Quinta, 6.
Eu não votei em Marcelo e os meus
leitores sabem o que penso dele enquanto comentador político e o horror deontológico
que me causa o aproveitamento da televisão para fins de promoção,
enriquecimento e valorização pessoais. Mas chapeau,
Presidente! O trilho que tem percorrido até aqui, redimi-o das falsas homílias
e do muito que indevidamente aproveitou. O discurso de ontem nas comemorações
do dia da República, foi uma bofetada nos rostos patetas e rosados e risonhos
dos homens que se aproveitam da política para desmandos de toda a natureza. Não
se podia ser mais claro. Parabéns! Quando me lembro do mausoléu que foi o
palácio de Belém durante dez anos e da múmia que lá vivia, sou obrigado a
reconhecer que, enfim, temos um português que compreende e pratica o seu cargo
como a democracia e república impõem.
- Black, quase todos os dias, tem um manjar de pombo cujos restos deixa
à minha porta. É um pouco a memória do ti Luís que se vai, ele que gostava de
pombas e as instalou nesta zona. Instantes antes de morrer, contou-me a mulher,
abriu os olhos e disse: “Vou-me embora, uma pomba voou aqui no quarto.” Na campa
onde está sepultado, em Paris, a família mandou pintar uma pomba.
- António Guterres foi eleito para o cargo de Secretário-Geral das Nações
Unidas. Congratulo-me. Não tanto por ele ser português – essa hipocrisia deixo
aos políticos que sabem mais disso com os olhos fechados que eu com eles
arregalados -, mas enquanto homem de honra, trabalho, solidariedade e
honestidade. Só espero que ele mude a Organização e não a mantenha como um
lugarejo inútil que tem sido até aqui, caixa de complôs e corrupção, dirigida
pelos Estados Unidos e a Rússia, e onde o resto dos países fazem figura de corpo
presente. E se não conseguir que ela tenha a dignidade que merece, que faça o
mesmo que fez quando deixou o Governo que dirigiu manchado e infestado dos gângsters
do seu partido. Sócrates chegou aos cargos governamentais pela sua mão – a
única mácula que lhe reconheço.