segunda-feira, março 13, 2017

Segunda, 13.
Barry Jenkins, o realizador de Moonlight, podia ter utilizado os lugares-comuns dos guetos e das arruaças aos gays, sobretudo quando a história se passa entre negros homossexuais que no dizer da personagem de O Rés-do-Chão de Madame Juju, a negra Kagi “isso de homens com homens é coisa de branco”, podia mas optou por dar ao filme um final raramente visto em obras do género, onde os estereótipos abundam em favor da distorção dos sentimentos vividos pela maioria dos homossexuais. E todavia, a narrativa fílmica, arriscava perfeitamente resvalar para essa monstruosidade que é chamar à liberdade que as pessoas que amam outras do mesmo sexo um exercício contranatura. A Igreja está presente desde os confins dos tempos nesta barbárie ao determinar que Deus – Ele que pôs nas palavras de seu Filho que, de resto, e ao contrário dos seus irmãos, não casou: “Aquele que ama pai ou mãe mais do que a mim não é digno de mim” (Mat. 10-34) -  ser este amor um acto proibido e de ofensa a Deus. Aos séculos somaram-se séculos e milhões de homossexuais foram mortos, apedrejados, maltratados, caluniados, condenados na praça pública quando aqueles que exerciam todos esses crimes praticavam na rectaguarda e às escondidas, sob a capa de casamentos imposturados, as mesmíssimas condutas. O último exemplo, foi o regime nazi. Com ele houve um retrocesso monstruoso, se tivermos em conta o amor santificado em múltiplos altares pelo Imperador Adriano (séc. II dC) ao seu favorito Antínoo. Moonlight, não sendo quanto a mim uma obra-prima, é todavia um trabalho exemplar pela direcção de actores, a atmosfera, a densidade das personagens, o clima suburbano de drogas duras e promiscuidade, onde cresce Chiron (infância, adolescência, idade adulta), protagonizado por três actores que encarnam o papel admiravelmente, com particular realce para o insinuante Trevante Rhodes. O final, como dizia, é diferente porque a personagem principal tem a coragem de se libertar do inferno onde o destino o fechou. Fá-lo centrado no “pecado” do amor alcunhado de “panasca”, numa catarse impressionante, que advém daquela noite-revelação quando Chiron deambula pela praia e depara com um camarada de escola e acontece a revelação. O Amor vem lá do fundo da adolescência, atravessa o tempo, desvia o ódio, rasga as convenções, impõe-se na sua dignidade humanizada, surpreende-nos ao passar por cima da vida sem fundo da miséria humana, e não só nos surpreende como nos comove, nos abala, nos irmana seja qual for a escolha que cada um de nós faça. Há uma revelação que Chiron faz quando os dois camaradas se reencontram ao fim vinte anos. Diz ele ao amigo com quem teve a primeira relação amorosa: “Sabes, neste corpo nunca mais ninguém tocou.” Que melhor e mais profunda prova de amor! Para os moralistas, direi: Deus criou-nos livres – assomemos, portanto, o nosso livre-arbítrio.

Cena final do filme 

         - A propósito, não resisto a citar Frei Bento Domingues no Público de ontem: “Quando a palavra de Deus suscitar a imagem ou a ideia de uma ameaça à nossa liberdade e à nossa criatividade, esse Deus é o diabo, aquele que nos desvia de nós mesmos. A partir de Jesus, descobrimos que a única coisa que Deus nos quer é a nossa recriação, ir nascendo de novo, todos os dias, com ritmos diferentes para a nossa Páscoa eterna.” Não são sublimes e belas estas palavras! Quanto amor transportam elas ou, dito de outro modo, quanta ajuda nos dá Deus através da escrita deste homem iluminado e profundamente humanista. 

         - Sabemos que a CGD teve 1.900 milhões de prejuízo. Vicente Jorge Silva dizia no Público de ontem que “se não fosse a Comissão Europeia, o salvamento da Caixa Geral de Depósitos, não seria possível”. Belo contentamento! Deste modo, foi passado um pano sobre os criminosos que dirigiram o banco – PSD, CDS, PS. Ninguém até hoje foi julgado. Muita corrupção ligada a negócios de compadrio, foi concretizada. O que se sabe é que umas centenas de funcionários vão ser despedidos, dependências fechadas e, não obstante tanto prejuízo, o presidente e seus muchachos vão ganhar milhares por mês. Os salários indecentes tiveram a aprovação do PS, BE e PCP.


         - A Europa não pára de nos surpreender, não só a Europa como o mundo. A França do insuportável Hollande, não esteve em sintonia com outros países da União Europeia e consentiu que houvesse comícios com a presença do primeiro-ministro turco no seu território para o referendo imposto pelo sultão Erdogan. Pretende este restabelecer a pena de morte, chamar a si poderes absolutos, controlar a liberdade de expressão e pensamento, tudo princípios que a Europa repugna e não quer dentro das suas fronteiras e são hoje bandeira dos direitos humanos.