Domingo, 15.
Julien Green se praticasse a drague que
o levou a engatar centenas de jovens, muitos pelos catorze, quinze anos o seu
forte, hoje estava na prisão. O homem era um desassossego. Percorria parques,
avenidas, banhos públicos, retretes, saltava de autocarro em autocarro na
perseguição de um miúdo, recebia em casa, dormia com este e com aquele, trocava
adolescentes com amigos, num movimento incessante que o levou depois ao
estrangeiro, sobretudo a Alemanha onde chegou a ter dois rapazes em simultâneo,
ambos com o nome de Adolf. Estou curioso em saber até que idade esta doença o
atacou; agora não tenho dúvidas que o filho adoptivo era antes de mais seu
amante. É caso para dizer: olha para o que escrevo, não para o que faço. Na
escrita sou orientador espiritual, nas ruas um diabo porno. Esta dupla
personalidade, esta espécie de esquizofrenia surpreende os seus leitores do
Diário publicado. Toda a sua obra literária, vista à luz da celebridade, que
digo eu, debochada ilustra aquilo que Paul Morand diz no seu diário: as
personagens femininas greenianas não passam de transsexuais, a mulher não tem
as reacções que o seu criador lhes confere.
- Vai por aí outra chiste nascida, como quase todas as outras, no
Parlamento: o confronto entre o Presidente da Assembleia e o deputado da
direita de seu nome André Ventura. Este utilizou a palavra “vergonha” para
qualificar certa actividade do Hemiciclo. O mesmo vocábulo que o BE e outros partidos usam
quando lhes chega a mostarda ao nariz. Só que desta vez, Jaime Gama insurge-se
e corta a palavra ao solitário deputado, em nome do respeito pela Casa dos
Portugueses, numa clara demonstração de prepotência contra a liberdade de
expressão. Os socialistas aplaudiram. Eu que não gosto do emissário do futebol,
estou do seu lado nesta questão. Em democracia, goste-se ou não da direita (eu
não gosto), temos de aceitar as suas opiniões e combatê-las com sabedoria e
vigor.
- A primeira papoila que em francês toma o nome (rigolô) de coquelicot e vira masculina, acabou de
aparecer no campo. Não tarda multiplica-se e cobre a terra da sua beleza de um
vermelho intenso e frágil.
- Detesto este clima maçudo, cinzentão, que faz que chove, mas não
chove, empinado do nariz sisudo, que nos obriga a olhá-lo de soslaio, nos rouba
o sol que é o nosso protector, nos retém contra nossa vontade em casa ou nos
supermercados em passeios de cão ao fim do dia, e por isso larguei para Lisboa
onde toda a gente se juntou a mim em protesto contra o dia tresmalhado da
exultação.