quarta-feira, janeiro 27, 2016

Quarta, 27.
Os portugueses deviam estar de joelhos a agradecer à televisão, a todos os canais, por produzirem tão arautos presidentes da República, tão prolíferos e talentosos escritores, tão rigorosos economistas e tão exímios políticos. Portugal só não é um exemplo para o mundo, porque deixou de ter naus há quatro séculos.

         - A Maya por quem tenho estima e é entre o bruxedo que por aqui subsiste à custa de mentiras, um exemplo de trabalho e honestidade. Tenho o seu site nos favoritos e não começo o dia sem saber o que a elegante senhora me prediz. Só tenho um reparo a fazer: a baronesa das cartas às vezes acorda tarde – como ontem aconteceu. Anda decerto na ramboia pela noite dentro ou a colher nos sonhos as realidades que vaticina aos seus seguidores. Seja como for, paralisa-me o dia.

         - Entre as coisas que ando a ler, realço Grécia Revisitada. Frederico Lourenço é fascinante de todos os pontos de vista, não só porque expõe generosamente toda a sua imensa cultura, como, sem rede, se nos oferece cativante. Mais: neste ensaio, descobri-o irónico, flatteur, pícaro.  

         - Eu sei que não é fácil resolver o problema migratório oriundo do tempo de Bush pai e transformado num atentado no reinado do filho. Mas a Europa do euro, também mostrou desde a primeira hora, não ter grandeza para o encarar de frente. Deixou as coisas correr, as férias grandes estavam marcadas, os senhores políticos não podiam ser incomodados com trivialidades, havia eleições em vários países da União, o centro europeu estava defendido pelas fronteiras marítimas, a Inglaterra era preferencialmente o país dos sonhos dos infelizes. Isto foi no início da tragédia. Depois, as coisas atingiram o dramatismo que se conhece, o Ocidente foi confrontado com as mortes de crianças no Mediterrâneo, o abandono de seres humanos, a exploração destes por mafiosos e, acossados pelo desespero, vieram bater à porta da Europa por socorro. Milhões de povos sob a tirania de Bruxelas comoveram-se, revoltaram-se, exigiram que os governantes actuasse com humanidade. Aqui chegados, quando as temperaturas polares desceram do céu, os caminhos e os mares ficaram transformados num tapete de gelo, os anafados políticos respiraram de alívio na convicção de que o Inverno viria trazer tranquilidade aos seus quotidianos ronceiros e confortáveis. Mas tal não aconteceu. Então levantaram-se milhares de quilómetros de barreiras de arame farpado, derrubaram-se tratados por eles próprios construídos, usou-se a violência, recambiaram-se milhares às suas procedências, enterraram-se os mortos à pressa. Até que a Dinamarca, incomodada com a invasão dos bárbaros, assim como a Suíça que lhe segue os traços, encontrou esta saída asquerosa: todos os que tragam mais de 1.340 euros no bolso (900 euros na Suíça) serão confiscados! Como se as pessoas fossem ricas com tais somas! Mais: as famílias dos refugiados só se podem juntar a eles cinco após a autorização de permanência daqueles no país. Uma vergonha! Interrogo-me: o que seria uma nova guerra mundial com a mentalidade egoísta e primária dos dias de hoje! Que Deus nos defenda.

         - O Presidente do Irão, Hassen Ruhani, tem andado por aí a abrir os cordões à bolsa. Em Roma, visitou o Papa Francisco e à despedia pediu ao Sumo-Pontífice que rezasse por ele. Ai estes políticos! O curioso porém, foi o facto de as autoridades mandarem tapar as estátuas de nus do museu Capitolini para não chocar o ilustre visitante. Não era preciso tanto. O homem ao olhar aquelas maravilhas com os olhos que eu pousei nelas, quando muito diria: “Oh, nós os árabes, somos mais avantajados que estes homens de corpos potentes e zizis de pífaro.” Enfim, convenhamos, talvez não dissesse, mas lá que pensava... Todavia, o que é impressionante é o poder que o dinheiro tem. Nem toda a história artística e cultural da velha Europa consegue impor-se à bajulação daqueles que são infinitamente mais pequenos e insignificantes, face às maravilhas que gregos e latinos nos deixaram e devíamos venerar com orgulho e respeito. Convém, contudo, lembrar ao senhor a famosa Xerazade que não se limitou a adiar a morte com as suas histórias, mas também deve ter excitado gerações de tiranos Xarriares.