto natalício no centro de Londres, cheio de luz, efeitos lindíssimos, as fachadas do Parlamento, o Big Ben, os jardins em volta e a ponte que me levou inúmeras vezes à outra margem do rio Tamisa onde se ergue a St. Paul's Cathedral, repouso dos notáveis do Reino Undo, o arvoredo como explosões de luz deixando na atmosfera a alegria criada ou inventada pelo consumo que ferve em época de Natal. Os ingleses precipitaram-se para o centro da capital, para isso alugaram hotel, vieram de carro ou avião, mas quando chegaram viram uma vasta zona despida, fria, desagradável, nua, insípida, sem uma luz sequer, a lembrar-lhes a felicidade que buscavam – foram traídos pela fantasia da IA.

         - Hoje menos frio, mas ontem quando peguei no carro, havia 3 graus e estava todo coberto de geada. Logo interroguei as laranjeiras em frente prometendo-lhes que aquela minúscula neve seria proveitosa para apurar o açúcar que brevemente saborearei. 

         - Continuo Green. Todavia, infeliz porque o quero por companhia e não de passagem. Vou ter que me dominar e não galopar sobre as páginas admiráveis de um homem que toda a vida lutou contra os demónios sexuais que achava o afastavam de Deus. Não obstante, quando em 1945 a 1949 empreendeu decisões terríveis nesse sentido, encontro-o agora, em 1951, com 51 anos, envolvido numa trama de vida artística onde quase todos são homossexuais, e um ou outro o tenta desesperadamente. Assim o músico Ned Rarem  cuja beleza o desorienta, mas os seus princípios cristãos os afastam. Até quando conhecendo eu o autor? 

         - Desejo tanto abandonar este diário. Perco imenso tempo com estes apontamentos (Vergílio Ferreira que também produziu um monumental, chamava-lhe “merdelhices”) sem interesse nenhum, farto de me expor aos olhares indiscretos ou babacas, que dele sorvem aquilo que nunca saberei ou sabendo torno a cabeça e tapo os ouvidos e digo para mim mesmo que isto não é meu, quando muito é o reflexo de mim no espelho que não possuo. 

         - Mandei construir esta casa em 1998 e só ontem contei os degraus que me levam ao andar de cima: 27. Pobre habitação que tão desprezível proprietário possui.  


sábado, novembro 22, 2025

Sábado, 22.

Do que se fala é do encontro Trump, Mohammad bin Salman, Ronaldo na Sala Oval. Que trio qual deles com o ego mais inflamado e juntos na mira dos biliões que compram não só aviões como a consciência de cada um. 

         - Fui a um supermercado, julgo de origem espanhola, que abriu aqui perto. Interior convidativo, espaços largos, montras bem apresentadas e uma vasta zona dedicada à alimentação pré-cozinhada que virou moda nestes tempos sem tempo.  Um horror! Não há fiscalização que nos possa garantir que tudo aquilo se pode comer sem perigo para a saúde. Dou o meu exemplo. Eu sou muito cuidadoso com o que como e não gosto de comer. Detesto ir a restaurantes e muito menos manducar aqueles pratos que se devoram com a vista, mas que o estômago abomina a mixórdia que a indústria acrescenta. Assim, muitas vezes para o jantar, tenho o hábito de passar no C.I. e comprar umas empadas de galinha que acompanho com arroz ou legumes cozidos, coisa simples para quem não quer deitar-se a conviver com o jantar no estômago. Contudo, há uns tempos, comecei a acordar com uma espécie de azedume, uma aspereza na boca do estômago, que normalmente passava quando tomava um copo de água. Mas era desagradável e às vezes parecia arder. Pensei que só podia ser das empadas. Deixei de as consumir por uma semana e o mal-estar desapareceu. Quis certificar-me e tornei ao C.I. em busca da facilidade alimentar e logo a coisa voltou.  Conclusão: não, não, não. 


sexta-feira, novembro 21, 2025

Sexta, 21

Estou de regresso. E para enterrar ainda mais a Ministra da Saúde a quem se deve todos os males de que enferma o SNS. Mesmo este que soubemos há dias. Ou antes, mais este. Médicos do serviço de Dermatologia receberam para cima de 200 mil euros entre 2024 e 2025 utilizando os métodos do costume. Afinal, bem vistas as coisas, dinheiro não falta, o que falta é honestidade, fiscalização e deontologia de que certos clínicos, pelos vistos, carecem. Mas ninguém dos sindicatos e das associações que os protege se chegou à frente para, pelo menos, lamentar. 

         - Outra tragédia de corrupção que não sei como classificar, ocorreu em Cortegaça, numa USF, onde uma trapaça gravíssima praticada pelas funcionárias ao legalizarem de forma fraudulenta no SNS pelo menos 10 mil imigrantes do Brasil, Paquistão, Índia, Argélia, Bangladesh e passo, abalroando o já decrépito sistema de saúde. Não contentes, ainda lhes passaram o Carão de Saúde que lhes permite terem internamentos e consultas, operações e medicamentos gratuitos nos países europeus. Conclusão: uma boa parte já abandonou Portugal e distribuiu-se pelos países da UE. Quem em primeiro ganhou com este escândalo, foram as redes criminosas que chupam ao imigrante o que ele tem e não tem. Quanto às funcionárias, foram detidas e logo libertadas. 

         - Falei dos nossos queridíssimos médicos tarefeiros. Pois bem. De repente, num volte face que só eles sabem a origem mas eu suspeito, querem negociar com a ministra. Ponto final nas greves que paralisavam as urgências, nos custos à hora, nos raios e coriscos; agora, de súbito, o que almejam é integrar o Serviço Nacional de Saúde! E esta, hein! Daqui se depreende o extraordinário trabalho de organização, de combate ao desperdício, reestruturação das unidades hospitalares, de fiscalização à fraude, da batalha à dignidade dos cidadãos, do interesse em manter o SNS sadio e ao serviço da comunidade. A esquerda, confrontada com o excelente labor da ministra, diz que o Governo quer acabar com a maior conquista do 25 de Abril. Esta gente, nem se deu conta que a modernidade e evolução das situações está a acontecer diante dos nossos olhos – permanecem ainda no obscurantismo fascista.

         - Daí as greves como arma de arremesso. Hoje foi dia delas sendo fim-de-semana. A Intersindical, com os seus suponho nem 5% de associados, subordina dois milhões de trabalhadores que são os que sofrem com os seus luxos de duplos fins-de-semana de lazer. Nunca a revisão do direito à greve foi tão urgente, de modo a dar sentido a uma arma que não deve ser manobrada por partidos ideologicamente minoritários. 

         - Ontem, quando passei no número 77 da Rua Pinheiro Chagas, no prédio onde viveu o meu saudoso amigo Alexandre Ribeirinho, parei para murmurar um Padre Nosso em sua intenção. O Joaquim, vendo-me imóvel, incentivou-me a prosseguir caminho. Não tive coragem de lhe contar a razão daquele compasso de espera. 

