Quarta, 18.
Dia arrasante. Quando de manhã muito
cedo me encontrava a queimar resíduos dos trabalhos no campo depois de ter
aberto as covas, enchendo-as com estrume, e deixando nelas pevides de abóboras,
irrompem pela quinta o Fortuna e o Brejnev. Vinha o mestre emendar os erros da
mesa do pátio, um ano após tê-la deixado a fazer-me concorrência coxeando das
quatro patas ou dançando como bêbeda quando os amigos nela abancavam. O
trabalho durou até ao meio-dia, não tendo eu parança a dar-lhes assistência. Depois
do almoço, regressou apenas o Brejnev que passou a tarde a abrir os taralhoucos
mais grossos e a empilhar os restantes, continuando os muros de madeira que eu
venho fazendo desde o início do ano. Cansado, mas feliz pelo dia glorioso, com
sol a jorro e um brilho lampejante a deixar no campo a marca indelével da
Primavera.
- E todavia, oh, glória suprema! Logo os primeiros raios de sol
acariciaram os meus companheiros disponíveis a qualquer hora do dia ou da
noite, para virem em auxilio do solitário homem que não cessa os amar, discutir
com eles, surripiar-lhes momentos mágicos que fluem das suas páginas em laudas
encantatórias de beleza, poesia e sagesse. Sem eles o que seria de mim, pobre
ignorante lançado às feras de um mundo que os substituiu pela pobreza da
cultura mastigada, espreitada nas redes sociais, onde o vazio impera e forma os
analfabetos de amanhã.
- Ontem à noite fui-me deitar aturdido com tantos milhões que José
Sócrates ganhou nos seis anos que nos desgovernou e se governou à grande e à
francesa. O trabalho da SIC é notável, muito consistente e perfeito no
descasque da vidinha airada do nosso gatuno número um (Alves dos Reis é um
aprendiz ao lado dele). A dada altura o homem, desculpem, o senhor engenheiro
de canudo passado ao domingo, diz: “Eu sou um pobre provinciano que andou na política
como todos os outros por vaidade.” Nunca a criatura falou tão verdade e tão
acertadamente. Deve ser então este o fraco que leva os políticos manhosos e
arrogantes a exercer o poder. Quanto ao mais, na roda demoníaca dos milhões que
lhe tombavam de todos os lados e continentes, o socialista (pois então!) dizia
não se lembrar de nada ou quase nada. Furioso, permitiu-se tratar como quis o
magistrado que o interrogava. E tentou aquilo que os trapaceiros da política
quando são atacados asseguram: isto é um julgamento político. Eu pergunto: a
quantos dos arguidos – sendo nós todos iguais perante a lei republicana – era
consentido falar daquele modo aos juízes? Só a sua
excelência-ladrão-primeiro-ministro-engenheiro-escritor José Sócrates. O tal que
esteve a estudar na Sorbonne, aprendeu piano no seizième arrondissement de Paris e voltou com esta ideia: tudo é
uma questão de narrativa. Só que a dele não convence os juízes nem os
portugueses.
- Parece que houve encenação na Síria com as crianças atingidas por armas
químicas. Se for verdade, é assustador e leva-nos a largar a pouca confiança
que hoje temos na classe política. O trio de ataque, não esperou pelas provas
independentes pedidas pela ONU e exigidas por Putin. Que eles são capazes
disso, eu não tenho dúvidas.