segunda-feira, abril 20, 2020

Segunda, 20.
Não me apetece escrever. Se o faço é porque trouxe o computador para a estrada alcatroada e estou estacionado em frente a Os Potes a seguir o trajecto do Nespresso que encomendei por telefone. São 14,05. Esta manhã estive a roçar o mato no jardim. Acordei tarde (7,45) com o rancho das mulheres de Zuckerberg debaixo da minha janela. Um sol aberto imperava sobre o bacelo já armado em adulto. Um quarto de hora depois de ter terminado, acabada a gasolina, arrumada a máquina, escovadas as calças e a camisola, lavadas as mãos, começou a chover com vontade. Sinto-me ainda apático, desmotivado, com os miolos a pensar no Matricida imobilizado algures num lugar inacessível. Sei que vai ter três capítulos: Princípio, Partida e Chegada.  Mas não estou certo que assim seja, como não acredito em nada. Se morresse agora, morria na indiferença de tudo, sem mágoas, e nem o que comecei por acabar me tortura. De todo o modo ninguém sabe o que deixa para trás, a vida verdadeira começa depois da morte, mas disso não daremos notícia, os dois mundos nunca se cruzarão. Sou tão frágil e ainda faço desta miséria força! Ou talvez não seja eu, física e intelectualmente, que enfrenta os dias, mas uma espécie de vontade enaltecida pelo rumor, pela dor, pela insatisfação de haver em mim um mundo paralelo em desacordo com o que me rodeia. Cai cinza do céu pardacento. O latir de um cão no quintal vizinho, é a única presença viva nesta estrada sem automóveis nem gente. O mundo está fechado, ninguém parece acreditar que haverá vida daqui a um ano. Tombam do céu pedregulhos na forma de vociferações, multidões esperam a morte e aos cemitérios chegam cadáveres solitários testemunhando imperiosamente que vamos morrer na completa solidão, cumprindo o ciclo enunciado: nasce-se só e só se morre. A vida foi uma curta viagem, um devaneio, uma ilusão, um sonho por cumprir...  Se Deus existe, só Ele pode dar sentido e densidade a isto a que chamamos vida e a ressurreição a junção do corpo e alma numa outra qualquer forma de vida que complete e dê dimensão e coerência ao Todo. A minha cabeça ferve de (interrompido, o estafeta acaba de chegar).

         - 16 horas e quarenta e seis minutos de retorno a casa. Ontem, domingo, tendo saído para comprar o jornal, deparei com um estabelecimento aberto com este curioso nome O Café da Sua Vida. Entrei de olhos alucinados na máquina de café. Quando o empregado pousou a chávena na mesa, e dela saiu em golfos  o aroma intenso que não respirava há mais de mês e meio, foi como na história de Proust, um mundo do passado veio sentar-se a meu lado e da taça irromperam as recordações das nossas conversas na Brasileira, os instantes felizes nas esplanadas do Quartier Latin, em Paris, os interiores confortáveis dos cafés de Viena d´Áustria, de Roma, de Veneza e ainda o ano passado de Cracóvia e Madrid, assim como as manhãs sossegadas a trabalhar no Café da Casa. Este universo, característico da Europa, lugar de convívio e ajuntamento de memórias, fazem parte de nós, são a nossa própria história, e, por isso, o nosso conforto e equilíbrio. Privarmo-nos dele, é talharmos um pedaço de nós, e reduzirmos as emoções ao vazio dos dias distanciados das pequenas coisas que são tão importantes ao nosso aconchego espiritual.

         - A entrevista de um tal Manuel Loff ao Público de ontem, é o exercício típico de uma certa camada pseudo-intelectual, uma pura idiotice.

         - No Brasil já de pede na rua o regresso ao regime militar, mas com Bolsonaro a comandar a tropa.

         - Não gostei de ouvir António Costa voltar à lengalenga do costume. Aquela de que o PS é o obreiro da boa conduta do governo na pandemia, é trazer para o discurso político a retaguarda do partido e, portanto, da politiquice. E injusta. Todos os partidos, à excepção do Chega, privaram-se das habituais questiúnculas para ajudar Costa e a sua equipa na difícil tarefa que montou sobre os seus ombros. Além de inútil. Os factos são o que são. Nada mais a acrescentar.

         - Cada vez mais conceituados cientistas inclinam-se para que o coronavírus tenha sido criado ou manipulado em laboratório chinês. Um regime tirânico e ditatorial, permite-se tudo. Até aldrabar o número de mortos como aconteceu recentemente acrescentando mais 1290 (só!) em Wuhan. Aliás, Emmanuel Macron, o primeiro a falar em guerra, diz que não é “ingénuo” quanto ao registo de mortes vindos da pátria de Xi Xinping pinp ping. Vou citar o Presidente francês: “Não sejamos tão ingénuos ao ponto de dizer que eles (Xi e o seu exército digo eu) foram muito melhores a gerir esta crise. Não sabemos. É evidente que há coisas que aconteceram e que nós não sabemos.” Está tudo implícito nestas palavras.


         - Hugues que vive a Taipé, e não dava notícias pelo menos há dez anos, mandou-me um e-mail inquieto pela minha saúde. Respondi que estava bem e o meu país um exemplo em matéria de defesa dos seus cidadãos. Mas ele replicou: “Aqui nenhum confinamento. Menos de 400 infectados e apenas 6 mortos, num país com 23 6000 000 habitantes.