Sexta,
29.
António
Costa está tão receoso como qualquer português e pensa fechar uma parte da
Grande Lisboa onde os novos casos de coronavírus não param de crescer. Sou dos
que pensam que o de confinamento foi precipitado e para acalmar os homens de
negócios que vêem os lucros a cair. A verdade, porém, está inteira nos números:
desde que começou a liberalização do comércio (3 de Maio), segundo as minhas
contas, há mais 6.383 novos casos e mais
346 mortes. Deve ser por isto que as ruas, transportes públicos, restaurantes,
lojas e escolas estão vazias. Os portugueses têm medo de retomar a vida normal.
- Há uma cena horrenda e criminosa e
impossível de me sair da mente: a morte de um afro-americano por um polícia nas
ruas de Minneapolis, no Minnesota. A técnica é simples e eficaz e foi mostrada
para todo o mundo por uma cadeia de televisão: o infeliz está no chão e sobre o
pescoço tem o joelho do agente da autoridade. O pobre grita que não pode
respirar, o polícia não se comove. É preto deve ser assassino e ladrão e tem de
morrer. Transportado ao hospital, chega já sem vida. O que se seguiu e acontece
desde quarta-feira, foi a revolta: casas incendiadas, mais uma morte,
pilhagens, o caos. A Guarda Nacional é chamada a intervir. Trump ameaça com
balas reais e chama aos manifestantes nomes inqualificáveis para um Presidente
de todos os americanos. Dir-me-ão pobre América. Sim. Sobretudo, pobres
cidadãos abandonados à pobreza, ao desemprego, à vida miserável. Mas quem pôs
no pedestal da importância Trump? Naturalmente o dinheiro, a ignorância
popular, o populismo – tudo isto de costas voltadas à democracia.
- Noutro continente, utilizando
métodos idênticos, está Xi Ximping ping ping, o autocrático senhor da China. Adeus
ao acordo entre o Reino Unido e a China, um país, dois sistemas. A partir de
agora a manápula tirânica da China sobre Hong Kong é absoluta e a liberdade foi
esmagada para sempre. De nada serve a vitória recente da pró-democracia, a
autonomia do país está posta em causa, a Constituição do território fechada na
gaveta. Resta-nos o apoio – se este vier a acontecer – das principais
democracias ocidentais, norte-americanas e outras mais à causa dos jovens que
durante seis meses se bateram nas ruas. Ou a coragem, o denodo, do povo de Hong
Kong que, estou certo, tem na liberdade a essência suprema da sua existência.
- Regas. Carros de erva daninha
levados para o fundo da quinta para queimar no inverno. Falei com o António
Carmo, a Alzira. 35 graus. Impossível estar na rua depois das dez da manhã. Estou
de novo sem parabólica, aguardo a vinda do técnico. A Annie mandou-me esta
triste imagem do Portugal que reclama com avidez pela vinda dos turistas.