         - Ao serão de ontem, acesa a lareira, desligado o televisor depois das notícias da SIC, mergulhei no Diário póstumo de Julien Green. Momentos indizíveis. Li 20 páginas naquele corpo de letra pequeno, impresso sobre folha de bíblia, de que os meus olhos sofreram sem pestanejar. Mas não vou continuar neste desassossego; tentarei saborear linha a linha, pensando e repensando em tudo o que me passa debaixo dos olhos, permanecendo com o meu autor o máximo tempo de modo a percorrer o amplo e precioso volume com vagar. Logo nas primeiras páginas, não obstante os 60 anos, Green prossegue a luta entre aflições emergentes sexuais que ele entende desagradam a Deus. São Paulo desgraçou-nos a vida com as suas obsessões carnais. A Igreja de hoje tende a afastar o pecado do amor e a reintegrar o prazer do sexo como qualquer outro arbítrio de Deus. Eu percebo que este é o drama de qualquer homossexual cristão e foi o dele que declinou o prazer de olhos postos em Jesus Cristo.  “Peccato di carne non è peccato” dizia o padre Bruno de Jesus-Maria. 

         - Faz frio. Vou acender a lareira, fechar as portadas e meditar diante do fogo. 


quinta-feira, novembro 20, 2025

Quinta, 20.

A gente lê mas já não se espanta. Até porque tudo o que veio a lume nestes dois últimos dias, só pode ser culpa inteira da Ministra da Saúde. Assim, resumindo porque a escumalha deve ocupar pouco espaço nestas linhas, temos o nosso querido SNS numa completa rebaldaria que agora (como se antes o não soubéssemos) abriu as suas asas corruptas e oferece-nos o esplendor de crimes sobre crimes, abrangendo todas as classes com ele relacionadas: clínicos, enfermeiros, assistentes sociais... Ponho de lado os médicos prestadores de serviços que me espantou a sua derradeira vontade, falo do esquema da médica endocrinologista Graça Vargas e do seu companheiro advogado (encosto que lhe veio mesmo a calhar). Os dois (e outra médica) são suspeitos dos crimes de burla qualificada e falsidade informática. Quem a abordasse preocupado em emagrecer, sua excelência receitava os medicamentos próprios dos diabéticos: Ozempic, Trulicity e Victoza. A consulta custava 160 euros e teria de ser liquidada em dinheiro ou cheque, as seguintes 140 euros. Entre 2014 e 2025 o esquema defraudou o Estado, isto é, todos nós em mais de 3 milhões de euros.  A PJ completará mais tarde o quadro triste deste roubo de que, naturalmente, teve a cumplicidade da ministra Ana Paula Martins.

         - Nem a Ordem dos Médicos nem aquela senhorita que fala esganiçada em nome dos médicos, se apresentaram a censurar os colegas envolvidos neste e noutros roubos de que falarei amanhã. É claro para mim que a actual governante da saúde, sempre foi competente, tenaz, grande trabalhadora, honesta e não tenho mais adjectivos para a louvar e agradecer todo o aturado e persistente trabalho. Ela está a fazer limpeza à nojeira que vem da governação socialista e, por isso mesmo, a esquerda e a direita do brejeiro Ventura, exigem a sua demissão. Espero que varra os gatunos e gananciosos que engrossam o mundo político ultra-corrupto que nos contamina a todos. 

         - O pobre do Joaquim a quem faleceu há pouco tempo a mulher, teve que calcorrear a cidade do Corte Inglês onde estivemos a trincar coisas saborosas e decerto pouco aconselháveis à saúde, à Livraria Francesa. A distância não é longa, mas não sei o que me deu, que o arrastei para  o metro e depois de me ter enganado a mudar de linha, de seguida a empreender um longo caminho, cheio de hesitações, sem falar nas estações de Metro com elevadores, escadas rolantes, tudo em desuso, num marimbando divino para os passageiros que pagam cada vez mais caras as viagens. O Metro é o retrato fiel dos serviços públicos. 

         - Acendi a lareira pela primeira vez este Outono. É aqui, diante do fogo sagrado, que iniciarei as 1200 páginas de Toute Ma Vie de Julien Green.


quarta-feira, novembro 19, 2025

Quarta, 19.

Ontem fui ao encontro do João e do Zé à Bertrand. Ao fundo da livraria, no pequeno café descomplexado, estivemos para cima de uma hora a discutir o quê? Isso mesmo. Não há forma nem jeito de me entender com o João, estando eu nos antípodas dos seus mundos ternos, unidos ao proletariado querido, protegido pelas teorias marxistas-leninistas do trabalho e da condição de felicidade estabelecida nos manuais que ele hauriu até ao tutano. Ainda que aquela filosofia esteja ultrapassada pela evolução social e não seja possível prescrevê-la como impunha o século XIX, e posteriormente destruída pela autoridade soberana de ditadores desumanos e superpotentes, para quem a nomenclatura disciplinava e subjugava como qualquer outra escravatura, não obstante essa constatação hoje admitida e rejeitada, João prossegue a sua reza que já ninguém tem pachorra para ouvir. Personagem sui generis este meu amigo. Ao fim de uma vida, ainda não entendeu que a História desdobra-se em histórias onde cada historiador acrescenta um parágrafo, um capítulo da sua imaginação e bafagem ideológica. Dali fomos almoçar ao Príncipe onde não entrava seguramente há mais de cinco anos. Lá encontrámos o Carlos Soares, o Alexandre e o Paulo Santos senhor absoluto desta reunião. 

         - Descemos o Chiado e fomos direitos à Câmara Municipal e mais adiante ao Ministério da Marinha para assistirmos à conferência do catedrático Paulo Santos sobre João Pedroso o pintor do século XIX que ao mar dedicou a vida. Muito interessante, sala cheia de personalidades – majores, almirantes, cadetes, coronéis, gente da cultura e amigos – que o escutaram com interesse e estima, ele que não fez carreira na Armada. A palestra foi bem articulada, cronologicamente rica, ilustrada com telas do mestre, algumas, sobretudo a partir de 1870, de um modernismo, sensibilidade e beleza impressionantes. Aquela palestra, antecede a publicação do livro que o ensaísta quer dedicar ao pintor romântico e eu vi e li passagens trazendo com a sua aturada pesquisa novas formas de conhecimentos da obra e da vida do Mestre.  

         - Tarde, com a noite já colada à cidade, sob o comando do João que tendo nascido lá para o Norte, conhece melhor os recantos, becos e vielas que o lisboeta de gema que eu sou. Ou que fora. Porque ao tergiversar até ao metro, a quantidade de restaurantes àquela hora atulhados de turistas, o movimento intenso da Baixa, eclipsava a minha memória traduzida num espanto, num desgosto sem mágoa, num olhar fugitivo pelas fachadas dos velhos e perduráveis prédios, embasbacado com a fauna barulhenta, pelintra, que por ali se quedava noite dentro. O frio e uma certa humidade, caía sobre a cidade multifacetada, sem pátria, sem legítimos proprietários, suspensa do rumor que intriga, absorve, faz medo e perde a identidade que sempre fora a minha, que sempre fora a sua. Quando meti a chave à porta, rejubilei – a minha cidade está inteira dentro destes muros que me abrigam e protegem - Lisboa escondeu-se aqui. 

         - Telefonaram-me da Livraria Francesa a dizer que Monsieur Green tinha chegado, irei ao seu encontro amanhã. 


segunda-feira, novembro 17, 2025

Segunda, 17.

