terça-feira, dezembro 06, 2016

Terça, 6.
O professor Marcelo transformou-se numa espécie de porta-voz das invejas e amarguras do povoléu. Anda tão contente, tão triunfante como se estivesse em permanência em campanha. Não é que esteja contra aquela fúria de viver, mas a bolota não joga com a perdigota. Há qualquer coisa de artificial no seu comportamento e Passos Coelho tem razão em se insurgir contra o Presidente. Pela simples razão: Marcelo Rebelo de Sousa assumiu para si a oposição ao Governo e também, sobretudo, o seu incondicional apoio, não deixando espaço ao líder do PSD. Ele é presidente da República e primeiro-ministro, ele é comentador e catedrático. Em ambas as situações actua encostado à popularidade e esforça-se por dizer alto aquilo que o povão bichana pelos cafés e ruas. Mas aquilo não passa de um faits divers com graça que a turba aprecia sem ter em conta o que subjaz do seu conteúdo. Por exemplo, ele diz – e bem – que os ordenados dos gestores da CGD são exagerados, porque sabe que as suas palavras não passam disso mots, words, parole. Soam bem ao ouvido das gentes, mas o escândalo é obra do Mágico.

         - Outro dia, numa pacata cidade da Finlândia, um homem de 23 anos, desatou a disparar contra três mulheres que saíam do restaurante onde haviam estado a jantar, deixando-as mortas por terra. A polícia capturou o rapaz, mas ninguém sabe que motivos o levaram a praticar tão hediondo crime. Este é mais um sinal dos tempos. Actos destes multiplicam-se nas grandes cidades. Dá que pensar.

         - Renzi cumpriu a palavra e demitiu-se. A UE apressou-se a dizer que o resultado do referendo não lhe diz respeito, o povo italiano adora a União (morde aqui a ver se eu deixo). Na avalanche de problemas ou na sua origem, estão os bancos sem cheta e dívidas catastróficas. Ainda há poucos anos estavam sólidos porque eram geridos por famílias tradicionais. Hoje estão como os nossos, os alemães, os... Eu tenho estima pelo líder democrático e pelo que li parece razoável aquilo que ele propôs para continuar a governar. A Itália sempre foi um tormento, um vulcão em efervescência. Todavia, os problemas do país são os nossos. Está tudo em cacos e só os líderes que pretendem salvar-se, continuam a falar de um mundo encantado. Entretanto, o palhaço e aquela coisa chamada Berlusconi, espreitam a presa, perdão, o poder.


         - Morreu Hugo Ribeiro. Paz à sua alma. Era um ser humano encantador, disponível, amigo dos artistas, interventivo, calmo, atento. Na nossa juventude, quero dizer, na do António Carlos e na minha, sem dinheiro e cheios de ambições e projectos, fomos pedir-lhe para nos ajudar a gravar um recital de poesia inteiramente dedicado a Fernando Pessoa e aos seus heterónimos. Recebeu-nos no estúdio da Valentim de Carvalho, em Paço d´Arcos, onde imperava pleno de rigor e saber tecnológico. Durante semanas, sem nos pedir um chavo, trabalhou connosco, paciente e divertido até o final da gravação feita nos processos antigos das grandes bobinas que ainda hoje conservo religiosamente. Para cúmulo e desgosto nosso, o espectáculo que estava previsto ser no Estúdio 444, acabou por não se realizar. Mas julgo que em páginas para trás falei sobre esta aventura.