segunda-feira, janeiro 13, 2020

Segunda, 13.
Dia impecável. Andando a procrastinar há muitos meses uma data de coisas, tomei o comboio decidido a enfrentar o pesadelo que é para mim entrar em repartições públicas, lojas, enfrentar empregados, decidir contratos, entrar de rompante no mundo novo que nos oferecem as novas tecnologias e fui a Lisboa acabar de vez com estas hesitações.  Andei numa roda-viva e a meio da tarde tinha internet no bolso, em casa com mais vantagens, fui a CGD assinar resoluções e por aí avante. Eu que levei uma vida de privilegiado com secretária que me tratava das coisas medíocres do dia-a-dia, contabilista que me resolvia os problemas com o fisco, o banco, as multas, os impostos e assim, cercado de gente generosa que me protegeu durante mais de trinta anos de todo esse mundo de mangas de alpaca que abomino e para o qual não tenho nenhuma capacidade e paciência para lidar. Eu limitava-me a assinar o cheque respectivo e muitas vezes magnanimamente, podendo assim viver planando sobre o quotidiano confrangedor de milhões de pessoas.


         - Os gatos pretos dizem que dão sorte, saúde e mais não sei o quê. O Black anda numa fase de enfardar sem contenção. Parece um leitão que a Piedade engordou quando eu estive um mês ausente. Faço tudo para lhe tirar aquela carga de gordura, mas o bicho não compreende, não gosta, mia todo o tempo. Ontem, adiei a hora do almoço, ele fez uma cena canalha e forçou a entrada para a cozinha pelo lado oposto da casa. Barrei-lhe a passagem e quando ia a entrar no salão, não vi o pequeno degrau e espalhei-me na tijoleira. A lição estava aprendida – de imediato a malga foi repleta dos cagalhotos que ele adora.