sábado, abril 23, 2022

Sábado, 23.

Quando conduzo é usual ouvir a 2. Como ainda não se calaram as loas (bem merecidas) a Eunice Muñoz, eis que sou brindado com o excerto radiofónico entre a colossal artista e o enorme Nicolau Breyner. Ela é telegrafista, ele o que se apresenta para lhe ditar o texto dirigido à namorada. A peça dura um bom bocado e pôs-me a rir às gargalhadas, as lágrimas a correrem-me cara abaixo, de tal modo que tive de encostar o carro à berma,  porque tanto ela como ele são excepcionais comediantes e imprimem naquele pedaço de prosa bem esgalhada, um imemoriável e saboroso talento. Nada a ver com os cómicos de hoje (salvo algumas excepções), nem na representação nem na construção da personagem nem na criação dos textos. Não são comediantes, são cómicos que exprimem o que são como pessoas, quero dizer a sua imensa iliteracia, a facilidade, o produto-cliché, o débito sem arte, a escolha dos temas vulgares para um público que em tudo se lhes assemelha, o copy e paste.  

         - Enfim, o que venho dizendo sobre Guterres ouço agora por todo o lado em uníssono. Ele não mudou e quem se der ao trabalho de ler o que escrevi quando tomou o cargo há cinco ou seis anos, verá que não mudei uma linha. Com pena minha, porque gosto do homem, acho-o honesto na medida da honestidade dos políticos, quero dizer no blá blá corrente mas com mais firmeza de convicções.  

         - Em Mariupol, o número de corpos enterrados em 200 valas pode chegar aos dez mil, diz Ucrânia, a Rússia adianta outro número, cada um fazendo tábua rasa da verdade que devia orientar o bom governante. Mariupol ficou esventrada na sequência dos constantes bombardeamentos russos. Alguns órgãos de comunicação internacionais, dizem que as imagens de satélite parecem mostrar 200 valas comuns.

Imagens de satélite mostrando 200 valas comuns em Mariupol. Foto do Público. 

         - Acabo de chegar da fnac onde fui atraído por descontos prometidos de 50 por cento hoje dia do livro. Mentira. Não vi nada com essa percentagem, toda a livraria estava a 30 por cento. Mesmo assim, trouxe Jardim das Tormentas do mestre Aquilino Ribeiro, o segundo volume do Diário de Eugénio Lisboa e a tradução do monumental (570 p.) tratado tibetano do monge Sogyal Rinpoche que eu li há quinze anos na tradução francesa e me tocou tão profundamente que quero agora cotejar.