Segunda, 13.
Barry
Jenkins, o realizador de Moonlight,
podia ter utilizado os lugares-comuns dos guetos e das arruaças aos gays,
sobretudo quando a história se passa entre negros homossexuais que no dizer da
personagem de O Rés-do-Chão de Madame
Juju, a negra Kagi “isso de homens com homens é coisa de branco”, podia mas
optou por dar ao filme um final raramente visto em obras do género, onde os
estereótipos abundam em favor da distorção dos sentimentos vividos pela maioria
dos homossexuais. E todavia, a narrativa fílmica, arriscava perfeitamente
resvalar para essa monstruosidade que é chamar à liberdade que as pessoas que
amam outras do mesmo sexo um exercício contranatura. A Igreja está presente
desde os confins dos tempos nesta barbárie ao determinar que Deus – Ele que pôs
nas palavras de seu Filho que, de resto, e ao contrário dos seus irmãos, não
casou: “Aquele que ama pai ou mãe mais do que a mim não é digno de mim” (Mat.
10-34) - ser este amor um acto proibido
e de ofensa a Deus. Aos séculos somaram-se séculos e milhões de homossexuais
foram mortos, apedrejados, maltratados, caluniados, condenados na praça pública
quando aqueles que exerciam todos esses crimes praticavam na rectaguarda e às
escondidas, sob a capa de casamentos imposturados, as mesmíssimas condutas. O
último exemplo, foi o regime nazi. Com ele houve um retrocesso monstruoso, se
tivermos em conta o amor santificado em múltiplos altares pelo Imperador
Adriano (séc. II dC) ao seu favorito Antínoo. Moonlight, não sendo quanto a mim uma obra-prima, é todavia um
trabalho exemplar pela direcção de actores, a atmosfera, a densidade das
personagens, o clima suburbano de drogas duras e promiscuidade, onde cresce Chiron
(infância, adolescência, idade adulta), protagonizado por três actores que
encarnam o papel admiravelmente, com particular realce para o insinuante
Trevante Rhodes. O final, como dizia, é diferente porque a personagem principal
tem a coragem de se libertar do inferno onde o destino o fechou. Fá-lo centrado
no “pecado” do amor alcunhado de “panasca”, numa catarse impressionante, que
advém daquela noite-revelação quando Chiron deambula pela praia e depara com um
camarada de escola e acontece a revelação. O Amor vem lá do fundo da
adolescência, atravessa o tempo, desvia o ódio, rasga as convenções, impõe-se
na sua dignidade humanizada, surpreende-nos ao passar por cima da vida sem
fundo da miséria humana, e não só nos surpreende como nos comove, nos abala,
nos irmana seja qual for a escolha que cada um de nós faça. Há uma revelação
que Chiron faz quando os dois camaradas se reencontram ao fim vinte anos. Diz
ele ao amigo com quem teve a primeira relação amorosa: “Sabes, neste corpo
nunca mais ninguém tocou.” Que melhor e mais profunda prova de amor! Para os
moralistas, direi: Deus criou-nos livres – assomemos, portanto, o nosso
livre-arbítrio.
Cena final do filme |
- A propósito, não resisto a citar
Frei Bento Domingues no Público de ontem: “Quando a palavra de Deus suscitar a
imagem ou a ideia de uma ameaça à nossa liberdade e à nossa criatividade, esse
Deus é o diabo, aquele que nos desvia de nós mesmos. A partir de Jesus,
descobrimos que a única coisa que Deus nos quer é a nossa recriação, ir
nascendo de novo, todos os dias, com ritmos diferentes para a nossa Páscoa
eterna.” Não são sublimes e belas estas palavras! Quanto amor transportam elas
ou, dito de outro modo, quanta ajuda nos dá Deus através da escrita deste homem
iluminado e profundamente humanista.
- Sabemos que a CGD teve 1.900 milhões de
prejuízo. Vicente Jorge Silva dizia no Público de ontem que “se não fosse a
Comissão Europeia, o salvamento da Caixa Geral de Depósitos, não seria
possível”. Belo contentamento! Deste modo, foi passado um pano sobre os
criminosos que dirigiram o banco – PSD, CDS, PS. Ninguém até hoje foi julgado. Muita
corrupção ligada a negócios de compadrio, foi concretizada. O que se sabe é que
umas centenas de funcionários vão ser despedidos, dependências fechadas e, não
obstante tanto prejuízo, o presidente e seus muchachos vão ganhar milhares por
mês. Os salários indecentes tiveram a aprovação do PS, BE e PCP.
- A Europa não pára de nos
surpreender, não só a Europa como o mundo. A França do insuportável Hollande, não
esteve em sintonia com outros países da União Europeia e consentiu que houvesse
comícios com a presença do primeiro-ministro turco no seu território para o
referendo imposto pelo sultão Erdogan. Pretende este restabelecer a pena de
morte, chamar a si poderes absolutos, controlar a liberdade de expressão e
pensamento, tudo princípios que a Europa repugna e não quer dentro das suas
fronteiras e são hoje bandeira dos direitos humanos.