O hediondo crime já era conhecido e julgo que até foi abordado num filme, hoje apartando da fantasia, voltou à ribalta da informação para deixar estupefactos milhões de pessoas em todo o mundo. Falo dos “safáris humanos” praticados durante a guerra (1992-1996) na Bósnia-Herzegovina. Decerto com o conhecimento do sinistro Radovan Karadžić condenado a 40 anos de prisão e do Exército, multimilionários foram convidados a fazer“tiro ao alvo humano” das colinas em redor de Sarajevo. O convite, como o de qualquer espectáculo, ia de 80 a 100 mil euros, podendo ser mais elevado se fosse uma criança o alvo e gratuito um infeliz dum velho. Para este crime sem perdão, precipitaram-se snipers americanos, russos, italianos, espanhóis, franceses e ingleses diz-se com o apoio da extrema-direita. Seja como for, honra seja feita ao escritor e jornalista Ezio Gavazzeni apoiado pelo ex-magistrado Guido Salvini e pela ex-prefeita de Sarajevo Benjamina Karic que denunciaram os asquerosos e inumanos actos. Msis uma vez, actos destes levam-me a não descrer da humanidade.         

         - A botija de gás que o ano passado custava 35 euros, hoje despendi 40 euros. 

         - O dinheiro que damos a quem nos aborda na rua de mão estendida, é o investimento mais lucrativo que nenhum banco oferece. 

         - As sombras se as olharmos com atenção e tempo, dizem-nos tudo o que IA nunca dirá - contam-nos o nosso passado, o nosso presente e o nosso futuro.  

          - Para registo. “Como falar da ressurreição num mundo onde os excluídos são carme para canhão.” Fr. Bento Domingues.  

         - A efabulação é em mim uma doença, um estado de ebulição, um murmúrio, um sentimento de desistência a tudo o que me rodeia

         - Por favor de Sousa não te ausentes do país que te viu nascer ainda que dele já pouco ou nada reste. Somos presentemente uma sonora gargalhada, uma palhaçada novo-riquismo que alastra por todo o lado e nos faz rir e nos entristece e nos humilha e nos paralisa a imaginação; onde tudo o que é reles ganha dimensão, onde o bafio impera e a caridade é proibida. Quem verdadeiramente somos está na fotografia do Ferrari apossado pela Polícia de Lisboa a princípio a um candongueiro de droga, e agora ao proprietário real que o quer de volta cumprindo a sentença do tribunal que o diz seu único proprietário. Um Ferrari para a Polícia, só no país saloio que somos. 


 


sábado, novembro 15, 2025

Sábado, 15. 

Não tarda este sítio de sossego e beleza natural, ficará transformado num bidonville brasileiro, como outrora existiram em França os bidonvilles portugueses. Felizmente que estou recuado e tenho espaço suficiente para não ter por perto esta triste e indigna forma de vida. Todos os espaços dantes impossibilitados para construção, são hoje a invenção do sortilégio dos contentores de navio transvertidos em “casas”. O mais curioso, é este ultraje humano acontecer numa câmara há muitos anos CDU. 

O murete branco está perfeito, mas a vivenda...

         - Sócrates possui a arte de manobrar tudo e todos. A sua obsessão pela inocência, leva-o a inventar toda a sorte de estratagemas para que os processos de que é acusado por crimes vários, caduquem. O seu estimado advogado, renunciou ao processo e agora este vai andar por ai a vaguear, seguido pelo riso escancarado do ex-primeiro-ministro de Portugal. E contudo, que pode a justiça se a corrupção é endémica e não há tribunais que acabem com ela.   

         A política entre nós, não é só a forma que os políticos encontraram de se guerrearem continuamente, é também o modo de se conservarem à tona deles mesmos. Portugal, os portugueses, os seus reais interesses e necessidades, a erradicação da pobreza, habitação, escolas, hospitais, tribunais, esquadras em condições onde não entre a chuva como aconteceu nestes últimos dias, serviços céleres, saúde competente, são temas que servem sempre para a guerrilha, a bajulação entre eles, a revolta e o ódio, mas nunca, desde o 25 de Abril (talvez só nos três primeiros anos) um independente e sério serviço à nação e a quem cá nasceu e vive. Digo tudo serve e assim é. Veja-se o caso da lei da imigração. Nunca os pobres que desarrumaram a vida para procurarem melhor presente e se possível futuro entre nós, foram tão expostos à confusão, à balbúrdia, à desumanização e hostilidade, como agora. Não há forma de um diploma, uma lei obter consenso político, porque a política entre nós é uma guerra permanente seja quem for que ocupe o poder. A este propósito permito-me extrair estas linhas do artigo de António Barreto no Público, com o título “Quanto vale ser português?”  “O descontrolo da imigração (remeto eu para António Costa as linhas que se seguem) é uma abdicação do Estado de direito, o convite ao subterfúgio ilegal, à residência fictícia, ao mercado de endereços falsos, à prostituição de mulheres, homens e menores, à associação criminosa em geral.” A coluna termina assim: “Os criminosos castigam-se com a justiça, não com a nacionalidade (directo a Ventura).”  

         - Ontem tive uma barrigada de Lisboa. Não tivemos assento na Brasileira, João e eu, devido ao temporal que sarapantou os turistas da esplanada para o interior do café. Descemos então o Chiado e fomos abancar na Fnac, Ali encontrou o João a tribuna parlamentar que tanta falta lhe faz. Não sei a que propósito, falou-se de Lenine e eu perguntei-lhe se conhecia o período em que o revolucionário viveu na Suíça. Que fui eu dizer! Logo o tribunicius se soltou, abriu os braços, e despejou, feliz, tudo o que conhecia do ditador. Eu senti que ele precisava de falar e pouco ou nada interferi, talvez lhe tenha dado o pormenor da estadia do líder russo e sua mulher, em casa de um sapateiro onde ambos estavam hospedados, fazendo uma vida de pobres, ele tisico, mas forte, saindo todos os dias imperativamente de casa pelas nove horas directo à biblioteca e depois do almoço repetia a dose até ao fecho. Lia muito, lia tudo, impregnava-se de Marx e Engels, ninguém sabia quem ele era, todos o olhavam como a um pobre devido ao seu aspecto andrajoso, isto durante mais de uma década. Depois contei-lhe a chegada à Rússia, impelidos por Gorky “Venham todos, juntem-se à nós”. No comboio onde seguiam outros dirigentes que com ele desertaram do país dos czares e gritavam pela revolução, à sua chegada a solo pátrio, os camaradas deixaram-no e abalaram para abraçar amigos e familiares como é natural e legítimo; Vladimir Ilich Uliánov Lénin, depois de ter comprado uns sapatos decentes desfazendo-se das horríveis botas rotas, foi ao encontro do edifício onde se imprima o Pravda e logo ali começou a deriva que conduziria à Revolução Vermelha, e por volta de 1919 (suponho, sou fraco em datas) aliciou os incautos e semeou a exterminação e conduziu a Europa à instalação do bolchevismo. De resto, este chegou mesmo a instalar-se na Alemanha, Itália, Baviera, e Munique que proclamou-se República Soviética. Isto ao meu interlocutor pouco interessa, começando um rosário de razões ideológicas que são infinitamente mais importantes que os aspectos humanos das pessoas. No final do seu longo monólogo, rematei: “E assim nasceu a ditadura.” Psiu, nem uma palavra. Calou-se ele, falo eu. Com Lenine, no mesmo comboio, regressavam, entre outros, Zinósviev e Radek e igualmente Kámerev e Stalin que olharam o ilustre revolucionário com um misterioso riso – em Vladimir Lenine aconteceu a revolução; nos dois cúmplices a mais feroz ditadura e milhões de russos mortos. 

