sábado, dezembro 24, 2016

Sábado, 24.
Mesmo nesta quadra, o veneno do Daesh não cessa de ser inoculado no tecido já de si doente da Europa. Um tunisino, de 23 anos, foi abatido ontem em Milão quando o atentado que praticou e liquidou doze pessoas e feriu meia centena, deu-se no mercado de Natal, em Berlim. Este criminoso vinha sendo incriminado em muitos outros crimes, por alguns dos quais conheceu a prisão. O jovem foi abatido por acaso. As autoridades italianas não sabiam que ele estava no seu território, e ignoravam que fosse ele o procurado na Alemanha pelas autoridades. 

         - Nesta minha segunda estada em Viena de Áustria, tenho dado prioridade a sítios que não conheci quando cá estive em 1978 com os alunos da universidade de Dijon e o seu director que teve a amabilidade de me convidar a fazer a viagem juntos. Assim, desta vez, pus de parte aqueles lugares muito turísticos como Schonbrunn, Beldere ou Hofburg por onde então vadiei, de boca aberta em sucessivos bocejos, porque é preciso palmilhar centenas e centenas de metros por superfícies vazias, quase só paredes e as paredes não contam a história por nós. Ou antes até contam, mas temos nós levar-lhes a matéria estudada... Assim, passei uma destas tardes na Kapuzinerkirche de onde saí de língua de fora, não tanto pelas emoções que experimentamos no interior da Cripta Imperial, mas pelos constantes constrangimentos por que passei até encontrar o antigo convento dos capuchinhos. Mas vamos ao sarcófago do Império Austro-Húngaro. Todos os Habsburgo estão lá, salvo o Imperador Carlos, desterrado no seu exílio, na Madeira. Não obstante, um busto em mármore, não deixa os austríacos esquecer o homem santo que agonizou em terras portuguesas (na tarde em que visitei a Cripta, observei um casal muito jovem que depôs uma flor artificial nos túmulos de Zina, Otto e no plinto de Carlos detendo-se numa pequena prece em cada um). De resto, encontramos os caixões dos Fernando, dos Leopoldo, dos Francisco, dos Maximiliano, todos unidos num espaço tenebroso de onde saímos com a impressão de trazemos a morte agarrada a nós. São ao todo, se bem contei, 151 nomes de uma Casa com dez séculos de história, que começou em Carlos V para terminar em Regina, esposa de Otto, filho de Zita. No centro desta necrópole que ocupa uma vasta zona da cave, está Maria Teresa, majestosa, ela que encarnou como nenhum outro membro da ilustre família a grande Áustria triunfante, não apenas no século XVIII, mas também no século XIX, ao lado dela o marido Francisco de Lorena, acompanhados por quatro figuras que choram. Como até na morte nos distinguimos, muitas das personagens que pelos seus actos, recuos ou desvios, romperam com as normas estabelecidas, também ali pela posição, tamanho e beleza dos caixões de bronze, sabemos quem não soube honrar e engrandecer a descendência.





         - Com este clima, passamos a vida a despirmo-nos e a vestirmo-nos. Por isso, já perdi a conta à quantidade de vezes que deixei para trás cachecol, luvas ou gorro. Curiosamente, procurando, acabei de todas as vezes por encontrar o que havia perdido e me fazia falta para enfrentar este frio rigoroso. Há sempre alguém, neste mundo civilizado, que apanha os objectos e os deixa sobre uma mesa, um vão de janela, uma cadeira, de modo a que o seu dono os encontre.

         - Vou ter que me despachar porque daqui a nada vou assistir a um concerto e logo de seguida, na catedral de Santo Estêvão, à missa da meia-noite. Tenho a sorte de para ambos poder rapidamente chegar a pé. Amanhã vou reservar o dia a vulgaridades, a coisas comuns que o pagode aprecia em primeiro. Como um passeio pela Yppenplatze e Brunnenmarkt, um café acompanhado de uma fatia de Sachertorte e se estiver para abrir os cordões à bolsa, talvez me atire ao Zimtschnecken mit vanielleeis e mais uma vez a Wiener Schnitzel que comi hoje e é uma delícia... de caro! Como está um frio de rachar mas não neva, vou como um muçulmano: de mim só verão os olhos e a boca.

          - A propósito. Quem disse que a vida por estas paragens é dispendiosa! Olhe que não, olhe que não! Por exemplo, nunca encontrei um café por menos de 2,30. Mas o que eu achei baratíssimo, até porque podia gozá-los nesta vida e levá-los intactos para a outra, foi um par de sapatos na Sir Anthony, Karntner Strasse, por 3.190 euros! São sapatos baratos, atendendo a que podem igualmente ser os sapatos de defunto, não é verdade?


         - Festas Felizes! Excelente Natal para todos!