terça-feira, agosto 09, 2022

Terça, 9.

Fui a Lisboa encontrar-me com o Vergílio e a Luísa. Depois chegou a Teresa (o António faltou porque também a ele chegou a covid) e ficámos à conversa até perto do meio-dia. Como diria o João, esteve-se bem, rolando temas uns a seguir a outros, numa concordância enternecedora, enquanto à nossa volta os queridos turistas faziam a algazarra que dá milhões ao país. Dali fui almoçar ao Corte Inglês. Quando cheguei e mesmo mais tarde pouca gente. Comi muito bem e por um preço correcto. Antes de deixar a loja, desci à livraria para trazer o último livro de Anna Politkovskaya, jornalista mandada assassinar por Putin, em 2006. Trata-se de um diário político que começou com a invasão da Chechénia, em 1999, levada a cabo pelo actual ditador e estende-se até um pouco antes da sua morte.  

         - O Fertagus compensa-me não só com a viagem, mas acima de tudo com o que ouço dentro dele. No regresso duas mulheres falavam para a carruagem quase cheia dos seus problemas familiares, faziam-no com tal vivacidade, que um homem que seguia perto se levantou e veio sentar-se ao meu lado, barafustando: “Porra, que temos nós a ver com a vida desta gente!” Do que me chegava, eu dizia para mim: “Helder, olha do que tu escapaste! A tão apregoada vida familiar, está ali desenhada sem rodeios nem fantasias, descarnada e violenta.” 

         - No dia em que devia estar mais activo – sábado - entrei numa onda de taralhoquice. Quando ia a pôr no forno previamente aquecido a tarte que passara um certo tempo a preparar, dei-me conta que não tinha forrado o prato com a massa própria. Toca de retirar o preparado, cobrir o fundo do prato com a pasta, verter o conteúdo para dentro e levá-la de novo ao forno. No final, como não lavei o prato, a tarte ficou agarrada ao fundo e foi à espátula aguçada que retirei o recheio de legumes – desfeito em mil pedaços. 

Da massa sobrou uns pedaços. Lembrei-me de fazer uns crepes doces no forno. Untei as formas com manteiga, cobri-as de massa, e o meu desejo era encher o fundo com amoras silvestres que aqui brotam por todo o lado e mais um pouco de geleia de marmelo que a Zitó fez há uns anos e eu gasto com (muita) parcimónia. A geleia ok, mas em vez de pôr o fruto bravio, enganando-me, enchi com paté de azeitona. Depois, despachado, disse: “Talvez seja bom e eu faça história com a união de elementos tão díspares.” Sentei-me pomposamente à mesa para provar a invento – que porcaria, não é coisa que se aconselhe a ninguém. Contudo, para não deitar ao lixo, fechei os olhos e com o café fui despachando o desastre.