        - Bom. Chove. 


quinta-feira, novembro 13, 2025

Quinta, 13.

Desta vez acordei sacudido pelo vento forte, chuva grossa, trovões e relâmpagos. Embalado pelo rumor da noite, voltei a adormecer para acordar pelas sete horas. Pus o ouvido à escuta, tombei para o lado e embrulhei-me na doce melodia que persistia à minha janela. Daí a pouco pensei no Black e decidi levantar-me e ir saber dele. À porta da cozinha chamei uma e das vezes e do gato nada. Quando estava a terminar o pequeno-almoço, preocupado, voltei a abrir a porta e a gritar por sua excelência que logo apareceu saltitante e resoluto a miar desalmadamente, enxuto.  Comer para ele é uma festa e de seguida sem pedir licença correu para o salão e refastelou-se no seu sofá para uma soneca de várias horas. Entretanto, toda a manhã o temporal reinou soberano lá fora. Como os trovões eram medonhos e sentia-os em cima do telhado, decidi não abrir as portadas para não convidar os relâmpagos a entrar. Felizmente, por aqui, nenhum desastre ocorreu. 

         - O mesmo não se pode dizer de outros lugares. Por uma questão de respeito, manda o temor, que registemos o nome da víbora: Cláudia. A donzela expandiu a depressão por todo o país com particular raiva em Setúbal, Santarém, Lisboa, Caldas da Rainha. As autoridades assinalam mais de 400 ocorrências e um casal de idosos faleceu submerso na água que entrou pela dentro da casa, em Fernão Ferro. Barras e escolas estão fechadas. 

         - A culpa é sempre da Ministra da Saúde, sindicatos e federações, associações e Ordem dos Médicos exigem que Ana Paula Martins monte o seu gabinete, por exemplo, no hospital Santa Maria. Nunca os vejo a censurar médicos e administradores hospitalares, directores de serviços e médicos quando desorganizam os planos cirúrgicos, faltam nas Urgências, misturam os seus interesses de modo a que trabalhem menos nas horas normais para receberem horas extraordinárias aos fins-de-semana, à noite, enfim, fora dos horários regulares de funcionamento. O SNS está transformado em qualquer coisa que não tem nada a ver com o cidadão, com o doente, com aquele que não tem capacidade económica para ir aos privados que pululam por todo o lado, que paga os seus impostos para ter cuidados de saúde, pelo menos, razoáveis. O dinheiro abunda e quando ele é muito os gananciosos deitam-lhe a mão. Conhecemos o roubo de 800 mil euros e agora, envolto em serviços, não direi furto mas é pelo menos abuso imoral, retrato de como se encontra o SNS. Miguel Alpalhão, segundo os jornais, recebeu desde 2023 por cirurgias dermatológicas no Santa Maria e num período em que estava de baixa, 140 mil euros em quatro sábados. Mas há mais: Desde 2021 e até 2024, ganhou a módica quantia de 700 mil euros por 22 dias de trabalho adicionais. É a ministra que tem a culpa deste milionário ser escravo do dinheiro ou ter sido delegado pelo director do Serviço de Dermatologia a responsabilidade de completar as escalas das operações? Toda esta bagunça, vem da governação assustadora de Manuel Pizarro. Eu sei. No atropelo do tempo e dos crimes de toda a ordem, temos tendência a esquecer, até para bem da nossa saúde mental. 

         - Há dois dias que não saio de casa. E no tanto, não parei um minuto com os afazeres habituais. 


quarta-feira, novembro 12, 2025

Quarta, 12.

Dos finais do século passado até ao presente, a emancipação das mulheres foi o facto mais impressionante que aconteceu e para o qual poucos homens estavam preparados. Daí que cada vez mais eles se espantem, depois tentem domá-las e por fim agredi-las e matá-las. Entre nós e por todo o mundo, as estatísticas falam por si. E no entanto, pensando bem, pergunto-me se não está por detrás de tudo isto a imposição moral e cívica que nos remete obrigatoriamente para o matrimónio, ainda que nem todos, elas e eles, estejam vocacionados para tal. In illo tempore, acreditava-se que o casamento pela Igreja era a forma de o conservar para a vida, porque abençoado por Deus. Nestes tempos em que o Criador foi substituído pela ganância e o dinheiro, é lícito inquirir se uma tal norma deve continuar independentemente de o amor e o sexo inicial estarem mortos e enterrados e nem a amizade pura subsistir. Claro que para o Estado é verdadeiramente importante que ele continue, pois é sempre mais difícil dominar um solitário que o conjunto de duas pessoas que seja. Antes, nos tempos do namoro, a Igreja impedia qualquer contacto sexual, hoje o namoro segue direito à cama e é a partir daí que se vê se a coisa tem pernas para andar... Talvez estejamos ainda numa fase de adaptação a novos moldes de vida a dois e daí, muitas vezes, assistirmos ao exagero das mulheres em muitos pontos íntimos e sociais. Contudo, para mim a formulação tem razão de existir porque a natureza humana está antes de todas as normas e conceitos e perdura sobre tudo e todos.

Decerto, foi desde que a mulher se autodefiniu e adquiriu liberdade e identidade próprias, que os homens, quero dizer os jovens de hoje, começam a sentir o seu território de domínio e subjeção a definir-se. Por isso, há alguns dias, uma rapariga contou-me aspectos que me surpreenderam. Disse-me ela que nas redes sociais transfundam as teorias mais estapafúrdias que se possa imaginar e a que os meninos aderem com convicção.  Querem eles recuperar o domínio sobre a mulher, gostariam de traçar a imagem da futura mulher, de modo a que só a cada um pertencesse o gosto, a elegância, os modos de olhar, o aspecto corporal e por aí fora. Por exemplo, segundo a minha conhecida, os jovens estão a impor a gordura e os lábios grossos que elas conseguem obter com a ajuda de esteticistas, baralhando o que até aqui se definia por beleza e saúde, elegância e arte. Na realidade, olhando bem, vemos cada vez mais jovens anafadas, de grandes olhos pintados, ar apalermado, e quando de mão dada com o seu mais que tudo, orgulhosas e abocanhadas – são a versão dos pantomineiros tempos modernos.  

         - Recep Tayyip Erdogan emitiu mandados de prisão por genocídio contra o primeiro-ministro Netanyahu e seus ministros, relacionados com a guerra em Gaza. Foi mais corajoso que todos os seus congéneres europeus. 

         - Hoje o temporal trouxe consigo o frio que se instala a pouco e pouco por toda a casa. Tendo estado largas horas a trabalhar à secretaria, outro remédio não tive que acender o calorífero a gás que tenho naquele espaço do salão. Em breve será a lareira e com ela a aceitação do Inverno. 

