Quarta, 27.
Para que a vida não seja a desventura de
ontem, nada melhor que pensar na conversa que tivemos à mesa da Brasileira. Eu
fui o primeiro a chegar de entre os artistas que não faltam à manhã desfraldada
de compromissos, num total de sete. Como se sabe, entre gente delirante e sem
preconceitos, a liberdade é o ponto de união não só da vida palpável como da
narrativa inventiva, infinitamente mais assustadora e conciliadora porque rasga
os padrões onde a história individual e colectiva assenta. Naquela tertúlia não
há tema, epígrafe ou agenda. Ali a desordem, a improvisação, os delírios tanto
podem chegar do fundo da porta aberta para a praça, como nas asas de uma noite
mal dormida, uma indigestão, um arroto de azia. Ontem falou-se de dimensões.
Tudo porque o Gordilho que fora operado ao estômago e ficara livre de um carcinoma,
afirmava que passara a mictar não para a sanita, como seria próprio de uma
pessoa civilizada, mas para a rua devido não só ao jacto como à dimensão do
instrumento que segundo ele crescera com a corroboração, decerto feliz, da
mulher e ainda a afirmação a semana passada do médico segundo o qual a coisa “ainda
vai crescer mais”. Gargalhada geral e pipios para o lado. Acode o António Carmo
com histórias passadas na Guiné onde ele fez o serviço militar. Conta ele que
aí havia concursos entre brancos e pretos, e eram os africanos que levavam a
palma sobre os invasores de pífaros enferrujados. Entra depois o Vergílio que
introduz na conversa uma mulher, no caso a escultora Dorita Castel-Branco que eu
conheci muito bem e com quem privei bastante, e que engatou o escultor
octogenário. Com ela tudo devia estar no sítio e em evidência. Saltam para liça
os fadistas com um chorrilho deles amancebados com outros, todos em início de
carreira, mas já com uma folha comprida de desgastes no polo sul. Entro eu e
digo o que ouvi na rádio e vem fazendo o gozo de uns e as delícias de outros. Conforme
os cómicos da RFM corre um vídeo no youtube com casal a fazer sexo numa estação
de metro em Barcelona. O que surpreende e põe todo o mundo de olho inchado, é o
tamanho da máquina do homem que não se mede aos centímetros, mas a metro. Grande
melopeia sobre o que se passará entre eles, como é que a coisa funciona, que
sente a mulher, etc. etc. No final todos concluíram que não há “como algo
pequenino, alegre e saltitante” e deste modo nos separámos com um tema recheado
de filosofia serpenteante para nos embelezar as mentes e confortados com aquilo
que Deus nos deu. Deo gratias.
- Desordem em Cabo Verde, a primeira ilha que aceitou a democracia e a
ela se grudou. As notícias são ainda escassas, e o que se sabe é que morreram
onze pessoas. Narcotráfico? Rebelião política? Militar? Uma investigação está
em curso.