Segunda,
13.
Dia impecável.
Andando a procrastinar há muitos meses uma data de coisas, tomei o comboio
decidido a enfrentar o pesadelo que é para mim entrar em repartições públicas,
lojas, enfrentar empregados, decidir contratos, entrar de rompante no mundo
novo que nos oferecem as novas tecnologias e fui a Lisboa acabar de vez com estas
hesitações. Andei numa roda-viva e a
meio da tarde tinha internet no bolso, em casa com mais vantagens, fui a CGD
assinar resoluções e por aí avante. Eu que levei uma vida de privilegiado com secretária
que me tratava das coisas medíocres do dia-a-dia, contabilista que me resolvia
os problemas com o fisco, o banco, as multas, os impostos e assim, cercado de
gente generosa que me protegeu durante mais de trinta anos de todo esse mundo de
mangas de alpaca que abomino e para o qual não tenho nenhuma capacidade e paciência
para lidar. Eu limitava-me a assinar o cheque respectivo e muitas vezes
magnanimamente, podendo assim viver planando sobre o quotidiano confrangedor de
milhões de pessoas.
- Os gatos pretos dizem que dão sorte,
saúde e mais não sei o quê. O Black anda numa fase de enfardar sem contenção. Parece
um leitão que a Piedade engordou quando eu estive um mês ausente. Faço tudo
para lhe tirar aquela carga de gordura, mas o bicho não compreende, não gosta,
mia todo o tempo. Ontem, adiei a hora do almoço, ele fez uma cena canalha e
forçou a entrada para a cozinha pelo lado oposto da casa. Barrei-lhe a passagem
e quando ia a entrar no salão, não vi o pequeno degrau e espalhei-me na
tijoleira. A lição estava aprendida – de imediato a malga foi repleta dos
cagalhotos que ele adora.