Terça, 26.
Ontem, enquanto Brezhnev cortava os
troncos dos arbustos em volta da quinta, eu, chapéu de palha na cabeça,
protectores auriculares, luvas e roçadora, atacava o mato que cobriu
completamente o jardim. Pelo meio-dia intervalei para fazer o almoço para
ambos. Sempre que ele cá vem, tenho gosto em o sentar à mesa comigo na cozinha
e por uma hora servi-lo, ouvir as suas histórias contadas num português arranhado
e acompanhado do seu constante largo sorriso. Disse-lhe que parecia um actor de
cinema austríaco e não um russo das terras e mares do capitalismo soviético. Riu-se
por uma hora e ao correr da tarde, logo que me via por perto, tornava: “Eu sou
actor austrico!” O dia neste remansoso rumor de máquinas, riso, conversa vadia,
acabou por ser uma bênção descida do céu mais o sol, enfim, derramado no campo.
Pena que com tantos afazeres, não pudesse aceitar o convite do Simão para um almoço
em Costa de Caparica.
- Embarquei no barco do Barreiro às 8,30.
Um quarto de hora depois chegava à Praça do Comércio para subir a penates até à
Brasileira onde me aguardavam os meus amigos e dali fui ao encontro do Carlos,
ao Campo Pequeno, para um almoço frugal no seu agradável B & B, preparado
pela empregada nepalesa e servido no jardim das traseiras. Segui depois para o
dentista onde me esperava um tormento de mais de uma hora. Primeiro com um
médico que me retirou o nervo de um dente e logo a seguir uma médica que me
limpou em profundidade e com anestesia o tártaro encrustado nas gengivas. No
final, não me tendo sacado nenhum dente, extraíram-me mais 220 euros e vim para
casa com o queixal inferior idêntico ao da Angelina Jolie, mas morto e incapaz para beijocas
apaixonadas. Bom. Felicíssima notte
caro Helder de Sousa que bem mereces e para os leitores que não se riram e até
sofreram com o meu desgraçado dia.