segunda-feira, fevereiro 07, 2022

Segunda, 7.

Morreu a semana passada Lauro António. Houve uma altura em que privávamos com muita regularidade no Diário de Lisboa. Eu achava-o uma espécie de aristocrata do cinema a sua paixão. Quando convidou Vergílio Ferreira para entrar no seu filme Manhã Submersa, apesar do desalento do escritor, acho que o soube dirigir com sensibilidade e gosto. De resto, era um esteta com quem gostava de falar muitas vezes até altas horas da noite no Granfina. 

         - O borralho das eleições ainda derrama toda a sorte de comentários e ensaios políticos. Foi o caso este fim-de-semana de António Barreto e Teresa de Sousa. O curioso, é que nem um nem outra, se tenham referido à abstenção, como se quase 50 por cento dos portugueses tivessem morrido ou emigrado para os confins da Ásia. Acho uma falta grave da parte de ambos, ou talvez não bem vistas as coisas: quem não aparece, esquece. Todavia, os danos quem os sofre é a democracia, quero dizer todos nós. 

         - Uma criança de cinco anos caiu a um poço com 32 metros no Norte de Marrocos. Durante cinco longos dias bombeiros e polícia tentaram resgatar o miúdo, em condições-limite, dado que tiveram que escavar um túnel para tentar chegar ao garoto que tinha vários ferimentos. Os pais e milhares de pessoas assistiam às operações, equipas de televisão chegaram de todo o mundo. Todo o esforço foi em vão, Rayan não sobreviveu. Mas valeu aquela extraordinária acção humanitária. Não descreias, Helder, nunca dos homens. Há em cada um um abismo incomensurável de mistério, o que vês quando olhas é quase sempre a face dissimulada do que ocultam. 

         - Os políticos (alguns pelo menos, normalmente os medíocres) estão convencidos que possuem o poder que lhes permite toda a espécie de loucuras – não têm, não valem dez reis de mel coado. De contrário, reparem no multimilionário da Amazon, na sua ambição saloia e arrogante de querer ter o barco mais caro e grande do mundo que mandou construir na Holanda, para que o iate possa deixar o estaleiro, terá de ser desmontada a Ponte Koningshaven do séc. XIX, que resistiu à II Grande Guerra e depois de sua excelência passar, voltará a ser montada. A operação rondará vários milhões que a Câmara do sítio aprovou porque... precisa de dinheiro! E como Sr. Amazon o tem, tudo pode, quer e manda. Por isso é que um amigo, ainda por cima artista, me dizia há dias que viemos ao mundo “apenas para ganhar muito dinheiro”... Vive ele bem? Cala-te boca. 

         - Comecei de máquina nas mãos, a roçar a erva do jardim (nas traseiras da casa, mas de frente para quem entra). Aconteceu no seguimento das duas horas de leitura ao sol. A Piedade apareceu e logo que me viu, lançou: “Nunca o vi sossegado, tem que estar sempre a trabalhar. Ou é a escrever ou a ler. – Pois é. O trabalho dignifica, mas não é por causa do dinheiro. – Lá isso é verdade. Sem dinheiro não se faz nada.” Proudhon não é para aqui chamado e julgo que nem se estuda em Portugal. Dia magnífico como só o campo nos oferece.