quinta-feira, janeiro 21, 2016

Quinta, 21.
Insistem aqueles que querem fugir às responsabilidades de terem contribuído para a morte do jovem de Santarém no São José. Falam em processos correctos do ponto de vista médico, argumentam que David Duarte não podia ser transferido para nenhuma outra unidade hospitalar devido ao seu estado. Só não confessam o crime de abandono do paciente por um fim-de-semana, ele e mais outras quatro vidas que foram quantas ali morreram. Felizmente que o ministro da Saúde é um homem sensato e quer tempo para apurar a verdade. Esta não pode ser invocada com a falta de recursos financeiros, porque os cortes na saúde abrangeram todos os hospitais e não consta que Coimbra e Porto tenham deixado alguém morrer por isso. Ouvi um energúmeno dizer na televisão que os colegas fizeram bem porque não podem trabalhar a seis euros/hora. Não podem os médicos, como não pode nenhum trabalhador. Os clínicos em primeiro. Pela simples razão que uma vida não tem preço.

         - Ontem passei o dia inteiro em Lisboa. Estive na Brasileira com os meus amigos pintores, almocei no Corte Inglês, fiz uma ou outra compra (Viagem a Itália de Goethe que conhecia de excertos em francês, por exemplo) e despachei-me para Palmela. Dois diálogos ao correr das horas.

         O primeiro, com o meu farmacêutico a propósito da toma de Selenium – um antioxidante que              protege as células e eu tenho o hábito de fazer duas vezes por ano. Digo-lhe:
         - Esta embalagem está mais cara 5 euros que noutro sítio. Como é possível?
- É muito simples. Imagine um vendedor de vinho que adquire 100 garrafas marca. Por ter comprado tantas, sai-lhe cada uma a 5 euros e ele vende a 6 euros. Outro vendedor que compra do mesmo produto apenas cinco unidades vai pagar por cada uma sete euros e, portanto, vai ter que vender a unidade a oito euros. Aqui é a mesma coisa – diz-me com convicção.
         - Conclusão – digo eu – para ganhar um euro o que empatou mais dinheiro está a perder. 
         Olhou-me com espanto e desatou a rir.

         O segundo, com o Patrício Gouveia que encontrei no metro. Diz-me ele:
          - Oh! Por aqui! Então já deixou o jornalismo?
          - Já e há muito tempo, felizmente.
          - Então do que vive?
          - Vivo das coisas do espírito - leitura e escrita.
          - Mas isso não dá para viver!
          - O meu amigo é socialista? – digo a entrar com ele.
          - Com certeza que não. Porque pergunta?
          - Porque isso é questão que importa a todos os socialistas que conheço. Eles só pensam 
            em dinheiro.
          - Sem ele não se pode viver!
          - Para uma alface e uma lata de atum ainda chega.
          - Então tem muita sorte porque há muita gente que nem para isso.
          - Que fez ao belo prédio onde eu morei? 
          - Descasquei-o e agora estou à espera de fazer as obras.
          - Quando as terminar vai ficar ainda mais milionário – acrescentei eu sabendo do que a     
             casa gasta.
          Riu-se e atirou:
          - O Helder não muda.

          - Pois não. Por isso estamos sempre em campos opostos.