Terça, 30.
Somos feitos de tergiversações, de
alçapões. No fundo não acreditamos em ninguém, o parceiro do lado está de olho
para nos sacanear. São tantos os exemplos que não chegariam várias páginas para
os descrever. Vou ficar-me por uma simplesmente porque não quero recordar
aquela que obrigou (continua a impor, suponho) os consumidores de água e luz antigos,
quando as respectivas companhias detinham o monopólio, a declarar se possuem os
contadores que durante anos elas alugaram cobrando, de forma habilitar as
famílias ao ressarcimento dos montantes surripiados indevidamente. Outra
armadilha nasceu na democracia recente. Falo das economias que milhares de
portugueses confiaram ao BES. Outro dia fui chamado ao banco para me
interrogarem se estava interessado em declarar o montante das acções que
detinha no BES de acordo com o que o Estado estabeleceu agora que vai declarar
a falência do mesmo. Apresentando-me como prejudicado, tinha chance de receber
algum no inventário dos credores. Disse-lhes: “Isso é ridículo e prova a má-fé
do processo. Ainda por cima porque desde logo me disseram que teria de contratar
um advogado.” A funcionária entupiu. Eu bravo, prossegui: “Não vou fazê-lo. Há
muito que deixei de pensar no dinheiro que infelizmente apliquei na
candonguice. Além de que o Estado sabe muito bem o que cada um de nós possui, e
se não sabe o banco com o toque numa tecla põe-no ao corrente.” Evidentemente,
com o tempo que o processo tem, já houve espaço para tudo: esquecimento, fuga,
baralhação de dossiês. Ninguém foi preso e ninguém será. Os “accionistas” são
os únicos prejudicados e os portugueses com os seus impostos. Ainda por cima,
submetem-nos à humilhação de reclamar com advogado à ilharga bem pago, aquilo
que por direito nos pertence e o Estado conhece como ninguém. Eu sei que entre
nós tudo é feito contra o cidadão e nesta armadilha como naquela dos contadores,
eles esperam pagar menos porque muitos dos prejudicados não reclamarão mandando-os
aquele sítio que eu me dispenso de mencionar. Depois Ricardo Salgado, o senhor “disto
tudo”, é uma bomba nuclear que se explodir arrastará para a morte os tubarões
democratas que tudo fazem por amor ao Portugal dos pequeninos...