         - Forma de falar. Em verdade, longe vão os anos em que me levantava cedo e me enfiava numa roda-viva de afazeres. Agora não me ergo da cama antes das oito e às vezes mais tarde. Durmo contínuo e sabe-me bem o conforto do quarto, o silêncio que nele enaltece sobre todos os outros cantos da casa. Por vezes, as auroras trazem todas as frustrações, as hesitações, os supostos falhanços e a cabeça rodopia sem descanso e o terror desce obrigando-me a deixar aquele reduto maravilhoso que me embala na doce ternura das noites serenas e restauradoras.  


terça-feira, novembro 11, 2025

Terça, 11.

Ontem estive em Lisboa e fui à livraria francesa encomendar o volume 4 Toute Ma Vie de Julien Green. Fiz o percurso a pé entre o Corte Inglês e a rua onde viveu o meu saudoso amigo Alexandre Ribeirinho e voltei. Caminhada difícil devido a dores incapacitantes nos lombares. Almocei no restaurante panorâmico da loja e fiquei um bom bocado a saborear os instantes de paz que se seguiram. Havia pouca gente em todo o edifício, andar por andar, e nem fila para o restaurante coisa rara. A crise vai-se intensificando por todo o lado e estou convencido que crescerá no próximo ano com as consequências mundiais dramáticas em construção. 

         - Na ida, não tendo tido tempo para tomar café em casa, optei pelo pequeno comptoir da estação de Sete Rios. Quando me perfilei para encomendar o café, abeirou-se de mim um homem pelos trinta anos. Pensei que queria uma moeda, mas ele disse-me que não, que tinha fome, se eu lhe pagava qualquer coisa para comer. Frente à caixa perguntei-lhe o que queria, ele respondeu um pão de Deus. “E para tonar?” “Pode-me pagar um galão?”, disse com tal dignidade e doçura que senti a comoção a descontrolar-me. Quando ia a sair  tomado o café, ele diz-me em jeito de deus: “Deus lhe pague.” Portugal, o seu 25 de Abril, a sua democracia não encontrou em 50 anos este e tantos outros nossos irmãos que vivem num mundo esquecidos no fosso da indignidade. Os políticos do buraco do Parlamento ou das catacumbas das sedes dos partidos, não têm tempo para chegar à janela e ver o resultado das suas políticas. 

         - A justiça. Será que ainda existe, aqui e por essa Europa fora? Não, claro. Ou sim, mas sob a forma vergonhosa que expõe os veredictos favorecendo uns e outros segundo as suas influências e interesses, isto é, sem verdadeira justiça nem independência. O caso José Sócrates, é a vergonha mais palpável da sua ineficácia e incapacidade para julgar um ladrão que possui dinheiro para a fazer rabiar até conseguir a inocência ultrapassando os prazos legais para os julgamentos. Como o caso “Operação Influencer” que desde Novembro de 2023 ficou estacionado em qualquer apeadeiro do Ministério Público e onde António Costa consta. Ele que mandou aumentar os juízes em 700 euros mês, na convicção que assim seriam mais breves e honestos nas suas decisões. Bref.

         - Contudo, o descrédito nos tribunais, atinge também os povos da União Europeia. O caso Sarkosy é disso prova. Os cinco anos a que fora condenado com prisão firme, passaram depressa e ele já se encontra em liberdade, deixando para trás a sua célula de luxo, com todo o conforto de um quarto de hotel. É mais uma vergonha a significar que os poderosos têm a consolação não só dos seus crimes, como a fortuna da liberdade. As prisões estão a  abarrotar de “criminosos” que roubaram uma laranja aqui, um cogumelo ali, um automóvel nesta rua, uma carteira sem dinheiro do infeliz mais além. 

         - Fui à piscina. Hora e meia de natação, devolveu-me a agilidade que ontem me faltou e fez desaparecer as dores que me incomodavam. Fujo como o diabo da cruz dos medicamentos. Só os tomo quando estou num estado absoluto de incapacidade à dor e à vida tout court. 


domingo, novembro 09, 2025

Domingo, 9.

Aquela coisa idiota como tantas outras que o sistema americano possui e dá pelo nome de shutdown, foi feita para confrontos políticos mas não para as pessoas que há mais de um mês sofrem as suas consequências. Os pagamentos salariais por lá são feitos quinzenalmente, e hoje milhares e milhares de administrativos passam fome e muitos já se despediram dos organismos oficiais onde trabalhavam. São ao todo 40 milhões de americanos em situação aflitiva. Alguns, para não morrerem à fome, vendem os seus bens. Entretanto, para acudir aos necessitados, bombeiros, sociedade civil, militares e autarquias mobilizam-se para reforçar os bancos alimentares. Para Trump a culpa é dos democratas, para estes dos republicanos que querem bloquear os cuidados de saúde para imigrantes e o Obamacare. 

         - Maria João Pires dá hoje uma excelente entrevista a Pedro Boléo no Público. Diz ela que “não se toca piano com as mãos” e tem toda a razão. Também não admite que os interpretes alterem a partitura, embora aceite a interpretação pessoal de cada executante. Anunciou, recentemente, o abandono dos palcos suponho na sequência de um acidente vascular cerebral. Está, todavia, intacta. Lembro-me dos nossos tempos na Brasileira, a sua obsessão por um lugar onde pudesse realizar os seus sonhos musicais e aquele espaço, perto de Sintra, que um amigo meu lhe vendeu, e mais tarde a compra de Belgais, em Castelo Branco, que o Paulo Santos, então economista em Bruxelas, tentou ajudá-la, mas não conseguiu porque não havia contabilidade que respondesse ao primado da União Europeia. Fez oitenta e três anos, e desejo que o murmúrio da música persista dentro de si como catedral de beleza e repouso celestial. 

         - Acabei de falar com a minha querida amiga Annie no hospital na sequência de uma queda que lhe fracturou a bacia. Enquanto tomava conhecimento do acidente pelo Robert, ela insistiu que queria falar comigo e, num tom de voz vigoroso, disse-me que tinha caído e não se sentia nada bem. Disse-lhe que se pusesse boa porque gostava que fossemos juntos uma exposição em Paris no início do próximo ano. Inteirar-me-ei melhor esta noite com o marido.  


sexta-feira, novembro 07, 2025

Sexta, 7.

Se as coisas eram já complicadas no SNS, tornaram-se impossíveis com as empresas de tarefeiros da saúde. São organizações tenebrosas, que ganham milhões à conta dos escravos; uns bem pagos, caso dos médicos, outros explorados, os dos serviços. Contudo, relativamente àqueles, contorna-os a jura deontológica que os obriga a serem mais sérios – até pela escolha profissional que fizeram – nas suas atitudes. A medicina é uma actividade de raiz das mais humanas, que não pode ser exercida de ânimo leve, no rigor de horários de funcionário público, misturando interesses de ordem vária, ambições ridículas, promoções guerreadas, jactância e arrogância. Também não é um produto, mas sim a dedicação inteira às vidas que se lhe entregam na confiança e devoção da interpenetração que afasta a dor e o sofrimento daquele que a morte espreita através do milagre do clínico que, com a sua arte, a aparta. Suponho que os médicos sejam obrigados ao juramento de Hipócrates quando entram para a respectiva Ordem. Portanto, devem saber que um dos juramentos é consagrar a vida ao serviço da Humanidade e outro, entre tantos, é não fazer uso dos seus conhecimentos médicos contra as leis da Humanidade. Pergunto-me se o comportamento esclavagista do dinheiro, não vai contra o juramento que decerto celebraram na Ordem dos Médicos.  

