Sexta, 12.
Ontem
longo e caloroso almoço no Zé Varunca (que horror de nome!), Bairro Alto, com o
Guilherme, Mário (advogado), João. A cordialidade e simpatia entre nós foi de
tal modo contagiante que nem os apartes político-partidários do João conseguiram
arrefecer. A dada altura Corregedor pôs à nossa consideração as palavras
(infelizes) do Papa Francisco sobre o aborto, segundo o qual este não deve ser
praticado mesmo considerando o nascimento de um bebé com malformações e a
previsão de vida vegetativa. Redisse o que os meus leitores conhecem da minha
posição sobre o assunto, mas João parecia apostado em centrar a revolta no
bispo de Roma. O Mário interveio dando-me razão e apresentando a realidade tal
qual a pratica e vive um seu irmão pediatra. Reforço: para mim a legalização do
aborto, foi mais uma dessas cedências populares que os políticos (no plural,
meu amigo João) são useiros e vezeiros para se manter à tona da popularidade e
do poder, seguindo na cauda do “progresso”, esquecendo-se que este podia muito
bem ser praticado e ensinado antes de a mulher ter precisão de fazer a interrupção
da gravidez. Há tantos métodos clínicos para isso, que o aborto acaba por ser
pura ignorância e um atentado à vida. Para não falar da indiferença, do
analfabetismo popular, do sexo hoje praticado por puro prazer selvagem, seguro
que o que quer que daí resulte, a mulher pode escolher descartar.
- Na excelente tradução de Paulo
Osório de Castro para o livro de Daniel Mendelsohn Uma Odisseia, fez entrar duas palavras que eu, por mais que abra e
feche dicionários, não encontro significados: “climaces” e “convuduta”.
- Outro furacão com o nome de Michael chegado às costas do EUA,
atingiu uma tal ferocidade que reduziu a escombros a cidade de Panama City. Os
habitantes dizem nunca terem experienciado tal situação. O monstro veio lá de
baixo, do Golfo do México, desembestou todo o litoral: Geórgia, Carolina do
Sul, Carolina do Norte, Virgínia na direcção de Nova Iorque. Os cientistas não
se calam: tudo é fruto do aquecimento global.
- Fechei o Verão. Desnudei o lounge, os guarda-sóis nas suas
gabardinas, as cadeiras sob o alpendre, as almofadas na arca, e disse adeus ao
ar livre, às tardes serenas, às manhãs pulverizadas dos aromas das laranjeiras
e dos limoeiros, e reinstalei o Inverno primeiro no pensamento, depois na
emoção e por fim nas noites tocadas ao vento cantando às janelas fechadas para
o firmamento encoberto das nuvens escuras.
- Comprei o último diário de
Lanzarote. É José Saramago a falar-nos do fundo do disco rígido onde
modernamente se sepultam os mortos e de onde por magia da técnica se
ressuscitam.