quinta-feira, novembro 28, 2019

Quinta, 28.
Remoo sem descanso o primeiro capítulo do romance que me deixou desagradado. Vou ter que o reler pela quarta vez, de modo a obter um parecer da insatisfação que me deixou.

         - Fomos ver o filme J´acuse de Roman Polanski. Essencialmente fala de honra e consciência moral por contraste com o mundo de hoje cujos valores éticos foram transferidos para a importância do dinheiro e poder. O curioso da argumentação, vem do facto de a inocência de Dreyfus ser feita por um anti-semita, Marie-Georges Picquart, interpretado por Jean Dujardim. Todo o filme é uma obra de arte, de equilíbrio sólido, servido por uma narrativa argumentativa corrente, bem desenhada, com todos os actores e fundamentos de época bem enquadrados, denunciando o cinismo do poder do exército francês. O oficial que todos querem encobrir e esteve na origem daquele triste caso que abalou a França do princípio do século passado, e levou ao célebre artigo de Zola, é Marie Charles Ferdinand Walsin Esterházy. Foi ele que compôs o famoso bordereau em nome de Dreyfus de origem judaica, inculpando-o de passar informação confidencial para os alemães. Em consequência o capitão é enviado para as masmorras da ilha do Diabo onde iria apodrecer não fosse a chegada ao processo de Picquart. Este empreende nova investigação, contra todas as formas de ética militar, que conflui na inocência de Dreyfus e na culpa de Esterházy. Novo julgamento tem lugar e o tribunal aceita, embora não totalmente convencido, libertar o prisioneiro.

         Mas o filme pode também ser visto de outro prisma: o da caça às bruxas. O próprio realizador, tem sido enlameado devido a suposto envolvimento ou toque ou outra qualquer forma de enamoramento que dizem ter tido com menores há quarenta anos! Algumas instituições francesas, nomeadamente, escolas e organismos oficiais, dirigidos por feministas fanáticas, tudo têm feito para evitar que raparigas e rapazes à sua guarda, vejam um filme absolutamente indispensável nos dias de hoje. Alguma informação também tem uma parte de culpa, como aconteceu com a França dos finais do século XIX quando o caso Alfred Dreyfus dividiu a nação francesa. E, portanto, o filme devia pela tolerância, liberdade, vigor e realidade histórica, ser visto não só pelos franceses como por todos os europeus. Ainda hoje há muito anti-semitismo como provam recentes ataques a cemitérios,  sinagogas e assim.

         Uma última nota a destacar a coragem do escritor-jornalista Émile Zola que no L´aurore publicou o seu famoso J´acuse, que os meus olhos viram de perto quando visitei a sua mansão nos arredores de Paris. Zola esteve um ano na prisão e pagou 3000 francos de multa. Foi morto intoxicado pela sua chaminé, mas na altura toda a gente disse que tinha sido assassinado pelos anti-dreyfusanos.

         - Dia pardacento. Durante toda a semana chuva e temperatura pelos 13 graus centígrados. Mas hoje, apesar de encoberto, o frio instala-se a pouco e pouco. A semana que vem, os entendidos em meteorologia, anunciam-nos arrefecimento acentuado. Amanhã tornamos a Cambrai.