quarta-feira, dezembro 04, 2019

Quarta, 4.
Fui ao rendez-vous da irmandade na Brasileira. Encontrei os habitués do costume e os temas caíam uns sobre os outros, até à chegada da crença cristã. Quem entre nós acredita em Deus, na Ressurreição, etc.? Grupo de comunistas e homens de esquerda, só o Virgílio e eu jurámos a nossa fé. Brito que também estava não se manifestou. Disse para todos ouvirem, a propósito de um e-mail que eu lhe enviei de Paris gabando uns versos que ele me deu a ler: “Não respondi porque não gosto de elogios, mas li várias vezes as tuas palavras porque o português é puro, límpido.” Entupi.

         - O Conselho Superior da Magistratura condenou o juiz desembargador Rui Rangel a pena máxima: a demissão. Assim como a sua ex-mulher, juíza Fátima Galante, castigada a aposentação compulsiva. É de louvar esta atitude do CSM não por ser rara, como por ter em conta o altíssimo grau de confiança que é necessário ter na Justiça e seus decisores para bem da democracia.

         - Dois aspectos da grande tarefa de ler as 1400 páginas do Journal Intégral de Green, prendem-se com o tipo de papel, uma espécie de papel bíblia, num corpo de letra muito miúdo; assim como ter de confrontar este texto com aquele que em vida o escritor publicou. Por exemplo, nestes dois dias li os anos de 1919 a 1921, umas quarenta páginas, sempre com os volumes referentes aos mesmos anos ao lado, com saídas de um e entradas noutro. É um trabalho cansativo não só para os olhos, como para o cérebro - mas apaixonante.


         - Quando cheguei de Lisboa, não vi o meu carro no lugar onde o deixei. Pensei que mo tinham roubado. Eis que um homem que por ali andava, me diz que “a mulher que o levou está aí em baixo no bar da estação”. Era uma agente nova e airosa. Apresentei-me, mas a zelosa criatura não se demoveu: “O dístico está fora de prazo!” Ignorava que o cartão identificador de deficiente tinha data para caducar como os produtos do supermercado (a deficiência, essa, não caduca). Depois pensei: “Por aqui não me governo, não vale a pena contestar porque estes polícias novos – talvez não sejam todos -, têm-se em alta classificação as suas pessoas quando de farda vestida.” Sigo num táxi para a esquadra. Aí chegado, sou recebido por um jovem de uma amabilidade e beleza impressionantes, sinto logo que por ele as coisas morreriam ali. Mas como foi a colega que levantou o auto, outra solução não me restava que pagar os 89 euros do reboque. “Mais tarde irá a coima por estacionamento”- diz-me o polícia de serviço. Claro que vou contestar todo este excesso de zelo da pobre senhorita fardada e fazer valer os meus direitos. O chauffeur de táxi a quem eu conto o desastre: “Pois, eles a si foram-no multar sem razão, mas não ligam aos carros nos passeios e em segunda fila.”