Domingo, 15.
François Hollande falou de guerra. Mas
quem semeia ventos colhe tempestades. Que o homem é fracote, mentiroso, virado
do avesso, todos os franceses sabem. Ninguém aqui o suporta. É visível que ele
só tem em mente um segundo mandato que nenhuma sondagem vaticina. A mim dá-me
ideia que na sua cabeça não existe qualquer dimensão geoestratégica para a
França e para a Europa. Ele anda ao sabor de uma corrente de interesses que se
move no eixo Estados Unidos-Alemanha-Reino Unido. Neste aspecto Chirac tinha
outra dimensão ao fazer frente aos EUA quando da invasão do Iraque que está na
origem de todo este ódio e crescimento dos extremismos. A sua infeliz ideia de
enviar para a zona o porta-aviões Charles De Gaulle foi, julgo eu, a gota de
água que empurrou mais esta ira. Há na sua decisão algo de prepotente, de
querer estar à frente, de armar em valente. Ele devia saber como sabe qualquer
cidadão minimamente interessado no mundo que o rodeia, que o impropriamente
designado Estado Islâmico é um grupo de fanáticos, sem organização, Estado ou
estatuto político com quem se possa negociar e contra o qual nenhum exército
pode ter a ambição de ganhar a guerra e muito menos do ar. Os objectivos dos
Estados Unidos são sempre os mesmos e conduzem ao desastre. A Europa devia
aprender de uma vez por todas com as experiências desastrosas da sua aliança
com os americanos. Melhor fora que deixassem os bárbaros formar um Estado Islâmico
ou Califado. Ao menos percebíamos com quem combatíamos e o diálogo era mais proveitoso.
Se uma guerra tivesse de ser empreendida, sabíamos com quem lutávamos. Para
além de desfazer o sonho romântico de muitos franceses que partem para se aliarem
a um bando de assassinos que pretensamente querem voltar o mundo do avesso, mas na realidade o que pretendem é confiná-lo às origens bárbaras das cavernas.
18,00 horas.
Na sequência dos trágicos acontecimentos
de sexta-feira, o Chefe de Estado decretou o estado de sítio. Os museus e
organismos públicos estão fechados, a população foi aconselhada a ficar em
casa, o pavor reina por todo o lado. Nós fomos de passeio a Chantilly de onde
acabo de chegar. Há uma série de anos que lá não ia. Fomos sob uma tarde
luminosa, clara, saborosa. Enquanto a Annie que já pouco pode andar ficou no
carro, Robert e eu, fizemos a volta do primeiro lago, uns três quilómetros em caminhada
moderada. De seguida convidei-os para uns crepes regados com cidra. Os três
bebemos uma garrafa inteira, numa atmosfera simpática que a proprietária mal-humorada
tudo fez para a tornar insuportável. A um canto da crêperie, um grande fogo a
lenha, as paredes pintadas com os pássaros e as aves que pertencem aos três
lagos que em tempos palmilhámos, mesas corridas, convívio descontraído, em
frente, do outro lado, o pequeno castelo da Dama de Branco, em redor um vasto e
denso arvoredo projetado nas águas onde o sol mergulhara também tornando humanos
os habitantes que no lago tricotavam a sua superfície líquida, sacudindo-se
como donzelas que não vêem homem há uma data de tempo.