Dito isto, é evidente que não se lhes pede sejam, na sua imensa dimensão humana, a imagem de João Semana. Mas que compreendam que o mercado e os seus valores, até pela sua própria condição humana, não devem ser trampolim de manobras económicas no oposto à dignidade e esforço científico. Este egoísmo, esta obsessão pela riqueza, está a ser manobrada pelos grandes interesses que só têm no dinheiro a sua existência e conceptualização. Tudo o resto lhes escapa: o outro enquanto pessoa, a medicina como função de vida e abrandamento do sofrimento, a Humanidade como realização colectiva, o doente no seu abandono à dor, a parturiente entregue aquele instante de magia, a morte inevitável que muitas vezes acontece nas suas mãos, enfim. o respeito que lhes deve merecer a condição humana. É por estas e muitas outras razões, que a Medicina possui a grandeza e o milagre de acolher a vida e estar no derradeiro suspiro humano. 

É por estas razões que não dou razão aos médicos que, tal como quaisquer candongueiros, servem-se do WhatsApp para convocar greve à doença e ao sofrimento alheio, às urgências e às cirurgias, num país tão flagelado por tantas desgraças e triste pelo abandono a que fora votado desde a desordem implementada por António Costa apoiado pelo actual Presidente da República. Toda a minha admiração e agradecimento vai para a Ministra da Saúde. Deus a lhe dê força para afrontar clubes de interesses nos hospitais públicos, na Ordem dos Médicos, nas instituições que ganham imenso dinheiro com a pobreza em Portugal, nesse parasitismo que se instalou por todo o lado e vai ser muitíssimo difícil de erradicar. Esta manobra dos médicos tarefeiros, é contra os colegas, contra as instituições, contra o povo, a favor dos primados, da ostentação financeira entre clínicos, no desafio aos médicos que, honra lhes seja feita, ainda vêem na medicina pública a guardiã, o primado da ciência e entrega ao outro enquanto missão e respeito pelos princípios hipocráticos. Se no fim-de-semana da greve morrer algum nobre português por falta de assistência, os tribunais deviam condenar aqueles que renunciaram ao trabalho, mesmo pagos ao dobro dos seus colegas. Mais uma vez, reclamo que os futuros médicos sejam obrigados a permanecer nos hospitais do Estado cinco a dez anos após a formatura, de molde a compensar o país do montante que neles investiu.  


quinta-feira, novembro 06, 2025

Quinta, 6.

O tempo melhorou consideravelmente. Ontem, mal tinha saído do comboio e me preparava para pegar no carro de regresso a casa, caiu uma tal carga de água e relâmpagos que me susteve por um tempo na estação. Assim que abrandou um pouco, ao volante, de novo chuva e vento fortes que me deixaram paralisado ao portão à espera que abrandasse. O pobre do Black esperava-me cheio de fome, era já noite, e ele miava sem perceber a razão que me levara a não deixar a viatura. Uma hora antes, na desordem que é hoje Lisboa e as suas estruturas urbanas, fiquei preso no metro mais de meia hora e para alcançar o fertagus, tive que tomar um táxi, atravessar a cidade e embarcar na Avenida de Roma. Centenas de passageiros nas gares, nenhuma razão apresentada pelo Metro. As pessoas não contam para nada na democracia de hoje.   

         - A EDP vai, enfim, ter de pagar mais de 300 milhões de impostos pela venda de seis barragens, em 2020. Esperta, tentou escapar, criando o artifício de reestruturação empresarial através de uma cisão de empresas. Deixa cá ver se me lembro quem estava a dirigir o país no ano desse negócio chorudo. Quem era, quem era, ah, pois claro era o tal que adora a vidinha airada em Bruxelas e pavonear-se pelo mundo inteiro. Chut, não se fala em nomes, não se pessoaliza ninguém. Deixei-me, todavia, por uma vez, elogiar a menina do BE, de seu nome querido Mariana Mortágua, que se insurgiu no Parlamento contra a atitude que prejudicava não só o erário público como as autarquias em favor dos acionistas. 

         - Os nossos queridos comentadores. Como poderíamos nós viver sem eles, sem a luz que dimana das suas límpidas teses, dos subterfúgios que utilizam, da sabedoria que reina sobre a maior neutralidade. Agora, sem darmos por isso, há uma nova geração que está a abancar pelos canais televisivos. Coitados, são a raiz da sua precedente, sem tirar nem pôr. Lá para trás, na nuca daquelas cabeças doiradas, abriga-se um sopro que ao oxigenar o interior, ver-te a mesma comoção, os mesmos significados, os mesmos qualificativos, ipsis verbis, que ouvimos durante décadas e deles nos enfastiámos até à raiz dos cabelos. Servem patrões escondidos, que lhes alimentam o ego e a conta bancária, oferecem o corpinho e a carita laroca à imagem perturbada pela palavra que não sai ao seu jeito e se embrulha na desfaçatez. Para eles os 6 por cento que somam o BE e o Livre são mais importantes e decidem do nosso destino que todo o fantasmagórico lote de partidos. 

         - Terríveis e dolorosas imagens que nos chegam dos confrontos no Sudão. Quem acode àqueles infelizes, estando o mundo inteiro inquieto com a guerra que pode rebentar a qualquer momento. Não há olhos, nem misericórdia para os infelizes que morrem como tordos desde 2023 na disputa do poder pelas duas facções rivais: as milícias tribais e Forças Armadas do Sudão, lideradas pelo General Abdel Fattah al-Burhan.

         - As rajadas de vento que por aqui passaram, atapetaram o chão de azeitonas pretas. 


quarta-feira, novembro 05, 2025

Quarta, 5.

O brouhaha que os socialistas e a imprensa a eles rendida fizeram com aquele que roubou malas nos aviões entre Lisboa e S. Miguel, deputado do Chega no Parlamento, não tem paralelo com este que assaltou adolescentes roubando-lhes dinheiro e passes sociais na cidade sadina, onde acabou de ser eleito pelo Partido Socialista à Câmara de Setúbal, Sr. Marco Costa, apenas sussurrado. Pois é, cá se fazem, cá se pagam. Verdadeiramente, o único partido digno desse nome onde nunca aconteceram misérias destas, é o Partido Comunista. Honra lhe seja feita. Pena aquela ideologia maluca de tudo e todos submeter. 

         - Dizem-me que a noite foi terrível de temporal. Eu só posso testemunhar a aurora tocada a rajadas de vento forte, chuva diluviana, trovões e relâmpagos. Apesar disso, fui a Lisboa e no intervalo dos meus afazeres, recolhi-me na Fnac para continuar a avançar no romance. Todos os minutos contam, com efeito. 

         - A campanha para a Presidência prossegue. Não perco o meu preciso tempo com isso. O pouco que me chega, não me dissuade da opção António Seguro. Os outros, todos, todos, todos, são sucedâneos do mesmo modelo que impera há cinquenta anos. Um horror insuportável. Na prática política, Seguro desde a sua saída do PS empurrado por aquele que agora se pavoneia em Bruxelas, e não fez melhor do que ele porque quem acabou por ganhar as eleições foi Passos Coelho, logo nessa altura se viu a dimensão humana do candidato a Belém: saiu silencioso, recolheu à sua vida anterior, não apareceu em comícios ou outras actividades políticas e só durante umas semanas cedeu à tentação de comentador político na televisão. Nesse entretanto, Costa criava aquela aberração que foi a “geringonça”. 


terça-feira, novembro 04, 2025

Terça, 4.

