terça-feira, março 24, 2015

Terça, 24.
Entre nós há muito que nasceu uma engenhosa forma moral: o caso político. No mundo político tudo é político. Esta astúcia tanto serve àquele que está atrás das grades, como ao que por laxismo consentiu a negligência, a incompetência, o desvario nos gastos, o favor ao amigo, a viagem à conta do erário público, o roubo descarado, a corrupção, a montagem mentirosa do era para ser e não chegou a ser.  

         - Outro que entretém muito o português é o facto político, mais conhecido por fait-divers. A classe dos (des)governantes adora, tem mesmo um deslumbramento por ele. Porque ele permite o malabarismo e varrer para debaixo do tapete momentaneamente aquilo que aflige a comunidade. É uma técnica refinada de cinismo e demagogismo. Os senhores jornalistas também se derretem, permitindo-lhes arrastar o ping-pong das acusações partidárias e desviar o pagode daquilo que verdadeiramente interessa. É um contentamento geral que conduz e imiscui num mesmo sentimento de vacuidade os mass media e a política. Um exemplo recente é aquele de que Portugal tem os cofres cheios... de dívidas, segunda a ministra das Finanças e a resposta de António Costa à boa maneira socialista: se os tem cheios que os esvazie para socorrer os pobres.   


         - Hoje foi um dia terrível, sombrio. Tivemos a notícia do falecimento do poeta Herberto Helder de manhã e à tarde da morte de 150 passageiros do voo low cost da Germanwings que descolou de Barcelona com destino a Dusseldorf. O que provocou o trágico acidente ainda não se sabe. Vamos entrar no período da Quaresma. Penso em Servius Sulpicius na carta que dirigiu a Cícero, inconsolável com a morte da filha Tullia: Comment osons-nous, chétifs mortels que nous sommes, nous plaindre de la mort d’un des nôtres, nous dont la nature a fait la vie si courte, quand nous voyons d’un seul coup d’œil les cadavres gisants de tant de grandes cités ! Cícero, Ad Familiares.