terça-feira, outubro 30, 2018

Sexta, 12.
Ontem longo e caloroso almoço no Zé Varunca (que horror de nome!), Bairro Alto, com o Guilherme, Mário (advogado), João. A cordialidade e simpatia entre nós foi de tal modo contagiante que nem os apartes político-partidários do João conseguiram arrefecer. A dada altura Corregedor pôs à nossa consideração as palavras (infelizes) do Papa Francisco sobre o aborto, segundo o qual este não deve ser praticado mesmo considerando o nascimento de um bebé com malformações e a previsão de vida vegetativa. Redisse o que os meus leitores conhecem da minha posição sobre o assunto, mas João parecia apostado em centrar a revolta no bispo de Roma. O Mário interveio dando-me razão e apresentando a realidade tal qual a pratica e vive um seu irmão pediatra. Reforço: para mim a legalização do aborto, foi mais uma dessas cedências populares que os políticos (no plural, meu amigo João) são useiros e vezeiros para se manter à tona da popularidade e do poder, seguindo na cauda do “progresso”, esquecendo-se que este podia muito bem ser praticado e ensinado antes de a mulher ter precisão de fazer a interrupção da gravidez. Há tantos métodos clínicos para isso, que o aborto acaba por ser pura ignorância e um atentado à vida. Para não falar da indiferença, do analfabetismo popular, do sexo hoje praticado por puro prazer selvagem, seguro que o que quer que daí resulte, a mulher pode escolher descartar.

         - Na excelente tradução de Paulo Osório de Castro para o livro de Daniel Mendelsohn Uma Odisseia, fez entrar duas palavras que eu, por mais que abra e feche dicionários, não encontro significados: “climaces” e “convuduta”. 

         - Outro furacão com o nome de Michael chegado às costas do EUA, atingiu uma tal ferocidade que reduziu a escombros a cidade de Panama City. Os habitantes dizem nunca terem experienciado tal situação. O monstro veio lá de baixo, do Golfo do México, desembestou todo o litoral: Geórgia, Carolina do Sul, Carolina do Norte, Virgínia na direcção de Nova Iorque. Os cientistas não se calam: tudo é fruto do aquecimento global.

         - Fechei o Verão. Desnudei o lounge, os guarda-sóis nas suas gabardinas, as cadeiras sob o alpendre, as almofadas na arca, e disse adeus ao ar livre, às tardes serenas, às manhãs pulverizadas dos aromas das laranjeiras e dos limoeiros, e reinstalei o Inverno primeiro no pensamento, depois na emoção e por fim nas noites tocadas ao vento cantando às janelas fechadas para o firmamento encoberto das nuvens escuras.


         - Comprei o último diário de Lanzarote. É José Saramago a falar-nos do fundo do disco rígido onde modernamente se sepultam os mortos e de onde por magia da técnica se ressuscitam.