Vivemos numa batalha constante, numa guerra sem fim para a qual não demos o nosso aval. Aquela criatura que fala um português de chinelo, a quem os médicos entregaram os seus interesses, sempre esganiçada, marimbando-se para os desastres dos clínicos, serviços, direcções administrativas, que a corajosa Ministra da Saúde tem enfrentado desarrumando conluios, negócios, lembrando a uns e outros os deveres deontológicos de uma profissão que não se coaduna com o mero funcionário público, num confronto hercúleo que decerto vai perder muito embora haja da parte do PS algum bom-senso e da ex-ministra da pasta, Marta Temido, até o aviso que a coisa lá não vai com o despedimento da actual executiva, mesmo assim, o vozeirão da extrema-direita e da extrema-esquerda (como eles se entendem tão bem!) não desarma enquanto não virem uma pessoa competente e corajosa fora do barco do poder. Quem vai perder com todo este ódio somos todos nós, povo trabalhador e ordeiro, que necessitamos de ter saúde para encarar esta gentalha que nos saiu na lotaria da democracia. 

         - Outro dia, necessitando com urgência de um café, entrei num estabelecimento da Rua Alexandre Herculano chamado Copenhagen Coffee Lab. Pedi a bica ao balcão e ao balcão paguei em antecipação. “Um euro e cinquenta” diz-me a rapariga que me atendeu. “Será que estou em Paris ou Piccadilly Circus?” Ela exibindo um ar profissional: “Nós só temos café de lotes escolhidos topos de gama estrangeiros.” Tomada a bebida, chamei a empregada e disse-lhe que fosse enganar quem quisesse, mas aquele café era uma zurrapa, uma chicória inqualificável.” “Não temos culpa que não conheça os bons cafés.” “Talvez, respondi, mas estúpido é que não sou nem saloio.” E debandei, apressado. Estamos assim, somos isto. Mas não somos piores nem melhores do que sempre fomos, apenas, com tantos estrangeiros entre nós, ganhámos a impressão que somos superiores. As formigas com catarro, hoje são aos milhares. 

         - O anjo da guarda de serviço a esta pobre criatura, apresenta-se sem que eu o solicite provando que me vigia sem descanso. Assim, ontem, não pude arredar pé porque a bateria que tinha sido posta há um ano, pifou. Vai daí chamei o Sr. Oleh que prontamente apareceu com um ajudante e montou outra pela módica quantia de 30 euros. Tenho absoluta confiança nele, não só porque é ucraniano, ainda porque é honesto e competente como são todos os da sua origem que por aqui passaram. 

         - Depois do almoço reclinei-me na chaise longue para um soninho simpático. Antes tinha feito uma hora de natação sem parar, e daí que este corpinho esbelto tenha sentido atracção pelo descanso. Todavia, ao mergulhar no rio do sono, outro me esperava atendendo ao clima invernoso idêntico ao de Cambrai. Assim, fui embalado nas memórias dos invernos em casa da Annie, estendido no divã do salão escutando a melodia da chuva a bater na janela, a par da voz da minha amiga na cozinha, fui remando rio abaixo na consolação das lembranças que me guiaram ao doce conforto do repouso. 


segunda-feira, novembro 03, 2025

Segunda, 3.

Eu admiro a coragem, a força, a determinação de Ana Paula Martins, Ministra da Saúde. A esquerda, conluiada com a direita de Ventura, todos os dias, monta sobre ela para a derrubar, culpando-a de todos os males, fingindo ignorar que um misterioso comprimido paulatinamente a leva à morte: a luta diária dos extremos que acaba por favorece os privados e desgraçar a maioria do povo português que sustenta a Segurança Social. Ninguém se insurge contra os médicos que, sem aviso prévio, faltam às equipas médicas nas urgências, assim como o sistema técnico na coordenação com o INEM, os bombeiros que nem sempre actuam em rede, como pouca gente fiscaliza os utentes com direito a serem assistidos, mas enquadrados em esquemas internacionais que se aproveitam da gratutidade do SNS. Esta miséria, que nos condena à entrega a doenças, à falta de consultas atempadas, ao acompanhamento dos tratamentos, à morte e à infelicidade do fim, é obra da balda que se instalou com o SARCOV-2 e foi desenvolvida com a falta de competência e imposta por ideologias senis, dos que apoiaram o atendimento prioritário aos que chegavam em bando para serem tratados no nosso país, deixando o rasto de irresponsabilidade que hoje se vê de Norte a Sul já esquecido da desordem, do corre-corre do ministro de então, da negligência nos hospitais, das filas intermináveis nas urgências e do muito que ninguém falou porque não havia espaço mediático para tal. Registem: quem vier a seguir, será sacrificado na praça pública por um bando de irresponsáveis que só tem um fito: tomar o poder pela força do caos. Pôr ordem nas instituições deixadas para trás por aquele que se pavoneia nos grandes estrados internacionais, não é pera doce. 

          - Gaza regressou à desordem, a guerra que nunca parou completamente, recomeçou com mais violência de parte a parte. Netanyahu voltou a atacar o Líbano. Toda a zona é um calvário, o Gólgota dos infelizes que morrem em nome de ninguém. 

         - Ontem, com a Piedade, apanhámos uns quilos de azeitona para ser tratada e consumida ao longo do ano. Ouço na TV que este ano não há muita colheita devido ao tempo quente. No entanto, por aqui, as minhas oliveiras estão tão carregadas como nunca vi. Longe vai o tempo em que as varava e entregava o montante no lagar e deste recebia 50 por cento em azeite maravilhoso. Hoje, a nossa estimada UE, tudo proibiu em nome da saúde dos cidadãos e para riqueza dos latifundiários.

         - “A imaginação atreveu-se a saber mais do que sabe.” Frei Bento Domingues indignado com aqueles que pensam que a morte é o fim de tudo. 


sábado, novembro 01, 2025

Sábado, 1 de Novembro.

Não estou em mim. Depois de três meses de uma dificuldade absoluta em ver para ler, observar imagens ao longe ou simplesmente ver televisão, eis que, tendo entrado na loja do Chiado com o objectivo de exigir o dinheiro que gastei nos óculos pós-operação à catarata, sou recebido por um funcionário que aguentou o ímpeto da minha revolta e a transformou num competente exame corrigindo a progressão das lentes que tinha sido mal feita e me custaram dias e horas de sofrimento. Saí de lá outro, substitui inclusive a armação e no final tudo me foi dado gratuitamente. De quinta até hoje, querendo compensar o tempo perdido para a leitura e a escrita, dupliquei as horas e os serões ficaram mais dilatados, uma vez terminado o noticiário da SIC e não sendo eu amante dos dejectos televisivos, logo me entreguei às minhas actividades no repouso sereno das noites plenas de silêncio. 

