Quinta, 11.
São muito curiosas estas greves que dão fins-de-semana prolongados, pagos, contra os desarranjos e prejuízos para a maioria dos trabalhadores do sector privado que fica sem ganhar por culpa dos “revolucionários” sindicalistas. Eu também não ponho a minha assinatura em alguns dos enunciados da futura lei, mas penso que seria necessário deixar chegar ao fim as conversações para ver o seu desenlace. Assim é um tour de force inútil que só serve as manigâncias partidárias. Por aqui, reina a animação. Tudo está aberto e os trabalhadores camarários e outros, gozam o dia em compras de Natal. Que país!
- Outro dia passei na Brasileira. Um dos moços simpáticos que servem às mesas, veio para mim e disse: “Sente-se, faça-nos companhia.” Por ali me quedei, com efeito. Entretanto, turistas ia chegando e ele, no seu inglês que para o caso mais não seria exigido, lá se ia desenrascando. Veio-me à memória aquela frase de Bismarck, o terrível chanceler austríaco: “O dom das línguas é um dom de empregado de café.”
- O Fertagus é sempre para mim a galera de observação. Quando cheguei à gare para obliterar o bilhete, encontro uma negra pequena de porte, nem gorda nem magra, de olhos esverdeados que me fixou num isto de interesse e desafio. Disse-lhe: “Estava à espera que a máquina não funcionasse!” Ela riu-se e disse: “Gosto de ver essa luz verde a acender e a apagar. – Que não seja por isso – respondi – pode aqui ficar até à meia-noite.” Nesse momento o comboio pára e eu dirijo-me para ele. Ouço, então, nas minhas costas: “Vai para onde?” Não respondi e entrei. No interior ela pergunta-me se conheço Foros de Amora, digo-lhe que não e ela, sem mais aquelas, convida-me a ir ao seu bairro. “É muito amável” e enfio os olhos no jornal. Reparo que ela não tira os seus de mim e quando chegou à estação, tornou: “Venha conhecer a minha casa.” Para não a decepcionar, atirei: “Noutra altura.”
- Outro dia o Jornal Público trazia este título: “O que me dá tesão no meu trabalho é eu ser o meu rato de laboratório:” Quem o afirma, é uma autora brasileira que pelos vistos tesão não lhe falta. Esta geração dos ditos escritores, cheios do talento de que o vazio os abastece, expõem-se à saciedade ao empolamento de si mesmos, como se a literatura fosse um meio de ser alguém surfando a onda da ociosidade dos tempos presentes.
- Às vezes, ao ligar o televisor, dou com um professor universitário que explica a nossa língua. A simpática personagem é cativante na forma e no conteúdo, mas surpreende-me quando diz: “Quais é que são...” Eu, não sendo catedrático, diria “Quais são...” pura e simplesmente.
- Temo que Zelensky tenha de capitular face aos EUA e à Rússia. Ele é a cópia de De Gaulle e o melhor estadista que o mundo tem. Mundo entregue a um monstro sem preparação para o cargo nem deontologia, abrasado pela loucura dos negócios como inspiração divina.
- Com esta beleza tive tudo o que quis. Por isso hoje, estando saciado, dou-me ao luxo de não querer nada.
