Terça,
3.
Uma
grande editora que eu julgava morta e enterrada, escreveu-me interessada em ler
O Pesadelo dos Dias Felizes mas... em
papel. Há anos que não fazia cópia de nenhum original, porque os despachava por
PDF. Fui, pois, hoje depois do almoço no Príncipe com o Carlos e tutti quanti, imprimir as 300 páginas
numa pequena loja perto do Cais do Sodré que ele conhecia. De regresso a casa
li o primeiro capitulo e, surpresa!, não detectei nenhuma gralha ou erro
gramatical. Pelo contrário acho aquele início... (suspende, não fales do que
achas, deixa ao leitor ser ele a dizer-te o que achou).
- Fui ao Chiado encontrar-me com os do
costume. Fui de comboio do Pinhal Novo ao Barreiro onde tomei o barco e desci
no Terreiro do Paço. Durante todo o percurso até aos barcos, um homem baixo e
calvo, esteve ao telefone. Quem era? Um actor do teatro de Setúbal com
responsabilidades de ordem vária. A conversa era com um actor a quem a
companhia tinha pago o salário com uma letra descontada directamente no banco.
Seguiu-se um longo monólogo explicativo, denotando o pouco agrado do
interlocutor e também daquele que escutávamos pondo, preto no branco, que aquele
modo de pagamento era excepcional. Preveniu-o que tinha de se habituar à vida
atribulada de um actor onde o dinheiro falta sempre. O diálogo prosseguiu e a
ele chegaram informações que dizem como até no teatro o malabarismo financeiro
e os estados de alma são muitos. Soube que os subsídios para o teatro foram
fortemente reduzidos no Porto e em Lisboa, mas que em Setúbal “eles ainda não
tiveram o arrojo de tocar”; falou da censura contra personas non gratas que a Câmara
impunha para continuar a ajudar a companhia e outras misérias que se assemelham
em tudo com o ambiente vivido no Estado Novo.