         - Quinta-feira fui ao Centro de Saúde para uma consulta de rotina marcada com dois meses de antecedência quando antes bastava uma semana. A Dra. Vera Martins achou-me óptimo e também ela me disse estar com muito bom aspecto, mais novo e etecetera e tal. Vou fazer a habitual bateria de exames anuais e depois se verá se ela tem razão. Por outro lado, como sou refractário a medicamentos e continuo longe deles, tendo recusado vacinar-me, pedi-lhe que me receitasse Ben-u-ron para qualquer percalço e assim saí directo para o meu restaurante de outros tempos quando morava perto, no Largo do Rato. Apesar da chinfrineira (os portugueses falam cada vez mais alto seguindo a pouca educação dos africanos), consegui isolar-me e voltar aos tempos da minha comummente entrega aos dias lassos e longos da rotina citadina. É facto que voltei as costas à minha cidade de nascença, mas também é verdade que ela já não me reconhece nem eu a ela. Estamos de costas voltadas porque não consigo suportar o desamor que entretanto se instalou por todo o lado, a balbúrdia, o ar desarrumado que reina nas suas ruas e praças. Talvez uma saudade rasteira ainda me aborde quando caminho por aqui e por acolá, talvez no ar ainda impere o perfume da minha adolescência turbulenta, as memórias corridas pelo vento sacudam fantasmas e anjos, instantes e perigos, paixões e imprevistos, mas já não absorvo o ritmo descontrolado que foi o meu, querendo chegar a tudo, dos encontros imprevistos, às dores das exaltações abandonadas numa curva, num café, sob as árvores dos jardins, dos candeeiros, as corridas loucas entre Cascais e o Rossio. É verdade que nada disso morreu e em murmúrios muitas vezes recordo as noites acossadas e vazias, quando tornava a casa insatisfeito e dorido de sentimentos e falsas promessas, a imagem bela que tinha intenção de emoldurar e ficara esquecida na dobra da negrura, pisada pelas palavras mal balbuciadas, pelos ciciamentos de que a noite se apropriou, deixando-me ali, vazio e triste, sob o céu escuro onde o amor no momento em que se anunciara logo morria. 


quarta-feira, outubro 29, 2025

Quarta  29.

O Chega de André Ventura tem muita sorte com o propagandista da sua ausência de ideias, dos seus impulsos em momentos apropriados, das suas querelas mesquinhas, da oportunidade dos seus dichotes, esse divulgador chama-se Partido Socialista. Foi o partido de Sócrates, Costa, Santos Silva, Nuno dos Santos que lhe deram a fama e o proveito que hoje enche de orgulho o chefe chico-esperto.  

         - O furacão Melissa que entrou como um touro na Jamaica, tocado a ventos que atingiram 295 km/hora, fez estragos monstruosos no Sudoeste do país, reduzindo a nada extensas áreas de campo, derrubando árvores, casas, estradas, num rasto de estragos por todo o lado e mais de meio milhão de residentes sem energia eléctrica. Graças à competência do Governo que se preparou com eficácia para enfrentar o touro, até ao momento não há registo de mortes. O monstro dirige agora para Cuba. 

         - O Orçamento do Estado foi aprovado na Assembleia Nacional. Do que percebi, aquilo é toma-lá-dá-cá. Outra coisa não seria de esperar, num país sem investimento público e privado. A máquina administrativa é muito carregada e os seus 700 e tal mil funcionários sempre ávidos de melhores salários e muitas greves pelo meio. Daí que, no que toca ao SNS, a ordem tenha sido para cortar a eito nas despesas, mesmo que isso implique menos actos médicos - as famosas cirurgias fora do horário para aliviar as listas de espera -, gastos com medicamentos, contratação de pessoal clínico e prestadores de serviços...  Espero que a senhorita Joaninha da FNAM dê uma olhada ao OE e deixe de alimentar as fantasias e ambições dos seus arregimentados e enfrente a realidade do país. E já agora nos diga o que pensa dos 800 milhões de euros de fraudes no nosso pobre SNS. 

         - Prometeram-nos as trevas, a desgraça, mas o que tivemos por aqui foi um dia resplandecente de Sol e calor qb. Não deixei a casa e os arredores nem para ir lá abaixo ao portão ver se o carteiro tinha feito greve.  


terça-feira, outubro 28, 2025

Terça, 28.

Montenegro recusa aumentar as reformas mais baixas. Faz mal. Com essa posição engrandece o discurso da esquerda para quem os pobrezinhos são a moeda de troca mais apetecida e disponível. E no entanto, se o PS e todos os outros à esquerda tivessem a equidade em apreço, fariam a grande reforma na Segurança Social que há muito se impõe, a começar por estabelecer um tecto máximo e mínimo para as reformas, assim como alterariam a lei de quando as mulheres eram apenas donas de casa e não auferiam salário nem reforma, e hoje, por morte de um dos cônjuges, o outro herda uma parte da reforma mantendo a sua intacta. Para um tal acto, era necessário abalar os acordos instituídos por políticos que têm a suprema inteligência de cuidar de si em primeiro. E já agora, é insuportável que o Estado, quero dizer os nossos impostos, paguem cursos caríssimos aos estudantes de medicina, para logo depois, após autorização do exercício da actividade, partirem para o estrangeiro. 

         - Vladimir Putin, anunciou a concepção de um míssil Burevesnik, de impulso nuclear, com capacidade para alcançar 14 mil quilómetros. Trump respondeu ao amigo que melhor fora que acabasse com a guerra na Ucrânia que devia ter durado uma semana e já vai em quatro anos. E disse mais: “Nós não precisamos de tanto, uma vez que temos um submarino nuclear, o maior do mundo, bem perto da costa”, entenda-se russa.

         - Da análise feita pelo Tribunal de Contas Europeu, as firmas portuguesas pouco aproveitaram da “bazuca”. Havia 109 mil milhões de euros do PRR para melhorar as empresas nacionais, mas apenas um terço das reformas empresariais foram concluídas. O curioso, é que quem avaliou a gestão dos interesses financeiros da UE, foi o ex-ministro das Finanças de António Costa, senhor João Leão, hoje representante português do órgão independente com assento no Luxemburgo. Definitivamente, não nos livramos dele. 

         - Fui nadar à piscina municipal. Ao cabo de um bom par de meses, lá voltei a encontrar os mesmos velhotes gordos, sorridentes, a discutir nos balneários os candidatos a Belém. Acham? Ora, o que os apaixona são as eleições do Benfica, cada um puxando pelo seu favorito num calor idêntico ao do João quando discute política. A dado momento, aqueles corpos nus depilados pela idade, parecia que se criam desafiar à espadeirada. 


segunda-feira, outubro 27, 2025

Segunda, 27.

Não quero deixar passar. A senhorita Mortágua que dirigiu o Bloco de Esquerda nestes últimos dois anos, decidiu abandonar o cargo assim como o lugar na Assembleia. Foi o acto mais sensato e lúcido que alguma vez teve. Eu não acredito nestes grupelhos do tipo anos Sessenta, chiques pró caraças, arregimentados por gente da classe média e média alta, com tempo e condições para se entregar a todas as fantasias sociais, sindicais e políticas, sabendo de antemão que nunca alcançarão o poder: BE, Livre e a esposa dos cãezinhos. Porque são algraviados, a imprensa que temos, não os larga e faz deles representantes de partidos maioritários... mas nem assim o bom povo os elege.