sexta-feira, agosto 26, 2022

Sexta, 26.

É urgente que anote o que se passou esta manhã no Fertagus e merece hosanas erguidas ao céu em agradecimento por não me levar a descrer totalmente da humanidade. A cena passa-se perto de mim. Dois jovens de dezoito anos (mais ou menos), entram no comboio e os únicos bancos que encontram vagos, são os que por direito e civismo pertencem a pessoas prioritárias: deficientes, grávidas e velhos. Um deles precipita-se e abanca, o outro fica a seu lado de pé. A dada altura o que está confortável, convida o companheiro para se sentar; este recusa, apontando a sinalética por cima dos lugares. O outro não liga, ambos prossegue a conversa, um amesendado o outro de pé. Finalmente, o que escolheu os bancos prioritários, levanta-se e os dois decidem procurar lugares na carruagem seguinte de modo a ficarem lado a lado sentados.  

         - Fui a Lisboa almoçar com Fr. Hélcio. De modo a não ficar com a manhã perdida para o romance, levei o tricot e sentei-me das dez ao meio-dia num café da Avenida de Roma, climatizado. Ando em estado de graça e, embora tivesse começado a fazer a revisão do que venho escrevendo, abandonei a ideia embalado por esta fase criativa. Enfim, modo de falar. Na verdade, em duas horas, enchi uma página e dúzia de linhas. Começo desesperante, as palavras esquivavam-se, a mente arrastava-se, a manhã prometia ser um desastre. Mas no final, ao reler o que saiu, sobretudo por haver nascido ali, isto é, não ter sido arquitectado antes, deixou-me muito satisfeito e o dia estava ganho.