domingo, janeiro 03, 2021

Domingo, 3.

Do rescaldo da semana sobra o cargo principesco, em Bruxelas, oferecido ao camarada magistrado José Eduardo Guerra. O Governo, através da sua ministra da Justiça, passando por cima da escolha independente de Ana Mendes de Almeida, enviou à Procuradoria Europeia, um falso curriculum do senhor procurador. Instada para se pronunciar sobre o assunto, Francisca van Dunem, respondeu outro dia: “Isso é assunto confidencial”, recentemente: tentativa de “envenenar a vida política”. Ela que até era dos poucos da equipa de António Costa com a folha limpa, sujou-se agora para defender o partido. Todavia, esta é também a imagem de um executivo que, como Sócrates, quer ter em todo o lado peões de brega. 

         - Comecei a ler com grande surpresa e agrado, A Luz de Pequim de Francisco José Viegas. Li os primeiros cinco capítulos e identifiquei-me logo com o romancista que trata os problemas da sociedade servindo-se do material romanesco. Ainda porque a sua escrita, para além de projectar valores humanos essenciais, traduz um conhecimento denso do indivíduo posto em questão ante considerações morais cuja resolução as leis não são tidas nem achadas. A personagem principal, o inspector Jaime Ramos, na sua forma desajeitada de proceder, encerra em si teorias e práticas de gestão criminal, que têm na psicologia do crime a raiz de estereótipos que se foram moldando através dos tempos. 

         - Tempo gélido, sobretudo a noite passada. Carrego constantemente as lareiras, mas a casa, nos espaços de passagem, continua fria. Apesar disso, um maravilhoso sol passeou-se por aí de manhã e parte da tarde. Depois o céu povoou-se de nuvens escuras ameaçando chuva e trazendo ainda mais tempo glacial. Escrevo diante do fogo no salão, o computador sobre os joelhos, um ar incerto dardeja sobre os candeeiros acesos, sombras que nunca aqui tinha entrado e são na sua intrínseca natureza aluviões ou acenos de memórias que eu julgava mortas e enterradas... Continuo a reler Green, pág. 610. (Com este tempo só a eléctrica chinesa lucra, aqui e por todo o mundo, é por tudo o que sabemos o único país com a economia florescente.)