segunda-feira, maio 25, 2020

Segunda, 25.
Xi Xinping ping ping quer amordaçar a liberdade do povo de Hong Kong. Com aquela cara moribunda de um estaticismo ameaçador, à boa maneira chinesa, vai levando paulatinamente a água manchada de sangue ao seu moinho. Desta vez, impondo uma lei dita de segurança, a proibir acções secessionistas, terrorismo e interferência externa. Uma tal lei tão inclusiva, vai permitir tudo e algo mais. Uma lei que não carece de legislação local e, portanto, passa por cima do Conselho Legislativo: ping, ping, ping. E lembrar-me eu que uma certa esquerda portuguesa, apoia aquilo que não difere muito do que fazia Salazar!

         - Ontem liguei a televisão para assistir à missa dominical. Apanhei a celebrá-la o nosso Cardeal Patriarca de Lisboa. Bref. O homem, em vez de falar dos Evangelhos, de Jesus Cristo, discerniu sobre o clima, a falta de água, e marginalmente o que devia interessar os fiéis. Porque aqueles temas, já nos basta a hipocrisia dos políticos e dos que se dizem protectores da natureza e ganham milhares à conta dos ingénuos. Parece que o tema de Deus está para estes homens de solidéu cardinalício, esgotado. A homília foi do princípio ao fim debitada com um sorrisinho que me dispenso de classificar...

         - O número de infectados com coronavírus está a aumentar desde que o país entrou em de confinamento. Não tarda, António Costa vai ter de fazer marcha atrás. Lá se vai a santa economia! A propósito, há um pormenor que passou despercebido, e ouvi ao primeiro-ministro: “Os bancos só desbloqueiam verbas para negócios que se mostrem credíveis.” Lá se vai a fanfarra dos hostels, restaurantes porta sim, porta não, tuk tuk que não dão lucro ao Estado, porque os seus proprietários gastam-no em jantaradas, viagens, carros e outras fantasias saloias.  

         - Faleceu Maria Velho da Costa. Conheci-a quando um dia, acompanhado da Isabel da Nóbrega, fui a Costa de Caparica onde ela se encontrava. Dizem que tinha mau-feitio. Não me pareceu. Simplesmente, enquanto grande escritora que foi, com romances bem escritos e profundos (refiro-me a Maina Mendes e Casas Pardas), era uma pessoa exigente, rigorosa, que não admitia perto de si a luminária inculta que se dissemina por todo o lado. Era, quando muito, áspera consigo e com os outros. Daí que pouca gente gostasse dela. No nosso país o superficial e trolaró é mais convivial, democrático, e “erudito”.


         - Entrei no grande período de regas diárias aos acantos, roseiras, morangueiros, hortênsias. Acabei de roçar o matagal (o segundo) do lado virado ao castelo. Conversei ao telefone com o João Corregedor (desta vez sem política, ufa!), o Mário (advogado) durante um certo tempo, a risada medonha e salutar a travar a respiração, o Paulo Santos, o António Carmo (satisfeito por voltar todos os dias à Brasileira). Gostas da tua vida? Quase sempre sim, mas quando é não, é de fugir. Esta noite sonhei em alterar o romance – e vou seguir o meu sonho. Porque tudo o que vem através da noite, do fundo do inconsciente que trabalha sem descanso, tem sido sempre estimulante.  Por exemplo. O título do romance O Pesadelo dos Dias Felizes (que andava há dois anos à procura), surgiu pelas quatro da madrugada, em Paris, e logo anotado num bloco que tenho à mesa de cabeceira. É um grande romance que os editores têm medo de publicar, devido aos preconceitos salazarentos que subjazem na proibição a tudo o que cheira a liberdade. Nem percebem que os desvarios do médico Peter Santa Clara, são produto de uma horrenda depressão por ter perdido o amor que julgava para a vida. Daí que me digam: “não temos colecção para o tema”, ou “o tema não se enquadra na nossa linha editorial”. Nem lhes ocorre perceber que as cenas terríveis do ponto de vista sexual, são apenas duas ou três e o resto das 300 páginas correm ao sabor de um lirismo conceptual, atravessado, todavia, de forte presença político-social – facto que eles detestam. É mais fácil viver bem e em uníssono com estruturas económico-politicas, piedosas e subterrâneas, montadas numa historieta amorosa de lana-caprina, que observar a vida, a verdadeira, inundada de podridão e falhanços vivenciais, numa sociedade hipócrita que não se defronta nem se questiona. Uma sociedade sem felicidade, habitada por gente amorfa e pacóvia, que vive a disfarçar ou a esperar os dias que antecipam a morte.