quarta-feira, agosto 26, 2020

Quarta, 26.
Chamar covardes como fez António Costa aos médicos que tanto se bateram pelos seus doentes no pico da pandemia, alguns até morreram, é um ultraje da parte de qualquer pessoa quanto mais do primeiro-ministro. Costa está esgotado. A obsessão pela economia transformou-o numa marioneta que todos manobram segundo os seus interesses. O futuro não se adivinha promissor.

          Depois, aconteceu a reunião com o bastonário da Ordem dos Médicos, supostamente para um entendimento e reconhecimento do trabalho dos clínicos. Ok, tudo bem, as câmaras estavam lá e António Costa botou discurso. Sem referir os 18 utentes do lar de Reguengos de Monsaraz (origem da discórdia) que faleceram com coronavírus, disse que a pandemia veio trazer à luz do dia uma realidade a que é preciso acudir. Que grande lata! Então ele não sabia em que condições vivem os velhos, ele que foi presidente da Câmara de Lisboa, onde os lares abundam, clandestinos e oficiais, todos cavernas assustadoras de reclusão e desumanidade! Este insulto à humanidade, ao espírito civilizado, à democracia é a paleta de palavreado que estamos todos fartos. Parece que Costa andou a governar um povo troglodita para lá do Paleolítico. Mais, esta tarde, soube-se que o primeiro-ministro disse coisas cá fora para a comunicação social que não correspondem ao que afirmou lá dentro ao bastonário. Este, sempre digno, transmitiu por carta aos seus associados o desencanto. Como se classificam atitudes destas? Desobrigo-me de nomear.  

         - Romperam aí três homens pelos trinta anos. Vinham de calças rasgadas nos joelhos à moda idiota dos tempos presentes, T-shirts cavadas, depilados nas pernas, peitos e sovacos e talvez todo o corpo, troncos proeminentes e andar dengoso, tatuagens, enfim, completíssimos. Dois eram empregados do terceiro, um tipo baixo, cabelo ralo, olhar cativante, especialista em bombas de furo actividade que herdou do pai. Pareciam três saltimbancos da era moderna, os dois assalariados de vez em quando faziam acrobacia entre as laranjeiras. Não falavam propriamente entre eles, emitiam grunhidos, por monossílabos, como se as frases estivessem e o seu sentido subentendidas, com o apoio do olhar, do encolher de ombros, da expressão do rosto, numa cacofonia que me atraiu. Estes operários modernos, nada sabem de Marx, Lenine, nem da consciência moral kantiana. Parecem viver numa bolha que não tem precisão de nada a não ser dos afectos profissionais, do salário ao fim do mês, da paixão pelo seu clube de eleição e de um almadraque para deitar o corpo que exibem como se fossem os Schwarzeneggers em versão portuguesa, e com ele se sentissem as pessoas mais admiradas e cobiçadas do mundo.

         - O Raul foi empresário de construção civil, em Paris, e por lá andou desde adolescente, possui a mesma consciência humana que eu, que tenho mais duas linhas de conhecimento. Esta constatação e tudo o que nela se oculta e desoculta, devia ser estudada. A reflectir.


         - Calor insuportável. Voltaram os incêndios lá para a Covilhã. A Covid – 19 está a progredir a passos largos. Os lares, lugares abandonados pelos governos, são a chaga aberta de um sistema que assenta arrais na propaganda, na palração, na vaidade e na vacuidade. Imprimi as vinte páginas de O Matricida para ver o que lá está. Dias agitados. Muita preocupação com assuntos da vida corrente para os quais não fui feito e portanto me esmago de tédio e inconformismo. Bom. Vou mergulhar.