Segunda,
18.
O
rebotalho desportivo anda assanhado. Há futebolistas de primeira, de segunda e
até de terceira! Todos reclamam ajuda financeira do Estado. Eu tenho respeito
pelos jogadores da segunda e terceira divisões porque praticam desporto e não se
prestam a ser parafusos da grande indústria do futebol. Se os da primeira são prisioneiros
do dinheiro (pobres patetas); os outros são praticantes do saudável convívio desportivo.
Neste mundo só se fala em milhões. Agora, no espaço de dois meses, há jogadores
que passam fome. Mas os políticos querem baralhar e tornar a dar um jogo sujo,
desigual, corrupto e falsificado. Ninguém aprende nada com os avisos da Natureza
onde se inscreve a fragilidade humana, e em breve tudo estará ao nível nojento
onde sempre esteve. Até à derradeira oportunidade.
- “Será possível combinar as respostas
às urgências maiores da população mais pobre e ir alterando o sistema económico
dominante e insustentável, assente na exploração ilimitada de recursos
limitados e em perpetuar escandalosas desigualdades sociais?” pergunta Fr.
Bento Domingues no Público de ontem. E no último parágrafo da sua crónica: (...) “para chegar à
conversão ecológica é indispensável a conversão do desejo distorcido. Quem
deseja tudo para si próprio só pode ver,
nos desejos dos outros, rivais a dominar ou a abater. Não sente alegria com a
diferença.”
- Momentos de alegria breve, ontem, lá
fora deitado na espreguiçadeira ao sol. A dada altura, acalentado pela abóboda
celeste de um azul leitoso, mergulhei num sono solto. Quando acordei, as nuvens
que antes adejavam sobre a minha cabeça, tinham viajado para longe abrindo uma
imensa clareira de céu cativante. As nuvens suspensas como algodão de uma
brancura alva, pareciam dançar suavemente embalando os sonhos e ideias que povoam
esta cabeça sem descanso. Ao redor, diante dos meus olhos cavados de
estupefacção, o horizonte, perto e distante, era uma enorme paleta de cores
tendo em primeiro plano as árvores cheias de laranjas e limões contra o verde
intenso que a brisa suave acariciava. São sagrados estes momentos e urge
registá-los como documentos emanados da bíblica sacrossanta da vida.
- Jogar sem espectadores é o mesmo que
no teatro representar para uma plateia vazia. Portanto, senhores futebolistas,
não se queixem. Além que os nossos pobres actores são mais desfavorecidos que a
patetice dos “homens em cuecas a correr atrás de uma bola”.
- Como estamos de mesa? O de Sousa
permite ao domingo o remate do almoço com duas fatias de queijo francês. O
repasto foi preparado com esmero: perna de pato no forno regada com laranja,
batatas assadas (à parte) com apenas um fio de azeite, salada mista de endívia,
tomate, cebola, pedaços de abacate. A acompanhar tudo isto, um Douro Vila Real
Premium de 2015.
- Daqui até à estação atravesso,
encantado, campos de coquelicots. Fui
ao encontro dos meus amigos na Brasileira no primeiro dia de confinamento. Fui
de máscara nas ventas e olho embaciado. Danado, pois claro. Tudo esqueci ao
entrar no célebre café – lá estavam os artistas - o meu mundo. Sou recebido
como se fosse o rei de Portugal que nunca subiu ao trono. A nova gerente vem
cumprimentar-me e oferece-me um cartão assim como a todos os tertulianos, com a
oferta do café hoje e a certeza de o preço para nós ficar sem alteração e com
pagamento no fim do mês do que viermos a consumir ao longo das quatro semanas. Conversámos
primeiro dentro e depois na esplanada onde a Tereza que eu chamei pelo
telemóvel, quis abancar. Que bem se esteve! Não havia quase ninguém, as debates
vadios regressaram em força ou antes com a loucura que o vírus chinês pretendia
adormecer.
Não é tudo. Veio para mim a TVi – uma
jornalista, um cameraman – pedindo-me
que falasse sobre a abertura do café, da vida que hoje se reinicia. Pensei: “isto é sina!” Ante a
insistência da simpática rapariga, mais uma vez socorri-me da Tereza que
primeiro recusou e depois aceitou. Ela queria saber a razão que me levava a
recusar. Eu disse que o canal era uma espécie de Correio da Manhã, que nunca via e não me lembrava de alguma vez ter
visto o telejornal. O rapaz barbudo, ria-se.
- Fico por aqui por hoje.