sábado, novembro 21, 2015

Sábado, 21.
Anteontem desafiámos os medos e fomos, Robert e eu, ver a exposição que está no Grand Palais. O título – pelo menos para mim – tinha-me de sentinela: Picasso Mania. Pensei tratar-se de mais um daqueles entusiasmos dos franceses que adoram bater na mesma tecla anos a fio. Mas não. Desta vez, a moda vai para a reconstrução do puzzle mitológico (caso da exposição do Louvre) ou confrontação (esta que nos oferece um Picasso através dos seus descendentes directos). Ficam de fora os milhões de bastardos por não haver espaço nos muitos museus do mundo. São os chamados génios incompreendidos que pintam para arredondar a magra reforma ou para registar no cartão de identidade uma profissão sem passado nem futuro. Bom. À medida que fui avançando de sala em sala e me cruzei com certos artistas que admiro (Jaspar Johns, Martin Kippenberger), comecei a ligar-me ao projecto e a achá-lo curioso. Por uma razão simples: os pintores que ficaram depois de Picasso, tendo-o admirado com sinceridade, abrindo, contudo, um ligeiro sorriso de passagem, pegaram nas pontas que o artista catalão deixou e construíram a sua identidade e personalidade próprias. Até mesmo um sujeito que montou pedestal na propaganda, David Hockney, surgiu aos meus olhos com trabalho digno de se espantar.

A Bigger Card Players - David Hockney

A temática dos comissários da exposição é simples: cotejar os trabalhos da geração posterior com uma obra do homenageado. Três exemplos: Faith Ringgold com Les Demoiselles d´Avignon, Malcom Morley com Les Demoiselles d´ailleurs e Adel Abdessemed com Guernica 

Picasso´s Studio - Faith Ringgold

Cradle of Civilization With - Morley Malcolm 

Who´s afraid of the big bad wolf? - Adel Abdessemed

Basquiat


         - Quando deixámos o Grand Palais, fazia escuro e chovia. Fomos então em passo de passeio Champs Élysées abaixo até à Concorde. De um lado e outro da avenida, decorre nesta altura o Mercado de Natal. Este sobe até quase ao Arco do Triunfo, com barracas iluminadas e toda a sorte de artigos dos queijos aos sabonetes de Marselha, dos chocolates aos enchidos, passando pela bijutaria, agasalhos, doces e toda a espécie de inutilidades que fazem a delícia dos passantes. A nós convinha-nos um vinho quente. Foi o que fizemos, em cavaqueira demorada debaixo de um toldo de circunstância, vendo a noite passar batida a chuva, a apreensão que tem reinado desde a semana passada em Paris aligeirada. Visitantes de Picasso muito poucos, contrariamente ao que vi há mês e meio quando passei no Grand Palais pelas oito da noite. A fila devia ter duas horas de espera. Também o metro onde fomos e viemos, tinha poucos passageiros. Os parisienses e os turistas debandaram dos museus, metropolitano, grandes lojas. O que Manuel Walls disse sobre a hipótese de novo ataque desta feita com gás tóxico também não ajudou.  O medo impera, embora mais acomodado à rotina da vida.