Sexta, 22.
Os derradeiros dias de Roman na viagem
terrena que o levou de volta à sua terra natal e ao seu país, foram o registo
de uma alma a caminho do lugar onde tudo começou e ao fim de 42 anos o regresso
ao berço do mundo invisível que o viu nascer. Foram também os dias do grande
sofrimento, traduzidos na esperança que Portugal fizesse melhor que os médicos
ucranianos e o nosso sistema de saúde fosse mais humano para quem aqui trabalhou
e descontou. Mas o meu país continua arreigado na “cunha” tão importante no
Estado Novo, e não é permeável ao solitário que carrega, só, as dores dos
outros como as suas próprias. Graças à Maria José que falou com alguém
influente no São Bernardo, foi possível interná-lo num quarto com os cuidados
paliativos de quem chegou um lodaçal de dor para se despedir deste mundo.
Felizmente Roman tinha alguns fiéis amigos por cá, e eles mobilizaram-se para
atenuar o seu sofrimento e permitir que morresse com dignidade. Faleceu sexta-feira
passada às primeiras horas da amanhã, pacificamente. O irmão foi chamado e
chegou no sábado sem conhecer uma palavra de português. O Fortuna acolheu-o em
sua casa e por aí andou os dias que lhe permitiu o patrão polaco e as normas da
Polónia para onde imigrou. Entretanto foi chamado o arcebispo da Igreja
Ortodoxa de Lisboa que se ocupou dele e arranjou os 3000 euros necessários à
sua transladação por avião. Ontem, o caixão esteve aberto meia hora para que os
seus amigos se despedissem dele. Partiu logo depois para o aeroporto. Para trás
deixou a mulher, uma filha de dois anos, outra de seis, e a mãe amputada de uma
perna devido à diabetes. Era um homem bom, honesto, competente, muito educado, sensível
que deixou a sua marca não só no meu coração como aqui no sítio onde escolhi
viver. Nunca fazemos o suficiente pelos outros.