Segunda,
23.
Sábado
passado estive no Museu da Música com o António Carmo que lá expõe uma dúzia de
telas com os retratos dos maiores compositores. Nem todos os quadros estão bem
realizados, mas o conjunto denota uma técnica que o identifica, um labor de
pormenor que o engrandece, a par do jogo de cores que combinam muito bem.
Talvez a maior realização seja Wagner que, de resto, dá rosto ao prospecto da
exposição. Muita gente, alguns dos seus antigos companheiros do Verde Gaio,
hoje a chegar aos setenta anos de idade, mas nem por isso menos divertidos. A
dada altura, em frente à pintura de Beethoven, deixaram-se fotografar em
posições de dança, tudo com uma graça, uma alegria, um desembaraço corporal de
fazer inveja aos zombies que se arrastam pela juventude dos nossos dias. Passou-se
um bom momento de convívio e já a noite tinha abraçado a terra quando nos
separámos.
- Estou para ver como vão estar amanhã
os rins. Passei duas horas a podar as hortênsias, a preparar vasos com terra e
estrume, a dispor as hastes da tosquia de modo a que lá para a Primavera as
possa plantar na terra.
- Esta manha fui entender-me com a
Câmara para o pagamento do desastre da água. O curioso foi a constatação do millieu. A funcionária que me atendeu
pôs-se logo do meu lado, sofrendo quase tanto como eu, indignada com a importância.
Havia na sua voz uma solidariedade que os pobres têm entre si, como se fossem
um todo quando uma parte é atingida pela desgraça. Gosto deste modo de ser dos
portugueses cá de baixo. São autênticos, reflectem sem fingimentos as dores que
sendo do desgraçado passaram a ser também suas. Por contraste, os novos-ricos agrupam-se
para celebrar a riqueza do concorrente, mas com uma ponta de inveja de fora. O contubérnio
não entra no seu relacionamento humano, tudo neles é aparência, fingimento,
arrogância e desprezo pelos seus confrades.