segunda-feira, fevereiro 15, 2021

Segunda, 15.

Concerto de domingo no ARTE. Talvez por ser dia dos namorados (enfim, tanta patetice junta), os excertos de óperas estiveram no programa. Primeiro Romeu e Julieta directamente de Verona, composta por Charles Gounod. Vimos os ensaios e depois a representação. Os intérpretes davam vontade de rir. Elas, matronas de meia idade, espécie de gatas borralheiras, de grandes peitos generosos (para utilizar o estilo do séc. XIX) a espreitar dos vestidos de tafetá; eles galifões de bairro periférico, pavoneando-se em palco como se estivessem numa rua das traseiras de Piccadilly Street. Estes amorosos de Verona, na sua vida pessoal, são desmedidos apaixonados e uma das sopranos (a das grandes mamas arfantes) chegou a dizer que para ela o amor tinha de ser sempre a 200 por cento!   

Na segunda parte apareceu Plácido Domingo a dirigir o mesmo corpo de cantores, desta feita com áreas da Boémia. Um pouco melhor, embora o clima que vinha de trás se mantivesse em ligeireza e teatralidade bufa, sem crédito, amador. Depois, até o tempo estava irritado com aquele espectáculo e do céu caiu uma abada de água e vento, levando cadeiras, alcatifas e material de cena. No final ali tudo parecia falso, soaram palmas covid no teatro romano vazio. Maestro, músicos, tenores e sopranos agradeceram ao anfiteatro de pedra e cimento. 

         - Linguagem de jogador de futebol. Pergunto-me se ainda há quem acredite: “Temos que ser intensos, rigorosos e humildes.” Também podia ser o palavreado dos políticos: aqueles aprendem com estes – e vice-versa. 

         - Imensas dificuldades no romance. Mesmo assim fechei a jornada de trabalho com página e meia. Não era suposto que a personalidade de Volodymyr avolumasse tanto. (*) De todo o modo, dia em que não somo duas linhas, é um dia perdido, inútil, infeliz. Frio e vento gélido voltaram. Escrevo de frente para o campo inundado de sol, o calorífero aceso. Apanhei um cesto de laranjas caídas das árvores. Falei com a Alice, Carmo Pólvora longa conversa sobre arte sem falarmos propriamente da sua pintura. Sorri pobre solitário que te abasteces dos murmúrios dos tempos. 

(*) “Pour produire une oeuvre “parfaite”, il faut savoir attendre, vivre à l´intérieur de cette oeuvre jusqu´à qu´elle supplante l´univers. Loin d´être le produit d´une tension, elle est le fruit de la passivité, le résultat d´énergies accumulées pendant longtemps.” Cioran, dixit, pág. 129.